Ensino à distância

O editorial do Público de hoje, da autoria de Manuel Carvalho, sobre a educação e a sua tensa ministra, apetece comentar, porque parece colocar o ponto chave da questão educativa, em Portugal, no lugar da sala dos professores.

Em resumo, a ideia é esta: as reformas educativas em curso, “vegetam há décadas no limbo do conservadorismo e da indecisão”. Deinde, o louvor pela “coragem pelo empenho” com que a ministra as defende. E no entanto, as reformas continuam a deixar muito a desejar e revelam-se um profundo logro. Em quê, afinal, se serão tão urgentes que já tardam há décadas?

No modo de execução das mesmas, no paradoxo que em si transportam, ao afirmarem princípios e valores proclamados mas que não são executados, porque não fazem parte da sua essência. A perplexidade agora manifestada publicamente por milhares de professores, resume o estado geral de estupefacção, perante um autismo notório da ministra que os proclama.

A figura de professor titular, revela-se agora, com inúmeros exemplos, que é uma reforma falhada porque a selecção engendrada pela ministra atrabiliária e seu staff de Valter Lemos e outros, provoca injustiças flagrantes que se contam aos milhares.

Os professores, aliás, já perceberam a essência do problema: poupar dinnheiro no Orçamento do Estado, simplesmente, reduzindo milhares de progressões na carreira e aposentações subsequentes.

O Estado português, gasta milhões na Educação, tanto ou mais que os parceiros europeus e não há meio de descolar da mediocridade, sempre a aumentar de ano para ano. Este governo, julgou encontrar a chave para resolver o problema: atacar uma classe de milhares que depende do Estado, para viver condignamente. Tal como outras, aliás, numa matriz simbólica de contornos algo psicóticos.

Assim, não se trata de uma verdadeira reforma, mas um modo de juntar o útil ao agradável que rapidamente descambou em manifestações muito desagradáveis.

Depois vêm, naturalmente, os problemas de explicação de políticas que naturalmente não podem ser explicadas. Tal como na Saúde. Tal como noutras áreas que envolvem cortes drásticos de recursos financeiros.

A seguir, outra reforma de vulto: a avaliação de professores. Um princípio inatacável, proclamado como incontornável. Surge, porém a questão fundamental e de forma: os professores são avaliados por quem? A ministra que não ri, explicou publica e candidamente que o vão ser ...pelos pares. Antes isso do que pelos superiores intelectos dos universitários ou ainda pelos elevados quocientes que vicejam no ISCTE e outros lugares de culto, manifestou a seráfica ministra.

Ora aqui é que a porca torce o rabo todo enroscadinho. Os avaliadores, afinal, são pares escolhidos pela selecção natural da progressão para a titularidade. E isso , os professores em paridade, não aceitam de bom grado, porque não lhes reconhecem autoridade suficiente para tal, tanto mais que muitos dos avaliadores são de competência duvidosa perante os critérios de aferição básica. Uma medida deste jaez, para ser aceite genericamente, tem de implicar uma credibilidade acrescida. Senão, torna-se evidente motivo de escárnio, mal -dizer e desconforto justificado.

Os problemas da ministra que acabou de entrar no seu labirinto, são por isso de ordem mística: de crença na bondade de medidas políticas erráticas, entendidas como sagradas pela equipa que dirige e julgadas blasfemas pelos alvos a quem se aplicam.

A análise empírica dos problemas, permite ainda lançar algumas dúvidas metódicas:

Como se formam os professores hoje em dia, para as escolas do ensino básico e secundário? Nas Escolas Superiores de Educação, muitos deles.

Pergunte-se a um qualquer professor um pouco mais antigo e com um grau médio de inteligência crítica, o que pensa da qualidade de ensino nessas ESE´s . Vá-se saber quem as criou, alimentou, acalentou e promoveu e depois, vão a um Prós & Contras falar desse problema básico: a formação de professores. Antes de se falar em qualquer avaliação pelos pares.

O mote do programa poderia ser este: o estado do ensino em Portugal, é o espelho do Estado que governa.

Publicado por josé 18:15:00  

9 Comments:

  1. Laoconte said...
    Nunca me esqueci, há três anos atrás, quando a minha filha, nervosa e aflita com os exames nacionais, tinha de enfrentar as incertezas causadas pela greve dos professores.
    Antes, tinha uma elevada consideração pelos professores como classe.
    Até reconheço que a esmagadoria maioria de professores é dedicada à profissão, mas, perdi, de vez, aquela confiança que tinha na classe, porque para mim era mesmo impensável que os professores tenham escolhido aquela época de exames para as suas lutas e greves.
    Leonor Nascimento said...
    Está a ser injusto laoconte. Está a tomar o todo pela parte. Há imensos professores que são brilhantes educadores, empenhadíssimos em aturar aos filhos dos outros o que não aturam aos que têm em casa, que gastam horas do seu tempo livre (fora das horas regulamentares) a fazer planificações, relatórios, monitorizações, actas, registos, etc, e têm de arranjar energia e criatividade para captar a atenção e motivação de 25 alunos por turma (todos diferentes) em cada bloco de 90 minutos. Ou seja, de 90 em 90 minutos enfrentam turmas diferentes (com diferentes sentires e perspectivas entre eles)e têm de renovar a força de os conseguir motivar a todos. Ao mesmo tempo que lhes pedem para competentemente desempenhar essas funções são desautorizados pela legislação, humilhados pelo governo e injustiçados pelos pais. A par disto, congelam-lhes a progressão na carreira, pagam-lhes mal e não lhes facultam os recursos económicos e humanos que as necessidades dos alunos exigem e justificavam.

    Depois de muito luta, não são ouvidos, não atendem às suas reivindicações e limitam-se a passar para a sociedade uma visão desfazada do que se vive nas escolas. Como queria que os levassem a sério. Para problemas drásticos, medidas drásticas. Foi o que aconteceu com a greve a que se refere.

    Por sinal, o governo preocupou-se em ouvir os profs durante o ano lectivo? Outros fizeram greves em momentos chaves porque sabem ser a forma mais eficaz de alcançar o propósito que se pretende com a mesma.

    E repare, não obstante serem uma classe mortificada, continuam na opinião do povo, para pasmo de muitos, a liderar o primeiro lugar das pessoas mais sérias e menos corruptas no nosso país. Enquanto un governo não entender que a educação é a semente do sucesso de todos os sectores não conseguirá alcançar o desenvolvimento a que almeja.

    Começa tudo nos bancos da escola e derivam de lá (a par do que se obtém na família) os traços que hão-de fazer de nós os melhores ou piores cidadãos do futuro.

    A primeira preocupação estrutural de qualquer governo deveria ser a EDUCAÇÃO. E não consegue fazê-lo se excomunga desse projecto osa principais protagonistas.
    Laoconte said...
    Não estou a ser injusto, apenas relatei um acontecimento que me levou à desilusão sobre uma classe profissional que tinha muito respeito e admiração.
    E acho que aí o sindicato teve muita culpa nessa estratégia de luta laboral, porque, praticamente, usou os alunos como reféns humanos na sua luta.
    Será que os dirigentes sindicais dessa altura não tinham a sensibilidade de professor?
    Leonor Nascimento said...
    Aceito que seja o relato de uma desilusão pessoal.

    Mas como a sua, há muitas outras desilusões pessoais em muitas outras questões concretas. Aquela atingiu-o pessoalmente - o que é compreensível - porque afectou a sua filha.

    Mas como a sua existem milhentas outras situações que afectam igual e pessoalmente outras pessoas: os professores, os filhos dos professores, a família dos professores.

    Os sindicatos são uma nódoa. Na maioria das vezes seguem os seus interesses. Não é desses que falo. Falo do respeito e consideração que os professores do nosso país merecem de nós e do governo. E vejo muito pouca gente mobilizada ou preocupada com isso, alheando-se do debate de um problema que não é excluisvamente de uma classe, mas sim nacional.

    Se queremos bons profs devemos estar com eles, ouvi-los e respeitá-los. Como sabe a violência nas escolas tem aumentado. Isto é o espelho do caos. chegam ao cúmulo de serem agredidos por alunos que são "menores". Hoje, um qualquer "pivete" se sente no direito de agredir e insultar um professor. Alguma coisa está muito mal ou eu estou senil!!
    josé said...
    Já fui professor. Tenho a melhor impressão dos professores, em geral. Agora, como dantes, há bons e mais professores. A maioria será de boa qualidade. Não excelente, mas apenas boa. Como sempre foi e será, em todas as profissões.
    No entanto, julgo que o standard de qualidade mínima, baixou imenso nestes últimos vinte e cinco anos.
    Dantes nem havia professores suficientes, para fazer face à explosão do ensino massificado.
    Esse o primeiro problema grave, a aparecer no ensino, resolvido de modoo ad hoc: qualquer licenciado servia e antes nem sequer era preciso ser licenciado.

    Julgo que entendo os professores e sei que a formação dos professores actualmente, não é a melhor nem sequer a que poderia e deveria ser.
    As escolas de formação foram influenciadas pela filosofia tipo ISCTE.
    Por mim, fechava o ISCTE, ou pelo menos os cursos destinados a viveiro de governantes socialistas.
    É um viveio permanente de ovos de serpente.

    O problema nasce logo aí. É a minha opinião.
    Leonor Nascimento said...
    Qual dos Josés é que se pronunciou?
    O autor do post ou o comentador que por ali passou?
    josé said...
    O José que aqui escreve habitualmente.
    zazie said...
    ahahahaha

    Ó José, acho que acabou de enunciar a medida mais simples de se resover grande parte dos nossos problemas: fechar o ISCTE

    ":O)))))
    Paulo Albuquerque said...
    Este texto resume de forma muito boa as convulsões que o ensino atravessa actualmente em Portugal. As suas causas antigas, e a sua génese. Na verdade toca num dos pontos fulcrais, a formação de docentes.

    Como diz e muito bem a formação ministrada na maioria das ESE's talvez não seja a melhor. Outro ponto importante é que os alunos que acedem a esses cursos normalmente não estão vocacionados para o ensino. São sim dejectos que não conseguiram entrar noutros cursos. Ou então alunos saídos de cursos com poucas saídas profissionais que se viram para o ensino.

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