Galp - Com Mellos também se abatem

A notícia foi seca e violenta. O grupo Mello anunciou a interposição de uma acção no Tribunal Administrativo (TA) de Lisboa contra a Parpública, com vista a conseguir uma providência cautelar, que consiga anular o processo da venda da Galp ao consórcio Petrocer.

Ora a primeira vitória já o Grupo Mello conseguiu , e que foi, colocar todo o governo à espera da decisão do TA, pois há algo que valida a decisão e a consumação da operação : 15 de Fevereiro de 2005. A partir dessa data o contrato é considerado nulo, e o concurso reaberto.

Mas em que falharam os sábios, na avaliação das propostas ?

Os sábios formaram um concílio. O objectivo primordial era legitimar a escolha pela PARPÚBLICA, através dos sábios – Comissão consultiva independente - das propostas apresentadas no âmbito do processo de reorganização empresarial do capital social da GALP ENERGIA , originada pela alienação “forçada” dos 33,34 % detidos pela ENI à mesma PARPÚBLICA, em troca da entrada no negócio do Gás e mais 650 milhões de euros.

Tudo isto resulta assim da necessidade do Governo , em evitar aquilo que Pina Moura assinou obrigando o Estado Português a lançar em IPO a Galp Energia sob pena da PARPÙBLICA ser obrigada a vender a sua participação à ENI, dando-lhe o comando da empresa. Isto para além de Pina Moura ter ganho o lugar de presidente da Iberdrola Portugal, curiosamente uma das envolvidas no negócio.

  • Erro 1 - Os sábios não sabem somar

Assim, e em 31 de Dezembro de 2002, dizem os sábios que o capital social da GALPENERGIA é composto por...

  • Estado Português – 34,805 %
  • ENI Portugal Investments SPA – 33,340 %
  • EDP Participações SGPS SA – 14,268 %
  • Caixa Geral Depósitos – 13,499 %
  • Iberdrola S.A. – 4,000 %
  • Setgás – 0,004 %
  • Portgás – 0,004 %

Bom, se os nossos leitores somarem as percentagens acima, verão que o valor é de 99,92 %.

Das duas uma ou sábios esqueceram-se deliberadamente dos 0,08 % ou os sábios não sabem somar. Mais grave é saber que tal informação consta no relatório e contas da GALP ENERGIA, o que levanta certamente algumas reservas quanto a quem o auditou e sobretudo a forma.

  • Erro 2 - As incompatibilidades

Os mesmos sábios afirmam no ponto II – O Processo de Venda directa sob apreciação – nº 9...

trata-se de um processo de venda directo lançado pela Parpública sendo esta a única contraparte, como vendedora... Nem o Governo nem a Galp têm qualquer intervenção ou responsabilidade directa quer no processo quer naquela transacção


Quem acompanhou por dentro esta operação sabe, primeiro que são conhecidas as intervenções pessoais de Durão Barroso junto de Martins da Cruz, como consultor do Grupo Carlyle, da mesma forma que várias vezes no restaurante Trinas, Carlos Tavares foi visto a almoçar como Ferreira de Oliveira, líder do consórcio Petrocer.

Como se não bastasse, o envolvimento negado-confirmado-negado novamente - apenas como advisor - depois como entidade financiadora por parte da Caixa Geral de Depósitos, não deixou ninguém indiferente. Foram várias as contradições entre Mira Amaral e António de Sousa, bem como as irritações de Barroso em pleno parlamento às simples e minimalistas inquirições de Louçâ.

Longe vão de qualquer forma os tempos, em que o ex-presidente da Galp, actual ministro das Obras Públicas, afirmou em público, que

Não conheço nenhuma das propostas mas sei que a Luso-Oil é a melhor


  • Erro 3 - Os sábios "proibem" a utilização da mais-valia para efeitos de redução de défice

Os sábios, talvez já safisteitos com tanta escrita, ter-se-ão esquecido de que a operação não envolve apenas a PARPÚBLICA e o consórcio vencedor. A PARPÙBLICA comprou a ENI a sua participação. Depois e se vender ao investidor privado, irá depositar as acções na sua conta e receber o valor. Dado o facto de a mesma estar a ser vendida abaixo do valor de mercado, o lucro será reduzido. A PARPÙBLICA ficará apenas com o valor da mais-valia gerada.

O Estado pretende assim alienar através da Parpública, a parte que ENI Spa detinha ( 33,34 %) detinha na Galp e esventrar a petrolífera nacional do negócio do gás, criando para esse efeito a empresa EDP Gás. O SEC - Sistema Europeu de Contas - levanta assim quatro hipoteses nas vendas de activos...


1. As administrações públicas vendem por si próprias acções ou outras participações que detêm numa empresa. Diz-se que esta venda é directa.
2. As administrações públicas possuem uma empresa A (geralmente, uma sociedade holding): esta empresa vende acções ou outras participações que possui numa empresa B e devolve os resultados da venda às administrações públicas. Diz-se que esta venda é indirecta.
3. As administrações públicas vendem activos não financeiros que possuem. Diz-se que é uma venda directa de activos não financeiros.
4. As administrações públicas possuem acções ou outras participações numa empresa: esta empresa vende activos não financeiros e devolve os resultados da venda às administrações públicas. Diz-se que é uma venda indirecta de activos não financeiros.

Parece consensual que a Galp Energia se trata de um activo não financeiro. Como o negócio envolve a Parpública, torna-se indirecto. E assim caímos na opção 4, ou melhor dizendo uma venda indirecta de activos não financeiros. A venda indirecta de activos não financeiros tem de ser inteiramente registada nas contas financeiras das administrações públicas e da Galp Energia (A): é uma retirada de acções ou outras participações da empresa que era, parcial ou totalmente, detida pelas administrações públicas, tendo, como entrada de contrapartida, um aumento de um activo financeiro.Ou seja não tem qualquer efeito nas necessidades de financiamento das administrações públicas. Ou seja não conta para efeitos de redução do défice.

Ou seja os sábios eventualmente cometem um erro ao considerarem que a Parpública é a única envolvida no processo.

  • Erro 4 - As funções dos sábios

O ponto III. 18, diz que a “Comissão tem de basear-se ..na análise efectuada pelos consultores contratados" . Para quem começou o documento falando de Comissão Independente e não vinculativa...

  • Erro 5 - Os critérios de avaliação

A comissão independente e não vinvulativa, definiu em conjunto com as indicações recebidas pela PARPÙBLICA OBJECTIVES, critérios de avaliação como mandam as regras. Decidiram valorizar cada um numa escala de 1 a 3, mas decidiram que todos os critérios teriam a mesma ponderação. Ou seja para os sábios era igual estar dentro do negócio ou propor comprar com alavancagem.

Dizem os sábios que

foi com base na grelha global de critérios de avaliação que os interessados foram convidados a elaborar as suas propostas
Ainda que alertados os consultores da PARPÙBLICA decidiram – III.18 f i ) – “não introduzir qualquer ponderação nos critérios de avaliação “. Mas o ponto ii ) diz-nos que foi procedido a uma “reorganização da grelha de critérios directamente emergentes “. Isto é para ponderar os critérios, a comissão de sábios achava que isso se traduziria em alterar as regras do jogo, mas reorganizar os mesmos critérios, agrupando alguns, trata-se apenas e segundo os mesmos “na observância de regras básicas , designadamente de boa-fé e de respeito e de confiança”.
Ou seja estamos perante um concurso em que a PARPÙBLICA se auto-legitima e concede aos sábios esse poder, de alterar as regras do concurso a meio se tal se mostrar dentro da observância das regras básicas.
Recordam-se de termos falado, dizem os sábios, que o Governo não intervem directamente no negócio. Pois o ponto 19, diz isso mesmo ...


A comissão não tem que se pronunciar sobre a qualificação de princípios dos proponentes para serem contrapartes da PARPÚBLICA na transacção para que foram convidados para apresentar a proposta. È manifesto que o convite não lhes teria sido feito se a PARPÙBLICA (ou o GOVERNO) náo considerasse que essa qualificação de princípio existe em relação a cada um.

No fundo, os próprios sábios, reconhecem que o GOVERNO , "pelo menos" reconheceu a cada um a qualificação de princípios. Ora se isto não é intervir no processo.

Demasiados erros num só acto.

Publicado por António Duarte 13:43:00  

2 Comments:

  1. josé said...
    Segundo notícia da RSF de 15.11.2004:

    "A comissão de sábios - constituída por Eduardo Catroga, José Luís Sapateiro e João Morais Leitão - também justificou, a 06 de Julho, a interrupção das negociações com o grupo José de Mello para a compra da posição na Galp Energia com a recusa do grupo em pagar a totalidade da participação a dinheiro.

    O consórcio Luso-Oil, preterido na primeira fase de selecção de candidatos, também escreveu uma carta à Parpública pedindo a interrupção do processo.

    Quando o acordo de venda da participação na Galp Energia à Petrocer foi assinado, a 03 de Agosto, o ministro dos Assuntos Económicos e do Trabalho, Álvaro Barreto, considerou «normal» a contestação e as ameaças de recurso judicial por parte dos concorrentes derrotados no concurso e manifestou-se «convencido» de que "não há razões jurídicas" para que o consórcio Luso-Oil ou o grupo Mello processem judicialmente o Estado.

    O consórcio Petrocer, que integra a Unicer, o BPI e os grupos Violas e Arsopi, vai pagar 700 milhões de euros por 33,34 por cento da Galp Energia.

    Posteriormente, vai pagar 146,2 milhões de euros por uma participação adicional de 7,45 por cento, pertença da EDP, mas beneficiará do facto de a Parpública prescindir dos dividendos da Galp Energia relativos a 2004 em favor da Petrocer."

    Não obstante este imbróglio, parece-me apesar de tudo que os portugueses podem estar sossegados quanto ao desfecho do caso.

    Segundo um comentário anónimo aí para baixo, quem estará a tratar da defesa dos interesses da Parpública, com unhas e dentes, será o escritório de advogados de José Miguel Júdice e Associados, a PLMJ que contempla ainda como associado valoroso, o bravo ministro Morais Sarmento que acabou há umas horas de desqualificar a AACS, remetendo-a ao digno estatuto das inutilidades.

    O comentário que se respiga é este:

    "...Embora os honorários de um milhão de euros por cada 15 dias sejam os actualmente vigentes, não foi possível confirmar desde quando estão a ser aplicados. O escritório de José Miguel Júdice presta assessoria jurídica ao Governo para este processo de venda da Galpenergia há mais de um ano, embora o tipo de serviço tenha variado ao longo dos meses, havendo agora, por exemplo, uma intervenção activa num momento decisivo do processo - fase final de negociações -, o que não acontecia, por exemplo, há um ano. Para os especialistas, um cálculo que pecará por defeito e não por excesso será considerar que esta "tabela" de honorários se refere apenas a esta fase negocial e que se prolonga por dois meses, para o que são, assim, contabilizados quatro milhões de euros. "

    Bravo! Acho, na minha modesta opinião que nunca se viu disto em Portugal. Mas posso estar enganado...
    Anónimo said...
    Ai quem dera ser Sábio...

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