A Guerra das palavras



No programa Prós e Contras de hoje, elaboram-se argumentos, opiniões e ideias sobre o período da guerra que Portugal defrontou em África, com os movimentos de libertação das chamadas províncias ultramarinas. O pretexto, excelente aliás, é uma série de episódios, nove ao todo, do primeiro programa que a RTP vai divulgar, brevemente a sobre esse assunto de relevo.

Mais uma vez o problema coloca-se também no início: no verbo. Na linguagem escolhida e nos termos utilizados para as designações. Um exemplo, concreto:

Joaquim Furtado, que tem fama de ser um dos melhores jornalistas portugueses, (com Adelino Gomes também que escreve no Público sobre este assunto) , explicou porque é que decidiu chamar aos acontecimentos dessa época A Guerra.

Esclarece que em Portugal, o governo, as pessoas em geral e os apolíticos e sem intervenção activa, nessa altura dos acontecimentos, designavam-nos como Guerra do Ultramar, o que não é bem aceite pela simples razão de no lado oposto da Guerra, os movimentos a designarem de outro modo: como guerra de libertação ou de independência e do lado da ONU, guerra colonial, no que era acompanhada pela esquerda esclarecida de então, escondida e que se mostrou em pleno dia de 25 de Abril.

Extraordinário argumento! Guerra do Vietname; guerra da Argélia; guerra do Congo, foram designações comuns, no tempo delas, para os vários países que lidarem com estes fenómenos.

Tomemos por exemplo a guerra da Argélia, que envolveu os franceses, no final dos anos cinquenta. Para os franceses que escrevem em jornais e assim lêem a realidade, essa guerra é sempre a da Argélia. Para os argelinos, porém é a guerra da independência, da libertação e até da Revolução.

Antes da Argélia, os franceses tiveram outra guerra de libertação do colonialismo: a guerra da Indochina.

Ninguém, em França se lembra, porém de as designar de outro modo, incluindo os esquerdistas, simpatizantes do comunismo então considerado como libertador desses povos.

Quem determina as designações que as coisas devem ter?

Neste caso, Joaquim Furtado, como bom esquerdista antigo e solidamente lembrado, não admite o termo Ultramar, porque tal ultraja os colonizados e até a ONU não usava o termo.

Tomemos o caso do Vietnam. Alguém designa por escrito esta guerra, outro modo, por exemplo, de libertação?

A linguagem em Portugal continua a ser a da Esquerda. E para não se notar muito, Joaquim Furtado capou o termo. Em vez de Ultramar, chamou-se simplesmente Guerra. Não chega. É tempo de perceber que os termos usados para designar as coisas, são os que as designavam no devido tempo. E nesse tempo, era efectivamente Guerra do Ultramar, o termo certo para o acontecimento. Guerra colonial, foi termo apócrifo, divulgado logo depois do 25 de Abril de 1974, pela Esquerda, toda a esquerda, a reboque do PCP e do PS.

Pergunta-se: qual o termo certo, para designar a Guerra em África? A do tempo em que ela decorreu, ou seja, Guerra do Ultramar, ou a do tempo em que se procurou acabar com a mesma, de qualquer maneira, como de facto aconteceu- ( Nem mais um soldado para as colónias!) ?

Imagem: daqui.

Publicado por josé 00:31:00  

12 Comments:

  1. zazie said...
    José,

    mas primeiro chamavam-se colónias. Só a partir dos anos 50 é que se chamou Ultramar, não é assim?
    zazie said...
    A toponímia também foi toda mudada. Em Lisboa, ainda se diz "Bairro das Colónias" e "Praça do Ultramar", apesar de terem alterado para "Praça das Novas Nações".
    Luís Negroni said...
    Este comentário foi removido pelo autor.
    Luís Negroni said...
    Guerra Colonial é um termo muito mais preciso por isso mesmo muito mais correcto. Ultramar é tudo o que fica para lá dos mares que banham Portugal. Ultramar é toda a África e toda a América. Uma Guerra do Ultramar pode significar uma guerra com meio mundo. Uma Guerra Colonial significa com total exactidão a guerra da metrópole Portugal contra as suas colónias da época: Angola, Moçambique, Guiné, Cabo Verde e São Tomé e Pricípe. A precisão terminológica é sempre preferível à terminológica imprecisão.
    josé said...
    A guerra era com meio mundo: o mundo comunista, como de facto se veio a verificar e ainda com o mumdo dos negócios do petróleo, como também se concretizou.

    Quanto ao termo, é verdade que a expressão Gerra colonial é apropriada. Mas não é isso que pretendo dizer.

    Em França, também a guerra da Argélia era guerra colonial e na Indochina e noutros lados onde houve conquistas de uns povos por outros.

    Por falar nisso, na América, também houve uma guerra colonial. Quem a ganhou? Foram os nativos, os índios?

    As coisas são o que são, mas a realidade tem o aspecto que deve ter.

    Quanto ao termo que prefiro "guerrra do Ultramar", é verdade que foi inventado pelo Estado Novo; é verdade que foi uma forma de fugir ao desconforto e ao simbiolismo do termo "colonial", mas também é verdade que foi esse o termo usado durante os 14 anos de guerra e foi esse o termo cunhado pelas pessoas que foram mobilizadas para essa guerra e era assim que era conhecida durante esse tempo.

    O termo guerra colonial, pretende apenas emprestar o cunho de "esquerda" porque foi efectivamente a esquerda comunista, ligada aos interesses da União Soviética de então que usava a seu bel-prazer a novilíngua de que o exemplo máximo é o termo "fascismo", para designar uma realidde que não é a apropriada.

    A substituição da expressão usual e corrente- "guerra do Ultramar- pela designação adoptada por toda a esquerda logo a seguir ao 25 de Abril, é mais uma mistificação da realidade, embora neste caso até seja adequada ao termo utiliado internacionalmente, pela ONU, inclusivamente.

    No entanto, todos concedem em dizer que o colonialismo português teve algo de diferente para melhor, num certo sentido de integração, do que o colonialismo francês, holandês ou inglês.

    Não sei se será apenas uma ideia feita, como outras, mas parece-me útil esta discussão.
    josé said...
    A substituição da expressão "guerra do ultramar", por "guerra colonial", ou na versão reduzida, conformada e reformista, de Joaquim Furtado, para simplesmente "guerra", releva de mais um tique da nossa Esquerda.

    A expressão, sendo correcta e por isso não parecendo uma mistificação como outras o são, na verdade obnubila outra coisa:

    No tempo dessa guerra só a chamava de "colonial", quem era de Esquerda radical. O vulgo, os media e os próprios soldados que a combateram , neles se incluindo os generais, não a designavam assim. Otelo não a designava assim e Rosa Coutinho também não. Passaram a fazê-lo alguns dias ou semanas após a Revolução por influência directa da novilíngua instaurada pelo PCP e pelo PS antes de meter o socialismo na gaveta, deixando o rabo de fora da treta marxista.

    É isso que pretendo dizer: designemos a guerra do Ultramar como de facto era conhecida ao tempo, mesmo que de facto fosse uma guerra colonial segundo as designações internacionais.

    O problema da substituição de termos aqui, não é inocente nem gratuita: é mais uma manifestação da Esquerda que se apoderou da linguagem e agora, cilindra e revisita a história, refazendo-a ao seu modo.
    É essa a questão.

    É óbvio que aceito e admito que quem assim a designou na época o continue a fazer. É por isso que respeito a esquerda comunista que temos: nunca se modernizou; continua com as ideias antigas, com o velho estalinismo à ilharga e quer mesmo, ainda nos tempos que correm o internacionalismo proletário e o regresso da URSS e dos pais dos povos.
    Sendo assim, o que me custa a aceitar é que as pessoas que assim não pensaram nem pensam, aceitem gratuitamente os termos que lhes foram dados, acriticamente, pelos comunistas.

    Os comunistas foram sempre uma minoria, impuseram contudo uma linguagem corrente como se fossem maioria.
    Perderam todo o significado ideológico por falência completa dop sistema em que acreditaram. Mesmo assim, ainda há quem lhes dê o crédito que não merecem, mão devem merecer e deveriam já ter sido denunciados pelas asneiras graves que cometeram aqui e noutros lados.

    Nos países europeus, contam quase nada. Transformaram-se em partidos social-democratas e é assim que deveria ser por cá.

    Constituiriam uma belíssima alternativa a este partido Socialista que me parece infinitamente corrupto.

    Quem sabe se eu mesmo não votaria nos novos social-democratas saídos das fileiras do bolchevismo à portuguesa.

    Até lhes dou uma sugestão de nome: partido do cravo.Na Itália, há a margarida...
    lusitânea said...
    Guerra do Ultramar era a designação do antigo regime e que consta em todos os documentos oficiais da época.
    Vamos continuar a assistir ao reescrever da história pelos "vencedores" alguns dos quais vimos ontem em intervenções do tipo "olhe que não" interrompendo intervenções menos ortodoxas...
    Os filósofos deste regime são nitidamente contra "o ultramar", "a raça" apurada ao longo de séculos que não mais é do que uma coesão social, a "força armada de conquista" e outras preciosidades que de facto mantiveram o país ao longo dos séculos.
    Defendem e estão a praticar portanto o internacionalismo das "integrações" que não mais do que reconstituir o ex-império cá , agora bom porque pagamos...
    O chique agora é assistirmos asos desembarques clandestinos nas nossas costas de "agressores" a "vítimas"!
    Não sei se repararam mas o ten cor como era direitista era precisamente tenente coronel, mas o resto da rapaziada era coronel, não como aqueles que "censuravam" mas dos bons, aqueles que nos queriam dar a "luz" de novos "sois" que despontavam no mundo.Apesar de tudo derrubado foi justo que o PS, com larga tradição em compensar anti-fascistas, FP-25, pedófilos tenha reconstituido as carreiras de toda a gente de esquerda que contava...
    E ainda mais... elevando aos topos os da sua confiança... na concretização daquela máxima "para os amigos tudo"...
    josé said...
    Vou utilizar uma expressão forte que contesto noutros lados:

    Aquele Sousa e Castro, parece-me um burro. Um imbecil, melhor dizendo.

    Digo parece-me que é para não ofender, porque pode não ser e ser eu o enganado.
    lusitânea said...
    Houve um outro , antigo padeiro,anti-fascista emérito e que perdeu o pio na RTP em 25 de Novembro de 1975... por acaso num fato de fino recorte que quer o partido, quer o PS são generosos...
    JPG said...
    A linguagem em Portugal continua a ser a da Esquerda. E para não se notar muito, Joaquim Furtado capou o termo. Em vez de Ultramar, chamou-se simplesmente Guerra.

    Veremos, a partir de hoje à noite, que mais amputações e enxertos linguísticos serão escutados (e executados) na série documental. Aposto que, por exemplo, em vez de "territórios" ou "províncias" ultramarinos/as, o chavão será "colónias"; todos os movimentos serão "de libertação"; todos os brancos serão "brancos" e todos os guerrilheiros serão "nacionalistas" ou, (cruzes-canhoto, nacionalistas não convém nada), melhor, "patriotas".
    Aquilo a que chama "tiques de esquerda" representa, na minha opinião, a velha e relha táctica da reciclagem terminológica - com o objectivo de, por e com outras palavras, reescrever a História. Não é apenas um "tique". De todo.
    Existe uma “guerra de palavras”, de facto, e bem importante ela é. Assim como se derrubam estátuas, placas, ícones, da mesma forma que se altera a toponímia e se apagam dos registos os nomes caídos em desgraça, também as palavras podem sofrer o degredo, o segredo, o anátema... até que sejam, por fim, totalmente esquecidas. E, é claro, se forem esquecidas, então nunca existiram.
    Luís Negroni said...
    Será que sempro que utilizo uma qualquer palavra ou expressão tenho de estar a pesá-la na balança da esquerda e da direita? Não. Tenho é de escolher aquela ou aquelas que são menos vagas, mais precisas, mais rigorosas, para que a minha linguagem seja factor de comunicação e não factor de ignorância ou confusão. Linguagem precisa gera verdadeira comunicação e entendimento entre as pessoas. Linguagem imprecisa gera falsa comunicação e discórdia entre as pessoas.
    Guerra Colonial é uma expressão mais precisa, mais clara e rigorosa que Guerra Ultramarina. Não quero saber qual é de esquerda nem qual é de direita. Essa é uma atitude que acho preconceituosa. Quero é saber qual é mais explícita, clara e precisa e indubitávelmente Guerra Colonial é das 2 expressões a única que possui estes requisitos fundamentais da verdadeira comunicação
    lusitânea said...
    "Guerra Colonial é uma expressão mais precisa, mais clara e rigorosa que Guerra Ultramarina."
    Ó camarada Luis
    Leve lá a taça que tem como bónus 35000 ex-colonizados , que cá temos,da Guiné onde nos tenebrosos tempos da ditadura eram escravizados por meia dúzia de brancos e por causa de 4 trabalhadores do "porto" de Bissau se revoltaram e se tornaram "independentes".É que aquilo devia estar, agora sem colonialistas, a fazer favores á ex-metrópole para exemplificar a maldade da governação dita colonialista.Antigamente tinham passaporte Português, agora é uma chatice para o conseguirem...
    Têm tido um grande crescimento é na distribuição de droga...

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