Coração, cabeça e estômago
segunda-feira, agosto 14, 2006
Uma Fernanda Câncio, jornalista segundo se vai lendo, escreveu uma crónica no DN em que se queixa da coscuvilhice ambiental nos media. Que querem saber tudo da vida alheia, dos famosos e semi-famosos e mostrar tudo na tv, numa intrusão cada vez mais invasiva e que pode chegar ao quarto de dormir, para não dizer mesmo ao interior do próprio dossel de repouso. E coloca um acento tónico numa nota incidental, ao referir o aparecimento de uma nova tendência na coscuvilhice mediática: saber quem anda com quem e quem assume as respectivas relações, sendo este o eventual clímax noticioso por excelência.
Sobre Fernanda Câncio, de quem nada sei, o jornal Correio da Manhã, de 1.8.06, fez assim um perfil:
“Ser namorada do primeiro-ministro não é fácil, ainda para mais quando se é jornalista. Quando se soube que Fernanda Câncio era a companheira de José Sócrates, houve quem criticasse se ela teria capacidade de isenção e imparcialidade. Mas, em entrevista ao CM, que data de Novembro de 2005, Fernanda Câncio fez questão de afirmar que nunca abandonaria o jornalismo. Ciosa da sua privacidade, a jornalista não gosta de falar sobre a vida privada. Pouco se sabe sobre ela, apenas que é uma mulher de causas e adepta da internet, participando no blogue Glória Fácil (www.gloriafacil.blogspot.com). No final de 2005, Fernanda Câncio foi distinguida pela associação ILGA Portugal, com o Prémio Arco-Íris pelo seu contributo na luta contra a homofobia.”
Sobre namorados e namoradas, mulheres e homens, casamentos e apartamentos e outras relações humanas, pouco haverá a dizer para acrescentar ao que todos sabem de essencial. Todos percebem que nesse complexo mundo de intimidades e equilíbrios pessoais e afectivos, é muito difícil ensinar seja o que for a alguém, ou recomendar “ regras de sensatez”, porque em assuntos amorosos não consta que haja regras definidas e imutáveis, por muito que os Alberonis escrevam ou os Júlios Machado Vaz expliquem o que muitas vezes não tem qualquer explicação e só um ou outro Morávia lá consegue chegar. Nesse reduto que alimenta telenovelas e grandes romances também, cada um é senhor da sua própria história, embora muitos ( principalmente muitas) se deslumbrem com histórias alheias e será por isso mesmo que as Holas! e quejandas têm tanto sucesso.
Assim, é mais do que natural que as histórias de amores e desamores alheios, alimente a curiosidade de quem anseia por ver esse eterno retorno às essências afectivas. A curiosidade associa-se por vezes, ao voyeurismo, sempre que a tara é propícia ou a perversão inevitável.
É dessas taras e manias que a imprensa rosinha se aproveita e alguns fundem o género numa mistura que em Portugal foi desenvolvida a ritmo diário por um antigo jornalista do Avante: Pedro Tadeu, é o celebrado director do 24 Horas, o expoente diário das historietas que envolvem os “ famosos, o dinheiro e o crime”, tal como o mesmo reivindicou numa célebre entrevista num clube de jornalistas a propósito de assuntos mais sérios e contidos em envelopes que outros creditaram como exemplo máximo da respeitabilidade jornalística.
No Portugal actual, poucos cronistas se atrevem a denunciar esta pimbalhice misturada com jornalismo. Alguns terão simplesmente medo de perder dinheiro e poder de intervenção. Compreende-se. Outros, porque não se incomodam, a não ser quando lhes bate à porta o infortúnio da exposição indesejada .
Como chegamos aqui? Em tempos, o assunto já por aqui foi ventilado. Retome-se, por isso, a meada.
“Portugal apanhava as modas ocidentais, sempre com atraso. Foi assim, no uso das gangas; no corte de cabelo adiado e nos costumes mais estrangeiros, como sejam a arte suprema de comer carne picada, embrulhada em alface e tomate e metida à força em pãezinhos redondos e amaricados ou em beber uma espécie de água suja com receita de Atlanta. Nos anos sessenta, o nosso país feminino chorava ao ritmo lento e valsa atenta, do folhear das páginas de fotonovelas. Corin Tellado era nome de Espanha, mas do Brasil vinha o recheio do Capricho e outros romances em fotos quadriculadas a preto e branco, de princesas escondidas como costureirinhas, à espera dos príncipes de poupa e popó a condizer . Por cá, a Crónica Feminina , publicada em frenético ritmo semanal a partir de 1956, moldava subtilmente a mente feminina, aggiornando-a com sentires estranhos a um povo ainda rural e sem acesso a outros meios de informação mais sofisticados e massificados, apesar da rádio e de um Simplesmente Maria que futuramente se ficou pela simplicidade do nome Maria, numa versão sucedânea da Crónica e que eventualmente a suplantou no coração das leitoras. A sofisticadíssima revista Maria, com apenas 22 anos em 2000, vendia-se a uma multidão de cerca de 300 mil leitor(a)s!! Nenhum outro órgão de comunicação social, com excepção da televisão e mesmo assim, dadas as características do media, com algumas dúvidas o escrevo, se aproximou sequer desse nível de...penetração.
Actualmente as Marias, já são mais que as mães, simplesmente. Mulheres Modernas lêem a Ragazza e outras Cosmopolitan, Máxima, Elle.
Para a coscuvilhice associada à informação sobre cosmética e moda, há também um amplo sector que se estende ao género masculino numa paridade assegurada pelo mercado de hipermercado e bancas de rua.
Actualmente, tal como aquela Fernanda Câncio refere, o interesse das capas das revistas, vai direitinho para o assunto quente de saber quem-anda- com- quem- e –quem- andará- a- seguir.
Foi sempre assim? Nem por isso.
A vulgarização poderá ter começado nos suplementos de jornal. Nas décadas de sessenta e setenta, quase todos os diários dedicavam páginas a secções prosaica e exemplificativamente intituladas “para si, minha senhora” ( Diário Popular) . E algumas revistas como o Século Ilustrado revelaram-se pioneiras na caça ao voyeur.
Uma revista chamada Eva, em tempos dirigida por José Cardoso Pires , acabou em número único, natalício; das Donas de Casa que passou a Clube das donas de casa, na rádio, ficam as recordações e nostalgias de um tempo passado e já perdido. Ao mesmo tempo e do mesmo passo, à Gente do Expresso, supostamente animada no seu início por um certo MRS, apareceu em concorrência, a revista Gente, actualmente a vender dezenas e dezenas de milhares de exemplares.
O semanário Tal & Qual, com uma coluna em “Privado” dava conta de escândalos instantâneos e “Apanhados” prolongados na tv, numa antecipação de emissões de “reality-show”, tipo Big Brother, a suculenta ementa da tv do final do século.
No início dos anos noventa, um suplemento do semanário Semanário, retomava um Olá provavelmente inspirado na espanhola !Hola!
No final dos anos oitenta, ocorreu um dos episódios mais negros desta pequena história nacional da infâmia “cor de rosa” ou como dizem os espanhóis, “del corazón”: Um editor ambicioso, vindo das brumas anónimas, publicou no Outono de 1989, uma revista com o título enganador de Semana Ilustrada. O logotipo remetia imediatamente para uma cópia de revistas alemãs de futilidades tipo Quick ou Praline. O conteúdo, todo ele ilustrado a cores borratadas, berrava a cada página uma simples palavra: sexo! Que como se sabe, vende!
E por isso, no segundo número da revista, anunciado com antecedência estratégica, ( e apreendido logo a seguir, mesmo a tempo de evitar a difusão dos 150 mil exemplares, mas não tanto que evitasse o aparecimento e venda de alguns, em quiosques) apareciam várias fotos explicitamente pornográficas de um conhecido arquitecto que era logo definido no intróito do “último escândalo” como “uma pessoa de baixa moral, de poucos escrúpulos” e para ilustrar, mais de uma dúzia de fotogramas tirados de um filme caseiro, feito pelo próprio, numa ilustração perfeita do célebre filme pioneiro, L´arroseur arrosé.
Um segundo episódio infamante, ocorreu já nos anos noventa e num jornal , não lembro qual: alguém publicou uma notícia sobre a ministra Leonor Beleza, com pormenores de uma consulta ginecológica recente, com base em documentos do processo clínico. Sustentaram que era notícia de interesse público…
Em 1995 aparece a Caras, do mesmo grupo do Expresso que assim sustenta uma Gente de Caras conhecidas.
Actualmente, o primeiro lugar, no hit parade destas publicações empenhadas com “os famosos, o dinheiro e o crime” está solidificado neste grupo editorial: o Impala! Vip, Nova Gente, TV7 Dias, Mulher Moderna, Maria, Ana, Ego!
Depois, aparece um grupo discreto e concreto – a Edimpresa, de Balsemão e do grupo Impresa que edita a Caras, a meias com brasileiros da Abril.
Depois também aparece o grupo Soci, do Independente Pães do Amaral, com esse expoente das publicações que tem nome de Lux!
É nestas revistas que se dá a parada semanal de vaidades do país que somos e dos arredores que frequentamos, com vistas para a Caras; a Lux; a Tv7dias e a TV Guia. A cereja no topo deste bolo, é naturalmente o jornal 24 Horas e Pedro Tadeu, um martirizado da liberdade de imprensa.
Há diferenças nestas publicações empenhadas com o destino dos “famosos”?! Há. Principalmente uma: querem todas vender mais que as outras. Ou seja, a diferenciação faz-se pela concorrência. Assim, um jornal como o 24 Horas, legitima-se a publicar uma notícia sobre a próstata problemática de um político e outros assuntos de teor ainda mais profundo a ritmo diário. E defende-se dizendo que não fazem jornalismo de..."papparazzi"!!!
Por isso, que novidade, interesse ou escândalo pode actualmente haver, na publicação de uma reportagem acerca de um almoço ou jantar de um primeiro ministro acompanhado por uma namorada declarada, mas pouco assumida? Ora, ora! Até parece que chegamos ontem dos anos sessenta…
Porém, como o pretenso escândalo atinge singularmente alguns “famosos” da política que se servem dos jornais, quando lhes convém, e alguns deles até neles se empregam, cronicando e dirigindo, torna-se cinicamente curioso, ler quem se indigna pela publicação destas “notícias”, mas não o faça nas redacções onde elas emergem à solta e aí têm curso livre, entre iniciados que sustentam segredos e podam o respectivo interesse para o público.
Há agora quem queira( JPP) definir esta deriva como tendo começado com a Gente do Expresso, passando pelo Semanário e acabando na Nova Gente, sustentando que esta coscuvilhice pegada começou primeiro na imprensa "séria". Ahahahah!
Talvez uma vista de olhos a certos locais, dê para entender as subtilezas das curvas e contracurvas dos corações a palpitar e o contorno das montanhas russas da coscuvilhice .
Let´s look at a trailer:
Da inocência de finais dos anos sessenta, nas revistas Flama e Século ILustrado; do empenho político dos setenta, aos escândalos dos oitenta, passamos pelos noventa, já um pouco blasés e entramos no novo milénio, ao ritmo pimba europeu.
Acima: A Gente do primeiro número do Expresso e uma "notícia" do Jornal de 18.7.1980, sobre a dívida pessoal de Sá Carneiro à banca...
A Semana Ilustrada de Outubro de 1989 e o Tal e Qual de 15.3.1985
A Olá do Semanário, em 20 de Maio de 1995, por ocasião das bodas reais. Um número que é um must!
E uma primeira página, relativamente recente, do grande diário dos "famosos, do dinheiro e do crime"!
Publicado por josé 23:54:00
até parece a história do Mundo Patarata do Silvestre e da Tomásia
":O)))
Agora o problema em Portugal é o déficit de publicações que não se deixam contaminar, que não cedem à tentação de usar o fait-divers como se fosse notícia séria.
":O))))
este José anda a esmerar-se em ironia
ahahaha
Voilà!
Viva a democracia cor-de-rosa
Felizmente, não há qualquer indicação que tenha havido um uso indevido dessa informação por parte da justiça, mas o que veio a público não justifica resceios por parte dos cidadão?
No caso do 24 Horas e do JPP as razões dos focos assestados, são diferentes, mas ainda assim, semelhantes: têm todas origem em factos errados, opiniões distorcidas pelo desconhecimento básico de certos assuntos e ignomínias lançadas a eito e sem qualquer fundamento sobre instituições ou pessoas que as compõem.
Basta estar um pouco mais atento e ler que é assim...
Quanto ao envelope e suas notícias:
à pergunta -"achas preferivel que o público não tivesse sabido que havia informação passada da PT para entidades judiciais sem consentimento de um juiz?"- respondo assim:
Acho que o público poderia saber que num caso judicial ( este ou outro qualquer) uma entidade administrativa e/ou empresarial, controla informação sensível que pode comprometer figuras de Estado. Este é o primeiro ponto. Ficamos todos a saber que a PT guarda registos de contactos telefónicos da rede fixa ( e os dos telemóveis quem os guarda? Será preciso responder?)em condições que permitem o acesso aos mesmos, dos seus responsáveis.
Segundo ponto:
Acho que seria muito grave que num inquérito qualquer ( este ou outro) uma autoridade judiciária sem poderes para ordenar escutas ( o MP) tivesse coscuvilhado conversas ou registo de conversas sem autorização judicial e sem justificação plausível e processual.
A notícia destes assuntos justificar-se-ia.
O que aconteceu no caso do envelope não foi isto.
Em primeiro lugar o jornal soube logo que as disquetes continham uma listagem de números de telefone de figuras do Estado. Nada mais.
Procurou saber como é que foram lá parar? Procurou. Soube? Soube. Escreveu o que soube? Não! Insinuou que alguém do processo tinha pedido uma lista de telefones para onde determinado arguido tinha chamado ou recebido chamadas e que a lista de telefones do Estado tinha sido espiolhada e escutada.
Que jornalismo é este?!
Mais ainda:
Náo contente em adiantar o que náo deveria e que era falso como se veio a demonstrar e desde logo o jornal poderia ter sabido, investigando junto da PT, começou logo a ligar para os números em causa e a fazer conexões e a tirar ilações ( a pizzaria do arguido e do PGR era a mesma...por exemplo).
Isto admite-se em jornalismo?
Parece que sim.
Então Luís, ficas satisfeito com a resposta?
Só costumo escrever sobre este "alvo", quando leio coisas inadmissíveis em quem escreve e ganha dinheiro com isso, procurando o prestígio inerente.
Ou seja, chateia-me ler baboseiras ainda por cima, apresentadas por quems e julga uma autoridade.
VI ontem a entrevista de Caetano Veloso e achei-a muito interessante.
O tipo viveu a história da MPB e deu-nos um retrato sintético mas aperfeiçoado.
Só não falou do Roberto Carlos e do Chico Buarque. Mas eu falo...é só um bocadinho.
O papel dessa criatura -- Cãncio -- é tanto mais vergonhoso quanto faz aquilo que, no universo anglo-saxónico, se chama o papel da "fag-mother", a amiga da bicha, o pau de cabeleira tapa buracos.
A Câncio sempre foi conhecida no meio gay como caçadora de homens para os gays, o processo é simples, e talvez não o conheça, mas conheço-o muito bem eu: o apreciador de homens aparece de braço dado com uma mulher suficientemente vistosa, num meio inicialmente hetero, e o que acaba por acontecer é que a presa, o idiota fácil, convencido de que está a engatar a mulher, acaba por ir com o par para a cama.
Até aí, tudo bem, estou-me nas tintas para os processos de caça dos outros, o que é degradante é que um indivíduo, com responsabilidades de Primeiro-Ministro, e uma gaja venal, por acaso jornalista, mais uma vez se prestem ao número do costume, o de fingir, em público uma vida privada que não existe, e de encherem as revistas cor-de-rosa, e menos cor-de -- uma coisa que eu não digo aqui...
Em Portugal, os paneleiros são sempre os outros, e há sempre uma namorada secreta do Portas, do Marco Paulo, do Hermann e até o Claúdio Ramos, o José Figueiras e o Zezé Castel'Branco são casados.
É por essas e por outras que continuamos na Cauda da Europa, quer física, quer mentalmente: há sempre um novo hipócrita que vem alimentar a infinita cauda do fingimento.
Se quer saber a verdade, não fale com a Câncio, pergunte à ex-mulher do Sócrates porque é que se divorciou dele, e porque é que, nesse aziago diz, furiosa, lhe partiu um braço com um candeeiro...
Saudações de quem o costuma ler, e com bastante agrado.
(Esse ridículo texto da Câncio já teve uma resposta adequada no http://braganza-mothers.blogspot.com/)
Ora, realmente, não sei que nome dar a isto, mas sei bem que nome me estão a dar a mim e a mais 10 000 000 de Portugueses, aquando isto. Uma das verdades, é que não há limites para a indignidade de certo feminino, a não ser a da indignidade de certo masculino, que lhe faz muito bem par.
Gostaram, não gostaram?... Pois eu adorei, e a sorte é eu hoje até estar bem disposto -- deve ser com o regresso dos filhos pródigos ao Blogue -- senão isto era tratado num tom abaixo de cão, ou de cadela, dado o sexo prático dos protagonistas..."