Investigação "Grande Loja" - O Preço dos Combustíveis

A teoria do liberalismo dos preços, indica-nos basicamente que o mercado ajustará o preço em função da procura do mesmo. Ou seja um determinado produto poderá ter vários preços diferentes em locais não muito equidistantes.

Falo obviamente da gasolina, esse líquido que não bebemos, mas que é essencial para o nosso dia-a-dia. A liberalização do preço do combustível, ainda que numa primeira fase controlada pelo estado, por forma a evitar a formação de oligópolios ou cartéis na revenda da gasolina, passa o onús da fixação do preço para as petroliferas em vez de ser o estado a decretar o mesmo, apesar de uma forte componente do mesmo preço ser definida pelo mesmo estado através do imposto sobre produtos petroliferos.

No fundo, a liberalização associa um conceito de microeconomia, a elasticidade da procura face a oferta. Numa auto-estrada, qualquer que seja o preço, haverá abastecimentos, logo a oferta apresenta uma elasticidade rígida, sendo a procura a ajustar-se. Nas cidades a situação inverte-se. Ou melhor deveria. Mas afirmar que a culpa do elevado preço da gasolina é única e exclusivamente do Estado pode a partida ser um tiro no escuro. Pior é afirmar que a culpa é da liberalização.

O estado iniciou a liberalização em 1 de Janeiro de 2004, apenas e só para a gasolina sem chumbo 95 e do gasóleo, já que para os outros a liberalização já existia. Mas o resultado foram aumentos entre os 2,00 % e os 5,00 % para os combustíveis. Logicamente que isto se traduz num forte aumento não só custos de produção como poderemos ter e a manter-se a tendência uma inversão na tendência da inflação sem consequente ajustamento no desemprego – Mecanismo da Curva de Phillips – a inflação importada .

Mas olhemos para os mercados internacionais de petróleo. Sempre dependentes dos instáveis estados arabés, e de uma organização como a OPEC, o preço do petróleo teve a sua primeira escalada com a subida em 1979 pela OPEC de 14,5 % do preço, e com a deposição de Shah no Irão, o mercado saudita fez ainda em 1979 subir o preço de 19 US para 26 US. O Presidente Carter deixa de importar do Irão e a OPEC reage fazendo diminuir a sua quota para uns pequenos 17 biliões de barris por dia. Pleno choque petrolífero que todos nós já ouvimos falar, com o encarecimento das importações e deterioração dos termos de troca dos países mais dependentes do petróleo. Ano de 1979 e o FMI entrou em Portugal, lembra-se Senhor Mário Soares ?

O mínimo do preço do petróleo foi alcançado em 1998 quando o brent era negociado a menos de 10 USD o barrilalguém percebe hoje qual foi a necessidade de congelar o preço do combustiveis quando o mesmo era negociado ao preço mais baixo de sempre – Senhor Pina Moura . Esta situação aconteceu devido a dois invernos quentes o que diminuiu as necessidades energéticas e a uma subida da produção do Iraque, associado a crise asiática o que trouxe pela primeira vez um superavit no mercado do petróleo. Aliado a isto a OPEC não reagiu por forma a manter o preço em níveis médios.

Curiosamente o 11 de Setembro provocou uma descida abrupta do preço do petróleo com receio de uma generalização do terrorismo e consequente diminuição da procura do petróleo, mas apenas numa primeira fase, já que a partir daí e devido a tensão na Venezuela e ao agravar da situação no médio oriente, o preço começou a sua escalada terminando o ano de 2003 a ser transaccionado nos US 27 /barril. Mesmo com a boa notícia da assinatura do tratado de não proliferação de armas nucleares pela Líbia.

O ano de 2004 náo se revelou melhor, e os acontecimentos do 11-M, e a situação de dúvida da OPEC que ameaça diminuir a quota, colocou hoje o brent a ser negociado nos 32,95 US /barril nos mercados internacionais. O preço mais elevado desde a invasão do kuwait pelo Iraque em 1990.
O que a grande loja, tenta provar é qual foi realmente a causa dos aumentos nos combustíveis.

Eu simples investidor americano comprava com USD 1.000.000,00 :

Ano de 1998
Preço : 10 USD / barril
Barris : 100.000

31 Dezembro de 2003
Preço : 27 USD / barril
Barris : 37.023

29 Março de 2004
Preço : 32,95 USD / barril
Barris : 30.349
Uma subida do preço em relação a 1998 em quase 330 % e face ao final do ano de 2003 em 22 %.

Bom perante estes números, era caso para dizer, poderiamos estar pior. Mas não, se nos lembrarmos que o nosso país transacciona em Euros .

O estado não efectua coberturas cambiais das suas exposições em dólares. Se o fizesse saberia utilizar as flutuações dos mercados monetários e cambiais para jogar a favor. Teve um ano inteiro a assistir a subida do Euro e não soube pensar que um dia o dólar iria subir. Teve um ano inteiro para efectuar em swaps coberturas cambiais para valores em dólares. Não pode apesar de ter razão vir hoje dizer que a culpa do aumento do preço do combustível no consumidor é culpa do dólar. De facto a culpa é o dólar, mas fosse o Estado um bom gestor de fluxos financeiros e teria ganho com esta situação.

Como sabemos o dólar depreciou-se imenso face ao Euro, devido as necessidades do mercado norte americano em financiar o défice, o que leva a reserva federal a procurar dolares no mercado, introduzindo uma quebra deste face as moedas que transaccionam em operações spot ou forward nos mercados cambiais. Dada a ausência de problemas de inflação, a queda do dólar ainda é benéfica para os EUA, a cedência de terreno face ao euro e ao iene actua como mais um mecanismo de impulsão da economia.

Depois dos fortes estímulos fiscais e da queda das taxas de juro é mais um instrumento de política económica que se alia no mesmo sentido, pelo que constitui mais uma arma política a esgrimir para as Presidenciais. Assim o euro fechou o ano de 2003 a valer cerca de USD 1,263 . Hoje o dólar fechou nos 1,2173. Para o ano de 1998 é utilizado o valor EUR/USD 1,00 . Face ao final de 2003, o dólar já recuperou cerca de 5,00 % face ao Euro.

Assim o Estado Português quando pega em USD 1.000.000,00 :

Ano de 1998
Euros : 1.000.000,00
Preço : 10 USD / barril
Barris : 100.000
EUR/USD : 1,00

31 Dezembro de 2003
Euros : 791.703,00
Preço : 27 USD / barril
Barris : 37.023
EUR/USD : 1,263

29 Março de 2004
Euros : 821.490,20
Preço : 32,95 USD / barril
Barris : 30.349
EUR/USD : 1,2173


Ou seja entre 31 de Dezembro de 2004 e 29 de Março de 2004, o custo para adquirir o mesmo valor em USD em barris subiu 3,70 %. Como a venda de gasolina ao público subiu 4,50 %, o valor remanescente é devido em impostos petroliferos.

Se o Estado precisasse de 100.000 barris por dia para garantir a sustentabilidade energetica pagando em dolares, financiando-se em euros em portugal.

Ano de 1998
Barris : 100.000
Preço : 10 USD / barril
Preço USD : 1.000.000,00 USD
Preço EUR : 1.000.000,00 EUR

31 Dezembro de 2003
Barris : 100.000
Preço : 27 USD / barril
Preço USD : 2.700.000,00 USD
Preço EUR : 2.137.598,00 EUR
EUR/USD : 1,263

29 Março de 2004
Barris : 100.000
Preço : 32,95 USD / barril
Preço USD : 3.295.000,00 USD
Preço EUR : 2.706.810,00 EUR
EUR/USD : 1,2173

Ou seja para as mesmas quantidades de petróleo temos uma variação no custo final em cerca de 27 %. Esta análise não é no entanto, a realista uma vez que os mercados de petróleo funcionam em swaps ( compras hoje com entregas a posterior). Ou seja ela apenas serve para que se tenha uma pequena ideia de como o custo com o petróleo associado a valorização do dólar face ao euro, tem de facto encarecido a matéria-prima.


Este estudo pretende assim demonstrar que os aumentos verificados desde 2004, não são devidos a liberalização mas sim as condições verificadas nos mercados petroliferos e cambiais. Não estamos a dizer que o preço que pagamos é o correcto, mas sim que os aumentos verificados tem de facto uma lógica. Da próxima vez que alguém culpar a liberalização por este facto, tenha pelo menos o cuidado de fazer as contas.

Publicado por António Duarte 12:42:00  

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