blogs e jornais
domingo, julho 01, 2007
Os blogs…continuam a ser uma vergonha. Nem todos, porém. Suspeita-se, no entanto, que os mais vergonhosos possam também ser os mais lidos por quem sente a vergonha na pele.
O que serão os blogs vergonhosos? Aqueles que incomodam os sem-vergonha? Os que escrevem sobre os poderes de facto e de direito sobre a coisa política?
A definição escapa ainda à perfeição terminológica dos catalogadores oficiais, pelo que nada mais que um contributo, se poderá acrescentar à noção de vergonha pública exposta nos blogs.
Portugal, em 2007, será o mesmo país que era há 20 anos atrás, no final dos anos oitenta? Quando se diz “mesmo país”, quer dizer-se o país com o mesmo grau de evolução cívica e democrática, o mesmo desenvolvimento económico e a mesma perspectiva geral quanto ao futuro.
Nessa altura, -é preciso lembrar -, não havia Internet, nem telemóveis ou outros modos generalizados, de simplificar a circulação da informação. O que se podia saber publicamente sobre acontecimentos ligados às coisas públicas da governação e administração geral do país, restringia-se à informação provinda de agências de notícias e de media tradicionais, com destaque para os jornais. A televisão nunca logrou ser uma vergonha para os poderes de facto e de direito, ou seja, os que detêm o poder de mandar nos outros, definindo as regras do jogo democrático, executando-as e controlando a sua execução.
As únicas vergonhas expostas durante estes últimos vinte anos, apareceram nos jornais. Um deles se destacou pela quantidade de imoralidades e escândalos que logrou apresentar á consideração pública. O jornal semanário Independente, foi, durante toda a década de 90, antes do aparecimento da Internet, o veículo de denúncia de desmandos de governação pública e ainda o meio de ajustar contas, preferido, pelas oposições variadas aos poderes situados do momento. Os dirigentes do Independente, na altura, faziam oposição política, evidente, através da contestação aos governantes, denunciando os escândalos, mesmo mesquinhos ( o caso da manta no avião, por exemplo). Actualmente, os antigos dirigentes do jornal, são, eles mesmo, parte da super-estrutura que então se dedicavam a escrutinar para a minar em descrédito público.
Quer dizer, actualmente não há, nos jornais, ninguém com interesse político em apear os califas, para lhes tomar o lugar. Há jornalistas e jornais com interesses em sobreviver, seja com a publicidade, institucional e privada, seja com as vendas, tendencialmente diminutivas.
Nenhum blog que neste momento existe, cumpre a mesma função que o Independente se reservou desde o primeiro número. Nenhum blog, neste momento, é a vergonha que foi o Independente, para os poderes constituídos. Nesse jornal, notoriamente, juntava-se o útil da denúncia pública dos desmandos políticos, ao agradável de constituir uma reputação susceptível de encorpar um grupo ou partido político, pronto a disputar o poder executivo- como de facto aconteceu.
As “campanhas” denunciadas pelos poderes políticos, (e publicamente denunciadas pelo próprio primeiro-ministro actual), como sendo sempre orquestradas por forças obscuras e travessas à normalidade democrática, antes da Internet, começavam então, no Independente, na sua maior parte e na parte mais dolorosa para os executivos da época.
Sendo verdade que também os demais jornais cumpriam pontualmente a tarefa de se constituírem como um contra-poder, o que deveria ser sempre a raison d´être de qualquer jornal que se preze, também não deixa de ser verdade que essa tarefa essencial à democracia, mirrou e tende a desaparecer , como se verifica diariamente. O jornalismo de investigação, resume-se a trabalhos esporádicos, efectuados por jornalistas credenciados mas detestados dos poderes públicos que os perseguem despudoradamente, assustando os demais candidatos. São jornalistas malditos que arrostam com o opróbrio das dúvidas e perseguições pessoais que os poderes políticos não hesitam em lhes lançar aos artigos que escrevem. São eles os difamadores da honra impoluta de quem governa e os caluniadores das boas intenções e rectidão de carácter de quem dispõe da coisa pública, muitas vezes como se própria o fosse.
Num país pobre, pobre do jornalista que se meta com poderosos da política, de modo a assustá-los de verdade. Está frito, num instantinho, se tiver por onde possa ser pegado. O poder não perdoa afrontas, porque a perda do poder, é a perda da imunidade de facto. Trata-se por isso de luta pela sobrevivência em que só os animais ferozes e sem escrúpulos de maior, se safam impunes. Até ao dia em que são devorados pela imprevidência, porque a selva guarda segredos e um deles é a imprevisibilidade do tempo e do clima político.
No entanto, a crescente tendência para a concentração dos títulos em apenas algumas mãos privadas de um diminuído número de grupos económicos, reduzem o leque desejável de pluralidade e concorrência informativa a tal ponto que um cronista do Jornal de Notícias ( Manuel António Pina),leitor de blogs, entende que o essencial do que se passa no país, já passou a ser relatado na net e não nos jornais. O que esperar da Sonae, Cofina, Impresa, Media Capital ou Impala, em termos de qualidade informativa? Pouco, muito pouco, que não venha dos profissionais que por aí exercem e da liberdade que lhes é permitida pelas direcções redactoriais. Estará esta liberdade mais assegurada do que há vinte anos atrás, ou antes pelo contrário foi sendo cada vez mais cerceada, por motivações e razões várias?
Mas, voltando ao ponto essencial: o que será, afinal, esta essência que faltará aos jornais e se pode ler na net dos blogs que aparentemente continuam a ser uma vergonha?
Em tempos, já se escreveu por aqui, algo que diferencia os blogs, em modo de qualidade. Um blog interessante, precisa de algumas desinências que o distinga. Precisa de “candor”, ou seja, franqueza ou mesmo sinceridade (as entrevistas da Playboy eram todas “candid interviews”); “urgency”, em português corrente, premência; “timeliness”, podendo significar oportunidade; “pithiness”, que traduzo habitualmente por substância, conteúdo; “controversy”, claramente controvérsia; e talvez “utility”, com o signficado de útil, relevante, interessante para alguma coisa.
Parece-me bem que é isso que falta aos jornais, hoje, como dantes. Se formos analisar, o Independente, tinha disso, um pouco mais do que outros. À medida que foi perdendo uma ou mais dessas características, foi naufragando nas vendas dos escaparates e afundou de vez, logo que se percebeu que perdera definitivamente a candura. Sim, a candura da franqueza e da sinceridade. Para mim, a palavra honestidade também serve.
Um blog que se preze, tem disso tudo. O que lhe faltará, mesmo assim, é a quantidade de matéria-prima para a premência; suficiente substância, para a relevância e utilidade prática, para os leitores. E falta ainda uma equipa que pensa profissionalmente, organiza com meios e produz profissionalmente. Um blog, é um exercício de artesanato do interesse pessoal de quem o anima. Um jornal, uma obra de grupo. Seria por isso importante que o grupo se desse conta disso. Afinal, vivem do que produzem. Um blog, produz aquilo de que vive. É uma diferença substancial, de facto.
Publicado por josé 10:44:00
jmir
E agora até já tem as margens do texto bem alinhadinhas
ehehehe