Jura dizer a verdade?

Leio no Público de hoje que “O jornalista Jorge Van Krieken acusou, ontem, em tribunal, os magistrados do Ministério Público e os agentes da Polícia Judiciária, responsáveis pela investigação do processo Casa Pia de terem falsificado, manipulado e ocultado provas durante a investigação”. E até, “ as coisas apontam para um sentido mais grave. Não só ocultação e manipulação, mas também prevaricação da prova”.
A gente lê estas coisas e fica perplexa. Descrente na polícia Judiciária que temos e costuma ser apresentada como uma das melhores do mundo. Descrente e desconfiada do Ministério Público que nos serve para accionar, em nome de todos, os criminosos e só os criminosos.
Diz ainda o Público que o procurador presente em julgamento, “se insurgiu contra os enxovalhos e ofensas” feitas pelo tal jornalista ao MP. O Diário Digital acrescentou ainda que o procurador referiu que a testemunha «não disse um só facto» ou apontou um «só suspeito» para concretizar o que acabara de dizer, no sentido de que era tudo um «embuste».
O advogado das vítimas terá referido que as afirmações eram graves e que o chocou ouvir falar em “pseudovítimas”.

Ora bem. Não consta que o tal jornalista seja parte no processo, para além do depoimento que ontem prestou.
Não consta que seja advogado e tenha analisado e subscrito qualquer requerimento, aquando da prolação da acusação, para contestar a validade desta. Não consta que tenha legitimidade para sindicar em julgamento, para além do teor de um depoimento necessariamente sobre factos, nesta fase, todas as provas de um processo que já passou pelo crivo de um juiz de instrução que manteve o teor da acusação relativamente aos arguidos que agora respondem.
Não consta ainda que tenha qualquer legitimidade para pôr em causa, do modo peremptório como o fez - e até absoluto-, a actuação de dezenas de pessoas que trabalharam no processo para recolha de prova indiciária suficiente para levar os arguidos a julgamento, e assim lhes imputando a prática de crimes gravíssimos de falsificação, ocultação de prova e denegação de justiça, para além de abuso de poder. Crimes mais graves imputáveis a magistrados e polícias, nessa qualidade, não pode haver.

O que objectivamente o jornalista Van Krieken fez, é muito simples de entender: desacreditou, objectivamente, todo o trabalho, de toda a gente e das instituições que em Portugal têm a incumbência de investigar e accionar criminalmente, nesse caso concreto e nos outros, porque o descrédito não é selectivo.
A contundência dos seus depoimentos e dos seus escritos, terá uma de duas saídas:
Ou o jornalista prova aquilo que diz, com factos concretos e dados objectivos, o que segundo o procurador do processo, não aconteceu; ou a difamação e infâmia se tornam tão graves que haverá necessidade de proceder de modo exemplar, neste caso concreto.
Há uma terceira hipótese a considerar: estar plenamente convencido daquilo que diz porque acredita que é verdade o que disse, agindo de boa fé. Se essa hipótese se confirmar, seria bom que ficasse explicada, para toda a gente perceber como é fácil, a alguém, acreditar em qualquer coisa e dizê-la, sem medir as consequências e usando esse convencimento como arma de arremesso, sem limites na liberdade de expressão. E além disso, influenciar todo um rol de comentadores, jornalistas e espectadores de que afinal esse processo é mesmo uma cabala e quem a montou foram os investigadores.
O que não pode de todo acontecer é deixar em branco e em águas de bacalhau todo este rol de acusações gravíssimas que enlameiam dezenas de pessoas e sujam a reputação de uns tantos polícias e magistrados, bem definidos e concretos.
Quem lê estas notícias, aliás recorrentes, nas ruas e nos cafés e espalhadas pelas vozes comuns do povo que lê e não apreende tudo o que é dito, não pode ser desprezado por quem de direito que não dê a devida importância a este tipo de depoimentos incendiários e alarmantes. O que foi dito, publicamente, não se limitou a um artigo num qualquer blog manhoso e de mera opinião. O que foi dito é de relevância assinalável, porque o foi numa audiência de um julgamento, onde se avalia a prova indiciária de um processo; em que são cumpridas formalidades rituais que passam pelo facto de a testemunha ser ajuramentada para dizer a verdade. É preciso saber se disse a verdade. Ponto.
Alea jacta est.

Publicado por josé 10:16:00  

12 Comments:

  1. josé said...
    "Duvido (talvez com alguma ingenuidade) que declarações tão incendiárias e mesmo ignorantes ("prevaricação da prova"?, o que é isso?) sejam susceptíveis de manchar outra pessoa para além daquela que as faz",

    Meu caro:

    Aqui é que já discordo de si. Este tipo de declarações encontra um eco total nos media, dirigidos por quem sabemos, habituados a desinformar ( não estou a difamar, estou a afirmar com factos que tenho deixado aqui neste blog ao longo destes dois anos).

    Por outro lado, quem lê este tipo de declarações que por vezes se escrevem e colocam em primeiras páginas de pasquins ou de jornais tidos como sérios, não sabe muitas vezes descodificá-las como alguns sabem.

    Resumo: Não devemos substimar a inteligência alheia, mas à cautela, convém responder à letra e explicar o que para muitos é esotérico ou cai que nem sopa no mel.
    Ignorar e desvalorizar este tipo de depoimentos, provoca um efeito que está à vista: muitas pessoas falam em crise e em desmandos e em abusos, acreditando neste tipo de balelas, piamente. E alguns são jornalistas.
    josé said...
    E se quiser saber um pouco mais destes meandros obscuros, prepare o estômago para ler algumas coisas
    Aqui.

    Apetece perguntar se será este o exemplo flagrante daqueles blgos a que José Manuel Fernandes do Público se refere ou até mesmo uma Rita Ferro Rodrigues, nas suas diatribes contra os anónimos, em forma de verme rastejante...
    José Maria Martins said...
    O Pedro Soares de Albergaria está equivocado.

    Toda a gente sabe quem a chamou a depor. Foi quem obrigou o Ministério Público - que dirante dois anos nem deu pelo blogue de tal pessoa - a participar criminalmente de Jorge Van Krieken!

    Quanto ao fim de tal chamamento, cada um deve falar do que sabe e não conjecturar apressadamente.
    para mim said...
    José,

    Não te agradeço o facto de teres comprado a Focus, pois fiz apenas o meu trabalho para que tu tivesses vontade de a comprar. Agradeço, isso sim, o reparo em relação ao Van Kriken. O trabalho de um jornalista é ouvir ambos lados da história. No Caso da Casa Pia ainda não sabemos qual dos lados teve mais ou menos cobertura e até que ponto houve Justiça. Escrevi um livro em finais de 2003 onde dei pistas factuais para se perceber que não iremos nunca perceber nada sobre o caso. E, infelizmente tenho cada vez mais razão... Um dia falaremos pessoalmente e saberás do que estou a falar. Até lá, a Focus, enquanto eu puder, vai tentar continuar a fazer jornalismo, apesar dos pesares... Com ou mais defeitos, mas sempre acreditando que existe uma verdade na história, mas que há partes contrárias com a sua verdade de cada lado. Sabesl, não segui advocacia pois a Justiça é cega e lenta. O jornalismo tenta levantar a venda e obrigar cada um a ver a verdade para que, rapidamente, se possa salvar o ser humano e a sociedade na qual o mesmo se insere. Contudo, cada vez mais constato que as pessoas preferem que lhes vendam ilusões do que desilusões. O que até e compreensível...
    josé said...
    Para ti, Francisco Duarte, posso dizer o seguinte, na sequência do que escrevi no teu blog:

    Este caso ( como outros), pode ser simples ou complicado.

    A fronteira visível reside na convicção de quem ouve, lê, analisa, depoimentos, documentos e na presença dos próprios envolvidos.

    Será impossível determinar com clareza suficiente seja o que for, apenas com base nos palpites alheios ou por ouvir dizer ou por parecer ou por um raciocínio que desmontaste bem no caso do plágio alegado ao Sousa Tavares.
    Há muita gente nesse caso concreto que nem se deu ao trabalho de ler o comparar como tu o fizeste e muito bem, para ter uma opinião definitva sobre o assunto e a inocência do tipo.

    Ora , neste caso, as coisas ainda são mais complexas. E para exemplificar como são estes assuntos de sexualidade, intimidade e reserva de pensamento, sugiro-te que procures algo sobre Ted Haggard que ontem foi notícia.

    Não tenho tempo agora, mas não sei se um dia destes escrevo sobre o assunto, para dizer e demonstrar isto que me parece simples:

    Sobre estas matérias, os envolvidos costumam negar sempre. Isso não quer dizer que sejam culpados. Quer apenas dizer que devemos ter todo o cuidado, mesmo com a convicção íntima.

    Acho que disse o essencial.
    josé said...
    E já que estamos com a mão nesta massa, vamos a outra coisa "to whom it may concern":

    Ontem, li no jornal O Crime que este blog onde escrevo tinha sido alvo de queixa crime, apresentada pelos manos Pedroso, por causa de difamação de um deles.

    Desafio quem quiser ( estou sempre a desafiar estas coisas e ainda não houve uma única resposta aos desafios, mesmo indicando mail) a provar que alguma vez difamei o dito cujo, imputando-lhe factos que considere como tal.

    Nunca escrevi por aqui nada de nada que pudesse interpretar-se como indicação que penso que o mesmo fosse culpado fosse do que fosse.
    Mesmo assim, parece que alguém se sentiu difamado...arre!


    O que eu sempre por aqui escrevi, foi a apreciação de peças processuais em que se dizia que havia indícios disto ou daquilo e disse-o no sentido de explicar o que isso significava.

    Nunca por aqui fiz a figura de um VItal Moreira que transcreveu frases difamatórias dos magistrados do tal processo, tomamdo-as, por erro, como se fossem proferidas pelos juízes desembargadores que não pronunciaram o tal arguido...e depois apagou-as.

    Enfim.
    Acho que apresentar queixa crime por causa de opiniões que se exprimem onde se dá conta de interpretações legais e se tenta explicar o significado de um acto processual como é uma acusação ou um despacho de pronúncia ou mesmo o que significa a expressão "indícios suficientes" em processo penal, não pode ser considerado ofensa à honra seja de quem for.
    Alegar segredo de justiça nesse aspecto particular e num caso como este, nem apetece comentar.
    António Balbino Caldeira said...
    Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
    António Balbino Caldeira said...
    Não vale a pena perder tempo com desinformação.

    O processo Casa Pia devia ter-se resolvido no tribunal. Infelizmente, resolveu-se ... cá fora - na penumbra de gabinetes escusos e sob a luz do torto palco mediático. Quanto aos que ainda estão no processo, o destino será aquele que o povo já previu há muito...

    Ainda me lembro de pedidos dramáticos de pessoas ligadas aos arguidos a reclamar a ajuda de todos os seus amigos... E todos vimos a confissão dos próprios relativamente ao apoio recebido dos confrades políticos.

    Por mais simbólico que seja o retracement pós-traumático da justiça portuguesa, o cúmulo da desigualdade no tratamento de suspeitos, arguidos, acusados, pronunciados, réus, face às vítimas e ao cidadão comum, fica, para o povo letrado e iletrado, como a evidência última da submissão do poder judicial ao poder político, com as excepções funestas que se conhecem.

    O resto é lixo desinformativo: Muito Mentiroso e quejandos, media sistémicos... Táctica O.J. Simpson de refugo, ampliada por media e editores cúmplices, numa orquestração e censura como não se via desde o tempo da ditadura!...

    A impunidade sentida no serviço sujo de apoio desinformativo dos amigos entalados é tão grande que é normal alargar-se, sem vergonha nem consequência, o jogo da violência moral sobre as vítimas físicas ao banco do tribunal, atirar-se o lixo da difamação, a porcaria da mentira, a mancha da calúnia. Como é absurdamente normal, neste país de controlo político sistémico - - que se estenda impunemente as mesmas calúnias e insultos aos denunciadores, investigadores dos crimes e defensores das vítimas. A impunidade vê-se também, por exemplo, na resposta judicial que considera a legitimidade (!!) da imputação de crimes graves aos investigadores.

    Este é o tempo negro em que um ministro se demite porque cai uma ponte velha, mas não se viu um acto de contrição e auto-afastamento dos responsáveis políticos directos com a tutela duma instituição do Estado para a guarda de menores (a Casa Pia de Lisboa) relativamente aos abusos sexuais de crianças aí praticados durante décadas e sobre os quais existiam denúncias consecutivas.

    Os testemunhos de crianças não prestam quando atingem um alegado abusador notório, mas já é digna de crédito e difusão a atoarda desinformativa lançada por um amigo defensor de um arguido.

    Na balança do poder, as crianças vítimas de crimes sexuais na Casa Pia não têm direitos, nem sequer personalidade - são untermenschen (sub-humanos). Não contam: 40 jovens queixosos abusados em crianças não chegam para punir uma personalidade notória; nem cem vítimas valem um poderoso.

    Alguns supõem que seja isto a vida e que todos devemos resignarmos com os abusos. Eu creio que isto é a morte de um sistema corrupto e que a dignidade dos homens não tem preço.
    Fernando Martins said...
    Só não consigo perceber por que motivo continuam a chamar jornalista a Jorge Van Krieken... Pode-se-lhe chamar muitas coisas, mas jornalista...
    zazie said...
    "Só não consigo perceber por que motivo continuam a chamar jornalista a Jorge Van Krieken... Pode-se-lhe chamar muitas coisas, mas jornalista...


    é para disfarçar...

    ";O)
    JPRibeiro said...
    josé, compreendo e partilho (sublinhado) a sua sanha contra o tal van Krieken, pelos seus (cito) "enxovalhos e ofensas", e (volto a cita-lo)"Ou o jornalista prova aquilo que diz, com factos concretos e dados objectivos, o que segundo o procurador do processo, não aconteceu; ou a difamação e infâmia se tornam tão graves que haverá necessidade de proceder de modo exemplar, neste caso concreto" (fim de citação).

    Mas se você é jurista, surpreende-me que não use o mesmo critério para as graves acusações de João Cravinho cujo panegírico você assina há dois dias atrás, e que você cita louvando quando ele afirma que a corrupção "levou à captura do Estado, por grupos que hoje partilham a influência de determinados sectores", ou "advento da democracia, favoreceu o tráfico de influência, a colocação de pessoas em pontos-chave do sistema e a fidelização de clientelas de vários partidos", ou ainda que "cabeça do polvo...reside entre grupos, de certos sectores da admninistração". Qual é o sumo disso? Para mim, isso são afirmações tão banais, tão vagas e que deixam ficar tão mal largos sectores da nossa sociedade, que mereciam, sem dúvida, o mesmo comentário que você fez para o van Krieken.
    Não estou a meter o van Krieken no mesmo saco do Joao Cravinho: o primeiro tem tido um comportamento indigno, mas o segundo, - onde estão as provas (nomes e moradas)do que afirma?
    Biranta said...
    Venho agradecer a publicidade!
    Afinal, ao fim de todo este tempo a receber visitas através deste link, o mínimo que posso fazer é agradecer.

    Depois, como discordo, em absoluto, do que é dito no post, e do seu tom primário e incivilizado, acho excelente que os que se intoxicam aqui leia coisas diferentes. Quem sabe? Talvez haja alguns que saiba pensar pela própria cabeça.

    Van Krieken tem toda a razão e eu apenas escrevo sobre coisas que conheço ou que, no mínimo, sejam amplamente confirmadas pelas evidências...

    Mas ainda não agradeci os elogios. Num antro destes trata-se de elogios, certamente.

    além disso, cada um fala daquilo de que entende... e aqui, de facto há especialistas em assumir a forma de vermes rastejantes... Tal como o autor da "tirada"

    Coitados é dos cidadãos deste país sujeitos a "justiça" aplicada por gente assim e avaliada por outros ainda piores.

    É por isso que este país está perdido...

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