violinos de chopin
domingo, novembro 06, 2005
Passe a publicidade, nada como ler o Expresso deste fim-de-semana para acabar a noite a sorrir lendo a descrição das declarações com que esta semana no Parlamento ministra da cultura Isabel Pires de Lima e deputados João Teixeira Lopes, Manuela de Melo e, estranhamente, Honório Novo, dado que o não tinha na conta de pessoa dada à ingenuidade, resolveram abrilhantar a comissão parlamentar de ciência e cultura, a propósito do já estafado tema relativo à definição do modelo institucional para a Casa da Música [Porto].
João Teixeira Lopes, do BE, defendeu, na linha de Pires de Lima, que o Estado deve «manter uma posição de primazia na CM, contra qualquer tentativa de o Conselho de Administração (CA) condicionar a programação».
Curioso, para a Senhora Ministra da Cultura e para o deputado Teixeira Lopes o importante não é sustentabilidade do equipamento, a eficácia e a eficiência que uma qualquer administração responsável pugnaria por pôr em prática, o importante é a “programação musical”, como se esta não fosse o principal instrumento de gestão de uma instituição cultural que uma administração pode e deve ter ao seu critério, tratando-se, a final, de algo que corre à margem das contas do deve e do haver, o que é errado pensar. Sensato não seria, mas pelo menos mais honesto era-o de certeza se, em vez de se referirem à programação da CdM, dissessem que o que se pretende é não condicionar o seu futuro programador – that one! Desta forma é que não estão a ser nem uma coisa nem outra, o que é lamentável.
Da mesma opinião é a socialista Manuela Melo, que lembrou «a ruptura da fé negocial» ocorrida há sete meses, quando a ex-ministra Maria João Bustorff acordou com os fundadores 10 milhões de euros de capital e depois inscreveu no diploma 900 mil.
É verdadeira a afirmação que a deputada Manuela de Melo, futura ministra da cultura, proferiu. Aqui mesmo ainda recentemente se chamou à atenção para a argolada então cometida. Agora, teria ficado muito bem à deputada do Porto exigir que o actual governo repusesse os estatutos na exacta forma em que foram acordados com o grupo de fundadores privados e, porque não, que insistisse para que o presidente do conselho de administração da fundação fosse o nomeado em Janeiro deste ano. Ficava-lhe bem e era um gesto coerente como reparo dirigido ao PSD, pois se estes meteram água ao alterar à socapa as regras de financiamento, o lógico era corrigir o vício e não partir deste para alterar as regras do jogo ao sabor de conveniências, procurando ao mesmo tempo dar a entender que o responsável pelo estado de indefinição em que se encontra a CdM decorre ainda da malévola actuação do falecido governo do dr. Lopes, o que já não é verdade.
Terminando a ronda de intervenções, Honório Novo, do PCP, lamentou a «escassa disponibilidade de financiamento» dos privados - que entram na Fundação com 50 mil euros cada um e não contribuem para as despesas correntes.
Meu caro e estimado deputado Honório Novo, desde quando é que privados deverão contribuir para despesas correntes, substituindo-se ao papel que cabe ao financiamento público? Destes, o que se espera, e não é assim tão pouco, é que em consonância com as necessidades do projecto e do público saibam gerir os recursos melhor do que um qualquer comissário político do bloco central disfarçado de gestor encartado. O que estes poderão proporcionar à instituição é a prática de uma gestão criteriosa e rigorosa, algo a que, no âmbito do Estado em geral e da cultura em particular infelizmente não estamos lá muito habituados. Mais do que isso é sonhar alto.
PS: Enquanto me entretenho a postar escutando o concerto de piano a quatro mãos “The Circle of Life” de Shubert, em que Pedro Burmester participa, pergunto a mim mesmo se este, ao continuar a recusar-se a tocar na cidade do Porto enquanto Rui Rio for o presidente da câmara, não irá também pelo mesmo motivo recusar o cargo para o qual o governo o irá certamente propor. Ou se, pelo contrário, para além do já castigo que temporada a temporada inflige aos portuenses, não lhes apresentando um único que seja concerto para piano, não estará a pensar em agravá-lo, aceitando o papel de ser o futuro programador da mesma. Uma pergunta com resposta de escolha múltipla à qual, Pedro Burmester, com sentido de humor, poderá, em directo e ao vivo, responder neste humilde blogue.
Publicado por contra-baixo 01:31:00
Quanto à importância que estão a atribuir às funções do programador - quer a si lhe parece exagerada - há que agradecer, também, aos futuros fundadores, ou melhor, a quem os lidera e aos motivos que o fazem mover-se...
Bem pelo contrário!
Não me parece nada exagerada a importância que se atribui ao programador, de tal forma a entendo como estruturante, que considero que deverá estar em total consonância com a orientação que a futura administração da cdm pretende prosseguir. Com o que eu não me identifico é com a ideia de programador enquanto poder paralelo dentro de uma organização com prerrogativas de poder que decorrem dos estatutos da instituição e que, mais cedo ou mais tarde, irão ser causa de conflitos dentro da organização.
A actividade de programador é uma competência que alguém, seja quem for, coloca ao serviço da organização e cujo conteúdo se define contratualmente, consoante o fim que se pretende atingir.
O peditório para o qual não dou é a ideia do programador todo poderoso, que actua por vontade própria e muitas das vezes contra a administração da organização, entendo por isso que a preocupação que o actual MC e deputado Teixeira Lopes são sintomáticos de uma ideia que é conveniente não deixar vingar, caso contrário iremos ter uma Casa que viverá permanentemente em conflito, dado que os egos se irão sobrepor ao interesse do projecto que é colectivo e não de uma só pessoa ou de um grupo de interesses. Além do mais, permita-me que lhe diga que a programação não sendo uma ciência exacta, não pode ser apenas um mero exercício de gosto por mais interessante e refinado que possa ser. Programar é fundamentalmente interpretar o interesse colectivo e utilizar da melhor forma dos meios ao dispor, ponderando muito bem os custos de oportunidade que as decisões implicam e, convenhamos, nem sempre os ditos directores artísticos estão vocacionados para o fazer.