"Farsa Inadmíssivel"

É este o título do Editorial de hoje do Público. Nuno Pacheco, Director Adjunto, escreve asperamente sobre a morte acidental de um cidadão brasileiro em Londres, abatido por engano, a sangue frio, pela Scotland Yard. Pacheco descreve longamente todo o incidente, a fase de denial e encobrimento que a Scotland Yard tentou num primeiro tempo, para concluir que o engano é inadmíssivel num estado democrático. Pede um "desfecho implacável" e "coragem para isso". Confesso que concordo muito mais com o Pacheco do Público que com o pretensamente sofisticado relativismo moral de Pacheco Pereira expresso aqui (e que foi acrescido de um 'esclarecimento', verdadeira lição, enviado a JPP por Eunice Goes, correspondente do Expresso em Londres, e à qual JPP não dedicou que tenha visto uma letra). Pacheco Pereira escreve que...

O cidadão brasileiro que foi morto por polícias à paisana em Londres não foi “roubado” nem da “dignidade”, nem do “respeito” pela polícia. Foi vítima de um trágico engano, num momento ainda mais trágico, em que um gesto precipitado e um clima de perigo, o matou também a ele. O que me revolta é que parece que em Londres só morreu Jean Charles de Menezes e mais ninguém. Ou que a morte dele foi a Maior e as outras, as Menores.
mas, apressado, não percebeu nada. O drama maior não é o trágico engano, o drama maior é a contextualização, a relativização que se tenta fazer, ao colocar tudo no mesmo patamar. Sendo certo que todas as mortes são lamentáveis, o facto é que há uma diferença - bem grande - entre morrer às mãos de terroristas e morrer, ainda que por engano, às mãos daqueles que deviam proteger civis desses mesmos terroristas. O que devia revoltar Pacheco Pereira era o facto do combate ao terrorismo, e que visa salvar vidas, ter roubado uma vida, e não uma frase do Expresso alegadamente mal construída. Quanto à questão da dignidade onde Pacheco Pereira dispara imperialmente que ...
A Culpa não é dos terroristas da Al-Qaida, que eles sim mataram o infeliz trabalhador brasileiro, eles sim lhe roubaram a “dignidade” e “respeito”, mas a da polícia londrina para quem todas as indignações se dirigem.
mais uma vez Pacheco não percebe nada, rigorosamente nada. O objectivo da Al-Quaeda é espalhar o terror, o terror pelo terror, o pânico, democratizar a violência, para eles todas as mortes são justificaveis porque são um meio para atingir um fim (para eles considerado superior), ora - numa democracia, num estado de direito - nenhuma morte civil é justificável, é útil, no combate ao terrorismo, mais, o fim supremo de combate ao terrorismo não implica secretismos nem aldrabices pegadas como as que a Scotland Yard tentou impingir, sim destruindo toda e qualquer dignidade ao infeliz cidadão brasileiro. J. C. Menezes podia ter sido só e apenas uma infeliz casualidade na luta contra o terrorismo, mas ao encobrir o erro, ao tentar pintá-lo, a Scotland Yard, muito mais que no erro inicial, errou infinitamente (e é aqui que falha o editorial do Público que não distingue entre um momento e outro, entre uma precipitação e uma acção deliberada e racional de encobrimento) transformando Menezes em algo mais do que uma vítima. A morte de J. C. Menezes deve servir para nos recordar que numa democracia madura mentir e encobrir é sempre o pior remédio pois não vale tudo para se viver em segurança, é que, como já escrevi em tempos, entre a liberdade e a segurança escolho a liberdade . Pacheco Pereira ao que parece pensa de outra forma, é pena.

Publicado por Manuel 19:25:00  

6 Comments:

  1. Anónimo said...
    Em relaçao à gerra do Iraque ou à America há pessoas que nem que lhes torturassem a avozinha arranjavam uma desculpa para o acontecido. Já houve uma altura em que isso me incomodava. Agora nao lhes dou credito nenhum.
    lino said...
    "... escolho a liberdade."
    Um erro trágico, lamentável, que todos queremos que não se repita, está a desviar-nos a atenção relativamente ao inimigo principal. O problema é que, se quisermos abdicar da nossa defesa, poderá dar-se o caso de irmos de cedência em cedência até já não termos possibilidade de escolher a liberdade.
    Manuel said...
    Meu caro lino, as "cedências" são erradas. No sentido que refere e no outro.
    Teófilo M. said...
    Claro, o JPP tem o mérito de saber transformar o bacalhau, que é peixe, numa suculenta peça de carne, conforme o que lhe dá mais jeito na ocasião...

    Por isso é que é político, e não biólogo.
    Anónimo said...
    Brazil and Latin America (and all other countries that care) should threaten to boycott the London Olympics unless full justice is delivered on the Menezes case. Even if the boycott never takes place, I think that the sight of citizen rallies on the streets and the publicity they will get will by the conflict-hungry media will force the Brits to change their tune.
    Anónimo said...
    Caro Manuel

    Muitas vezes não concordo consigi, mas neste caso, subscrevo inteiramente o que afirma.O problema é que começamos a por em causa a nossa liberdade e desta forma os terroristas ganham.

    François Marie Arouet

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