Ora bolas!

Vital Moreira que elogiei há bocado, escreve agora esta:


De facto, a denúncia de infracções criminais constitui uma obrigação legal das autoridades e dos funcionários públicos, tanto segundo a lei processual penal como a legislação disciplinar, não havendo excepção para as escolas. O que, aliás, não dispensa, bem entendido, o exercício da acção disciplinar. [Publicado por Vital Moreira] [4.4.08].

Já não se pode elogiar ninguém.

A denúncia de infracções criminais é obrigação legal das autoridades e funcionários públicos? Todas as infracções e mesmo algumas, de carácter disciplinar?
Onde é que isso vem? Em alguma lei particular, apenas conhecida do lente?

Aditamento:

A resposta já está nos comentários, mas fica aqui também. A participação obrigatória, para funcionários e autoridades, a que se refere a lei processual penal, no artº 242º CPP, só se refere a crimes de natureza pública.
Ficam de fora desta obrigatoriedade, os crimes que dependem de queixa ( por exemplo, agressões físicas) , incluindo naturalmente os de naturesa particular, como são os de injúrias e difamação. ( caso Charrua...).

Assim, ficam dentro do preceito, crimes como os de corrupção, por exemplo. Quantos crimes deste género, foram efectivamente denunciados por membros do poder político que podem e devem ser considerados funcionários nos termos da lei penal?
Que ministros, que secretários de Estado, que directores-gerais, que directores de serviços, que dirigentes de empresas públicas e semi-públicas, que professores universitários, que deputados, que membros de gabinetes, que altos funcionários administrativos, já participaram crimes de que tivessem conhecimento directo?

Há por aí uma candeia de Diógenes? Há? E que acontece a quem fiver orelhas de mercador em casos que tais? Acontece alguma coisa? Há crime concreto para quem, vendo, fecha os olhos e faz que não vê?
Em resumo: o artigo 242º do CPP vale para alguma coisa, tirando a chicana politiqueira?


Quanto aos crimes praticados por menores, o que era o caso concreto em análise, nem sequer poderemos citar o CPP. Antes disso, há a lei tutelar educativa. E o bom senso, claro.
Mas sobre este requisito, há muito tempo que deixei de espera tal coisa nos escritos sobre as causas.


Publicado por josé 01:20:00  

21 Comments:

  1. zazie said...
    "Já não se pode elogiar ninguém"

    ahahahahahaha
    o sibilo da serpente said...
    José:
    Creio que a ideia é a de que uma infracção criminal deve ser denunciada por quem é funcionário público. Não está isso previsto na lei? De momento, não tenho a certeza, mas parece-me que sim.
    josé said...
    Qualquer infracção criminal?

    Todos bufos, portanto, de assuntos de natureza criminal, particular, semipública e disciplinar?

    Nem sequer ponho o problema da inconstitucionalidade, porque me parece despiciendo...

    Ponho só o do rigor e do bom senso.Coisas que desde há muito deixei de esperar no blogger da causa nossa.
    Gabriel Silva said...
    «Qualquer infracção criminal?»

    De acordo com a lei, sim.

    Ver Artº242, 1. b do código do processo penal:

    «1 - A denúncia é obrigatória, ainda que os agentes do crime não sejam conhecidos:

    a) Para as entidades policiais, quanto a todos os crimes de que tomarem conhecimento;

    b) Para os funcionários, na acepção do artigo 386.º do Código Penal, quanto a crimes de que tomarem conhecimento no exercício das suas funções e por causa delas.
    josé said...
    Crimes particulares não. Crimes semi-públicos, não. Artº 242º nº 3 do CPP.


    Infracções disciplinares, não também.

    Portanto, só é obrigatório, se forem crimes públicos.


    Parece-me.

    Outra coisa: e se não forem participados? Por exemplo, os crimes de que os membros dos órgãos societários tiverem conhecimento, o que pode acontecer?

    Nada. Absolutamente nada.

    O artigo 242 do CPP é uma norma celerada e por isso vazia de conteúdo prático.

    You know waht i mean?
    josé said...
    A detenção de uma arma proibida por uma criança é classificado como crime, pela lei penal.

    A participação no entanto, sendo obrigatória não resulta da lei processual penal que não se aplica aos menores.

    Resulta eventualmente da lei Tutelar de menores que não tem a mesma redacção.
    Aqui deve reinar o bom senso.

    Acha que anda a reinar, neste caso?
    Gabriel Silva said...
    «O artigo 242 do CPP é uma norma celerada e por isso vazia de conteúdo prático.»

    Esclarecido.
    É só coisas fascinantes.
    jferraz said...
    Penso que as injúrias/difamações cometidas contra Professores no exercício e por causa das suas funções não se revestem de natureza particular mas sim de natureza semi-pública. (art.º 188º CP + art.º 184º CP + 132º do CP)
    josé said...
    Também acho que é semi-público. Mesmo assim, não é de participação obrigatória.

    Nem faria sentido.
    António said...
    Salvo o devido respeito, da leitura do nº 3 do art. 242º, do CPP, infere-se que a denúncia é sempre obrigatória. O que ocorre é que, no caso de crimes semi-públicos e particulares, ela só dá lugar a instauração de inquérito se for apresentada queixa, no prazo legal e por quem tem legitimidade para o efeito.
    António said...
    Adenda:
    Atenção à nova redacção do nº 3 do art. 242º do CPP
    josé said...
    Ai é? E quando é se instaura Inquérito?
    Sempre que uma pessoa quiser? Ou logo que se recebe uma denúncia?

    Não é obrigatório abrir um Inquérito logo que aparece a denúncia?

    Lembra-se do papel anónimo no processo Casa Pia?

    Aliás esta posição que tomei, já o Costa Pimenta a tinha tomado em 1987, na altura da publicação do seu Código anotado.

    Mas nem era preciso isso, porque só pergunto:

    Faz algum sentido uma autoridade qualquer ou um funcionário público, ter que fazer queixa por causa de uma injúria que ouça na repartição dirigida a outrem?
    josé said...
    E o Simas Santos diz o mesmo. E não é a nova redacção do nº 2 que altera as coisas.


    Antes pelo contrário, porque dantes dizia que o disposto nos números anteriores não prejudicava o regime dos crimes semi-públicos e particulares. O que vai dar ao mesmo.
    josé said...
    nº 3 queria dizer.
    Laoconte said...
    Estou mais descansado com o caso BCP, afinal, ao contrário do que vinha veículada nos jornais, não havia crimes, caso contrário os funcionários (altos ou baixos) já teriam cumprido o artigo 242º do CPP.
    António said...
    Não, não é obrigatório instaurar inquérito quando se recebe uma denúncia. Essa é a regra, mas há excepções. Este caso é uma delas. Outro, por exemplo, é a denúncia anónima - art. 246º, nº 5 (a contrario) e 7. Ver tb. art. 262º, nº 2.
    josé said...
    Quais são as excepções do 162. É que a redacção actual é a mesma que a antiga e dantes já era assim. Trata-se do princípio da legalidade.
    As excepções não têm a ver com isso, mas com os processos sumário e sumaríssimo.

    E a redacção do 246 e 262, é recente. Por causa daquilo que nós sabemos e que teve a ver com a Casa Pia. E não só.
    o sibilo da serpente said...
    Boa discussão que despertei sem querer. Não vou entrar bela, porque já estou com ar de fim-de-semana.
    naoseiquenome usar said...
    Caro José:
    - O, ainda em vigor, Estatuto Disciplinar (ED)dos funcionários e agentes, aprovado pelo DL 24/84 de 16/01, diz que "quando os factos forem passíveis de ser considerados infracção penal, dar-se-à obrigatoriamente parte dela ao agente do Ministério Público (...)".
    - Nada impede e o princípio da oportunidade aconselha-o, nos limites da legalidade, que, os factos apurados em processo penal, sejam, aproveitados em processo disciplinar.
    - Atendendo aos fins de cada um dos tipos de direito, a valoração dos mesmos factos poderá ser, ou não, coincidente, podendo o MP acusar e a Administração arquivar, ou vice-versa.
    josé said...
    Sendo verdade que nada impede, parece-me que tal só ocorrerá nos casos de crimes públicos. Só nesses se verifica a obrigatoriedade de participação, como é lógico e aconselha a boa doutrina.

    De contrário, que diferença há entre este regime e o de Salazar/ Caetano, quanto á bufaria?

    Não é verdade que também nesse regime, a lei a tal obrigava?

    E será princípio e valor que a democracia preze assim tanto?
    naoseiquenome usar said...
    E porque não perguntar ao legislador? :)
    Boa noite.

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