Um caso de polícia

Moita Flores como perito, ex- inspector, criminalista, etc. etc. disse há poucas horas, na SIC que é indecoroso o silêncio da polícia portuguesa, da PJ, relativamente ao caso Maddie/McCann.

Moita Flores, acha que tem existido, desde sempre, uma dificuldade inadmissível, das autoridades policiais e não só, em comunicar ao público em geral, assuntos desta natureza, explicando o que no seu entender, deve ser explicado.

Moita Flores foi polícia, agora é autarca e antes disso e em concomitância, foi e tem sido comentador de televisão e guionista de séries sem grande fôlego qualitativo, intervindo agora, na extraordinária qualidade de perito nestas matérias. Os verdadeiros criminalistas, devem sentir alguma vergonha, desta encenação mediática, porque Moita Flores, pese embora toda a sua boa vontade, não é um perito criminologista ou se o pretender ser, não andará muito longe de um Inspector Varatojo, de saudosa memória, aliás.

Moita Flores, porém, não se dá por achado e lá vai alvitrando palpites de senso comum e de sensatez regular, numa bonomia que conquista o écran, mas ajuda pouco em esclarecer coisas fundamentais nos assuntos de que trata.

Desta vez, acusa as polícias de falta de comunicação e terá alguma razão. Mas…que razão será essa que poderemos atender?

Moita Flores não conhecerá suficientemente o Código de Processo Penal, para saber que os esclarecimentos, para além do segredo de justiça, só se admitem, em casos contados e definidos no artigo 86º nº 13 ( versão actual) do CPP.? Diz assim, o preceito:

O segredo de justiça não impede a prestação de esclarecimentos públicos pela autoridade judiciária, quando forem necessários ao restabelecimento da verdade e não prejudicarem a investigação:
a) A pedido de pessoas publicamente postas em causa; ou
b) Para garantir a segurança de pessoas e bens ou a tranquilidade pública.

Nenhuma destas circunstâncias ocorre, no caso concreto, actualmente, a não ser que Moita Flores, entenda que está em causa a tranquilidade pública…

Para além disto, este caso, tem algumas particularidades de forma e de fundo que o tornam singular, independentemente da essência da investigação e descoberta da verdade material relativamente à qual nem me atrevo a dizer seja o que for e espanta-me que alguém o faça, com a desenvoltura de quem está por dentro do assunto e dominas os pormenores.

Uma delssas particularidades, é a continuada violação de segredo de justiça naquilo que este tem de mais genuíno: a protecção da investigação. Alguém se importou com isso, como se importou por exemplo e para não irmos mais longe, com as violações de segredo no processo Casa Pia? Alguém, daqueles do costume ( Proenças, Júdices, Amarais, Tavares e outros), apareceu a reclamar a responsabilização do actual procurador-geral da República, pelas contínuas e graves ( agora ainda mais do que antes e de evidente proveniência) violações do segredo de justiça? Ninguém apareceu, o que me autoriza a chamá-los de hipócritas.

Por outro lado, este caso, como todos os Inquéritos tem uma direcção: o MP. Alguém ouviu o MP, neste caso? Discrição, sim, mas tanta reserva até ao ponto de se deixar ao cuidado da polícia, toda as despesas da interacção com a comunicação social, é um sinal inequívoco que se dá a toda a gente, de que o caso é exclusivamente de polícia e nada tem a ver com as magistraturas. Alguém conhece o procurador do processo? O juiz de instrução? Compare-se com outros casos recentes, totalmente ao contrário e tirem-se as conclusões, para se fazerem as interrogações, sobre este modo particular de encarar o processo penal português.

O drama maior, neste aspecto e para além do resto, parece-me este. Os cínicos da magistratura, dirão que assim, se as coisas correrem mal, quem se queima na praça pública é a polícia. Será?

Vasco Pulido Valente, na sua crónica de ontem, Domingo, escrevia preto no branco que estes casos de polícia, recentes, humilham a Justiça. Tomem nota, porque o crítico desta vez, é certeiro.

Publicado por josé 02:22:00  

3 Comments:

  1. Luís Negroni said...
    Simplesmente um caso de tempero. O segredo de justiça é para usar como o sal. Aqui não se usa segredo de justiça, ali usa-se moderadamente, além usa-se sem restrições. É consoante o prato, perdão, processo. Os senhores e senhoras da PJ e do MP são quase todos excelentes gastrónomos, têm um paladar apurado.
    Alexandre Vieira said...
    Será que a miúda (Maddie) também vai ser constituída arguida?
    Será que os inspectores que revelam as informações vão ser constituidos arguidos?
    Cá por mim prefiro ser ouvido como arguido do que testemunhas, nem que seja por homicídio de um qualquer canários, pois:
    - Parece claro que as testemunhas hoje em dia, em virtude do sucedido no Caso Casa Pia, em relação às vitimas que mais tarde viram-se constituídas arguidas por terem testemunhado segundo a sua ciência, preferem ser constuidas arguidas do que seram ouvidas como testemunhas.Por um único e simples motivo: senão for deduzida acusação são acusadas do crime de difamação.
    Mais vale garantir e mentir (que até é um direito que assiste ao arguido) do que dizer a verdade e penar.
    MARIA said...
    Caro José,
    Neste caso concreto é difícil avaliar como seria se o Magistrado titular desta investigação assumisse relativamente a ela outro tipo de atitude.
    A mim parece-me que os Magistrados devem reservar -se e em particular aos processos de publicidade, porque os efeitos desta são sempre maioritariamente negativos.
    Em todo o caso, quando a mesma não é evitável, ou está consumada, também me parece que se deve tomar posição.
    No caso, parece mais criticável o que não se conseguiu conter e calar, do que aquilo que podia ter sido dito e também não foi...
    Um bj
    Maria

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