O crime compensa?
terça-feira, julho 17, 2007
O cronista do Público, Rui Moreira, abespinhou-se um pouco com o escrito de ontem e escreveu um comentário na caixa de baixo. Hoje, mais calmo, voltou a comentar e levantou algumas questões que merecem reflexão. Uma delas, sobre o segredo de justiça, ficará bem entendida se o autor ler o que escrevi no postal abaixo, sobre o assunto.
Outra, mais interessante, é sobre isto:
“O José diz que eu não sei que Jorge Sampaio foi escutado. Uma pergunta: o José sabe que o Jorge Sampaio não foi escutado?”
Ora, esta pergunta, inverte o sentido da afirmação da crónica, que positiva a escuta ao presidente Sampaio, dando-lhe um novo fôlego que já não tem. Uma escuta, no âmbito do processo Casa Pia, entenda-se. Uma escuta nunca provada, indiciada sequer ou mesmo suspeita pelo próprio que a propósito nunca se pronunciou nesse sentido, apesar da vergonha que fez passar ao anterior PGR, por causa disso.
Como já se escreveu, a única entidade a descobrir que Jorge Sampaio teria sido “investigado”, nesse processe, através dos telefonemas que fez, foi o jornal 24 Horas, dirigido por esse vulto do jornalismo português, Pedro Tadeu, antes tirocinante no Avante. A credibilidade desta notícia foi imediatamente posta em crise, sendo negada por comunicados da PGR e por opiniões escritas de quem julga saber algo mais acerca das linhas com que se cosem os processos penais em Portugal. É que ao contrário do que Rui Moreira supõe, para se expender opinião sobre algo, é preciso saber algo sobre. Não basta querer e julgar que se pode. Neste caso, o querer não é poder. É muitas vezes, antes, não dever.
Não obstante, Rui Moreira, continua a acreditar que talvez Jorge Sampaio tenha sido escutado. E pergunta-me se porventura eu saberei se não foi…
Ora aqui é que o ponto bate, porque quem pergunta, é porque não sabe.
E nisto de saberes, é preciso mostrar as razões de ciência para que todos entendam porque é que alguém pode dizer o que diz ou afirmar o que afirma. Daí o tal currículo reclamado ou inferido.
Quando eu afirmo e escrevo que Jorge Sampaio não foi escutado ou investigado ( a semiótica conduz ao mesmo resultado pretendido por quem insinua tais coisas), digo-o porque li os comunicados da PGR, o despacho final do processo onde tal matéria se investigou e ainda escrevi logo no dia em que a notícia saiu para a rua, na capa catita do 24 Horas, que o escrito era uma falsidade. Como de facto, era.
Um presidente da República, não pode ser investigado num processo como o da Casa Pia, do modo como se fez a investigação, ou seja, por um grupo de procuradores adjuntos do MP. Mesmo que as escutas nesse processo, relativamente a outros intervenientes, tenham sido- como se provou que foram- autorizadas ou ordenadas por magistrados judiciais, a partir do momento em que surgisse a mais leve suspeita de comportamento criminoso imputável ao presidente da República, parava aí a competência investigatória dos titulares do inquérito e o assunto passaria para outra instância. É preciso saber isto, que aliás vem escrito na Constituição no artº 130:
1. Por crimes praticados no exercício das suas funções, o Presidente da República responde perante o Supremo Tribunal de Justiça.
4. Por crimes estranhos ao exercício das suas funções o Presidente da República responde depois de findo o mandato perante os tribunais comuns.
Sabendo isto, só por estultícia se pode escrever, como o fez o 24 Horas do intrépido Tadeu que “Até os telefonemas de Sampaio foram investigados” no tal processo.
Por outro lado, mais perigoso ainda se torna, supor que a escuta a Jorge Sampaio, poderia ter sido realizada por alguém do processo, mormente polícia ou magistrado que eventualmente tivesse acesso a tal facilidade, (o que no caso, seria manifestamente ilegal, como se viu), e a procedimentos de escutas ao presidente, por via indirecta, ou seja, por este ter sido apanhado e gravado, a telefonar a amigos ou correligionários e tal conversa ter servido de prova para algo mais do que o que estava directamente em investigação.
Uma tal prática, inútil, deletéria, voyeurística e simplesmente criminosa, no fim de contas, serviria para quê, afinal? Para nada. Rigorosamente nada que pudesse aproveitar-se processualmente. Quem é o polícia ou magistrado que arrisca a carreira, por coisa tão inútil?
Logo, tenhamos o bom senso de entender que as suspeitas acerca de escutas ilegais, realizadas por entidades oficialmente credenciadas, no âmbito de um processo como o da Casa Pia, são fruto de ideias antigas, vindas do escuro dos tempos das ditaduras em que se pressentia pelos ruídos e estalidos do telefone que alguém estaria do outro lado, à escuta. Atavismos, portanto, que demoram a passar aos arquivos mortos.
Para além disso que decorre do senso comum, há ainda os relatórios oficiais, as investigações oficiais, o controlo efectuado pelos intervenientes processuais, interessados em descredibilizar a investigação e que demonstraram já a inexistência de indícios acerca da consistência dessas suspeitas.
Tirando isto que me parece o essencial do erro de Rui Moreira, subsiste ainda outro aspecto com interesse para o caso e que pode ser escalpelizado:
E não haverá escutas ilegais, criminosas, feitas por serviços mesmo públicos, da República, e também de particulares? Ou seja, não haverá em Portugal , casos como o do SISMI, italiano, em que os serviços secretos, à revelia de autoridades judiciárias escutam pessoas com vista a nem se sabe bem o quê?
Se esta questão tivesse sido assim colocada, por Rui Moreira, ou outrém, aí já não haveria este postal, porque nem teria havido o primeiro.
Sobre as escutas ilegais, intromissão em computadores, para lhes vasculhar ficheiros e monitorizar andanças blogosféricas e outras, aí…aí…já seria capaz de lhe responder com outras dúvidas.
Perguntaria em primeiro lugar, se há alguém interessado em monitorizar o que pensam, escrevem e dizem em particular, certas pessoas que podem fazer alguma mossa a certos poderes instituídos, altamente colocados. Que teremos como resposta? Haverá alguém do poder central executivo, com tentações, interesse, vontade mesmo, de espiolhar outros que os maçam e prejudicam na sua vidinha?
A resposta a esta pergunta, engata noutra: e se houver, continuará a existir alguém que se dê à canseira, ao trabalho e à sabujice criminosa de escutar telefones, espiolhar computadores e recolher dados para entregar a esses executivos incomodados?
A resposta a estoutra pergunta, vai depender do grau de crédito que se dá às teorias doutrinas de conspiração. Uns dão-lhe um grau elevado; outros, desprezam a importância do assunto.
Por mim, fico a meio da ponte: que interessará verdadeiramente a um polícia qualquer da secreta ou da discreta, andar a espiolhar criminosamente a vida alheia, se a descoberta da façanha lhe pode custar uns anos de cadeia?
A resposta, virá, como sempre da cenoura que lhe apresentam. Mais uma vez, neste como noutros casos, a lembrança de Watergate, assim como a do caso Plame, deveria servir-lhes de lição. Mas pode bem não servir.
Publicado por josé 18:25:00
1.Sobre as escutas ao PR. Jorge Sampaio nunca esteve referenciado para escuta no âmbito de investigação. O que aconteceu foi que um dos investigados fez diversos telefonemas pedindo ajuda por estar a ser alvo de investigação, e é nesses telefonemas que JSampaio aparece, bem como outros membros do PS, e ainda analistas políticos e joranlistas, todos eles gravados em telefonemas efectuados pelo investigado.
A notícia "Telefone do PR sob escuta", obviamente falsa, foi a rampa de lançamento para desacreditar a investigação e, numa fase posterior, para afastar um PGR que mexeu onde a Corja não queria que se mexesse.
2. Escreve o autor no post: "há alguém interessado em monitorizar o que pensam, escrevem e dizem em particular, certas pessoas que podem fazer alguma mossa a certos poderes instituídos, altamente colocados. Que teremos como resposta? Haverá alguém do poder central executivo, com tentações, interesse, vontade mesmo, de espiolhar outros que os maçam e prejudicam na sua vidinha?"
A par de processos judiciais que tardam em se resolver, bem como do "braqueamento de carácter" em curso de gente envolvida na pedófilia, a questão do autor é certamente aquela que nos deve preocupar mais. Uma coisa é inquestionável, a vigilância electrónica está aí; alguns de nós já se aperceberem dela após a visita a alguns lugares da blogosfera. Só não sabemos se está autorizada ou não.
www.lilliput-gulliver1.blogspot.com
Razões para a exclusão do concurso para Professor Titular: Estará na Letra I uma tentativa de controlo, no que respeita à Liberdade de Expressão, da classe docente?.
Para quê? Sim, para quê?
Eu não acredito. Por uma questão de senso comum.
Porque se assim fosse, teríamos que pensar para que é que isso serviria.
Para um processo crime não serviria,nem sequer para nota manuscrita a lápis e confidencial.
Para um procedimento informal de consulta e informação a quem estivesse interessado, seria preciso outra vez, perguntar-interessado em quê, exactamente e para quê. Nesse caso, o interessando corria vários riscos. O primeiro é o de que se viesse a saber o que anda a fazer e fosse incomodado no mínimo.
Depois, teríamos que ver quem é o pulha governamental capaz destas rasteirices e a mera indicação do nome, com o mínimo de credibilidade, bastaria para o afugentar das lides por uns tempos.
É certo que ainda por lá ficariam os sabujos, mas estas coisas acabam por se saber e seria uma chatice das grandes.
Claro que sobra a hipótese de alguém o fazer para chantagear outrém. Mais uma vez, essa hipótese é perigosa, porque a chantagem tem pernas curtas, como a mentira.
Assim, a minha teoria é a de que o crime não compensa.
Mas acredito que haja quem pense que sim.
Há ainda um outro argumento que gosto de usar porque me parece o mais prático e verdadeiro: esta gente que investiga, é incompetente na investigação. Mesmo com os meios legais à disposição e as escutas validadas , não descobre nada de nada que tenha interesse verdadeiro para pôr cobro a muitos desmandos que se adivinham.
As escutas que se conhecem, envolvendo personalidades conhecidas, provam-no. Os mesmos até se riem delas e gozam com os trocadilhos.
Assim, se nem com escutas válidas vamos lá, então com coscuvilhices ilegais é que nunca lá chegar chegaríamos.
Grande resposta. Pois se eles se estão "a cagar", para que havia de valer a pena outros temerem por tão pouco
":O))))