os criminologistas criminalistas

Um senhor chamado Barra da Costa, que se apresenta frequentemente como “criminologista” e ainda antigo inspector da polícia Judiciária, produziu ontem, na RTP1, afirmações graves a propósito do caso da menor inglesa, desaparecida no Algarve.
Aventou hipóteses de o desaparecimento poder estar relacionado com o comportamento de intimidade sexual dos próprios pais e ainda aventou outras possibilidades de explicação da ocorrência, qual delas a mais estranha. Instado a revelar quem lhe forneceu a informação e autorizou a lançar a suspeita grave, deixou no ar a indicação de uma fonte “segura”, a qual se recusou a revelar, para não a perder…entretanto, já foi desmentido, mas a afirmação eventualmente muito mentirosa, ficou registada e ouvida por milhares de pessoas.

O problema, na intervenção do dito criminologista, cujas obras de criminologia são aparentemente desconhecidas do público especializado, é a ligeireza das afirmações, sem base de conhecimento referenciável e aparentemente movida a palpites desprovidos de grandes fundamentos. Ou seja, simplesmente poderá ter difamado, com a complacência da RTP1, o desgraçado casal de ingleses.
Por outro lado, a audição destes peritos de ocasião, acompanhada sempre da referência às habilitações profissionais particulares, de cariz policial, deixa sempre um ar de mistério no ar da tv de grande audiência.
Dantes, era o também mestrado Moita Flores, também intitulado por vezes, como criminologista e igualmente ex- agente da PJ, a ser chamado à tv, sempre que necessário para explicar o inexplicável e os insondáveis mistérios da investigação policial, para os infelizes repórteres da tv...sujeitos ao famigerado segredo de justiça que lhes corta a informação oficial e de maior crédito.
Assim, quem não tem cão, caça com o gato possível... e neste género, sempre era preferível ouvir dantes o falecido "inspector" Varatojo, autor de charadas policiais e estudioso de esquemas de realidade policial, mais estranhos que a ficção.

O modo como estes indivíduos ganham acesso aos media, para relatar estranhezas desconhecidas do grande público, apresentadas como mistérios de lendas, são uma evidência em como a grande informação, em Portugal tem ainda um longo, longo caminho a percorrer, para atingir a credibilidade geral.
Quem manda na informação da RTP1 é um tal Marinho, não é assim?
Neste caso, devia ter vergonha.

Aditamento, 23h 45m:

Na Antena1, há pouco, no noticiário, lá acabou por aparecer o outro criminologista aqui mencionado. Moita Flores lá foi chamado a explicar o mistério da menina desaparecida e as diligências policiais para a encontrar. Falou em pistas a explorar pela polícia, com recurso ao método de "bota fora" e da dificuldade em se investigar tais casos. "Como é difícil governar!", dizia o outro. Como é difícil compreender o que se passa, antes de se saber, diria este.
Aqui, a dificuldade é de montante elevado e para a explicar temos sempre esta espécie de "criminologistas", formados por escolas que poucos conhecem, com estudos pouco divulgados e ensinados por mestres ignorados do público, em escolas sem tradição ou arcaboiço científico conhecidos.
Nos EUA e noutros países civilizados, ainda existe algo a que se pode chamar criminologia, sem envergonhar o estudioso diletante. Por cá, em Portugal, a ausência de um Instituto de Criminologia, verdadeiramente investigador , nestas matérias, permite que surjam estes "criminologistas" que não se fazem de rogados para aparecer em tudo o que mexe nos media, conquistando a pulso uma reputação sem paralelo.
Percebe-se o motivo, mas não se percebe este tipo de parolice que leva os directores de noticiários a chamar estas pessoas para dizerem o óbvio, explicarem o sentido comum de buscas e farejos vários que qualquer jornalistas mais curioso, apreende num ápice, se estiver disposto a isso e não se chamar Felgueiras.

Afinal, acabo de ligar a RTP1 e reparo que lá está outra vez o nosso amigo Moita Flores, convidado do Prós e Contras, a dizer coisas extraordinárias para um "criminologista"! Acaba de recorrer ao exemplo do Código Penal anterior a este, e que situa num tempo que para ele é o ano de 1991/92, para dizer algo enrodilhado sobre crimes sexuais.
Que um leigo não saiba que o Código Penal anterior ao actual, vigorou desde 1886 a 1982, ainda vá lá. Agora, um "criminologista"...confundir o ano de 1982 com os anos 1991/92, já é algo que não se compreende.
Até quando?
Outro motivo de perplexidade com o programa televisivo, é a intervenção de José Miguel Júdice. Este advogado, escreveu no outro dia no Público contra o excesso de mediatização do caso da pequena desaparecida. Achava então que já era demais, tanta atenção ao desaparecimento de uma menina estrangeira e que em contraposição ninguém falava...no Darfur!
Pois bem! Ei-lo, no programa televisivo, onde a exposição é máxima, a dar os seus palpites de senso comumente aceite, em prol do problema da menina desaparecida.
Outro cromo? Neste caso, não. Outro profissional liberal.

Publicado por josé 12:45:00  

8 Comments:

  1. Isabel Magalhães said...
    Lamentável a intervenção do Sr. Barra.

    Entretanto, já foi desmentido e 'parece' que a informação teve origem num comentário deixado num blogue inglês.

    Lá como cá...

    []
    I.
    Joao said...
    talvez seja só para vender a notícia, ,mas a TVI acaba de anunciar o mesmo
    naoseiquenome usar said...
    Um dos melhores? Que critério presidiu à classificação?
    josé said...
    o causa nossa? Um dos melhores, sem dúvida...para a polémica e para discordância.

    A participação de Vital Moreira é sempre um estímulo ao combate de ideias porque raramente concordo com elas. Ahahahah!
    naoseiquenome usar said...
    :)
    comentei no post errado.

    Mas acerca desta questão hoje no CM, o Director-Adjunto, num pequeno artigo diz:
    "Em Portugal o estudo das ciências criminais tem apenas uma referência: a Escola de Direito Penal de Coimbra, onde pontificam há muitos anos Figueiredo Dias, Costa Andrade e Faria Costa.
    A Faculdade de Direito do Porto criou um curso de criminologia que está a fazer o seu caminho. Mas foi para ir além do Direito que nasceu há 150 anos a criminologia enquanto disciplina científica, ou seja, para conhecer melhor o crime, o criminoso, a vítima, os perfis, as tendências sociais.
    Para a criminologia convergem todos os saberes necessários a melhorar as políticas públicas de Justiça.
    Para uma coisa a criminologia não serve: ir à televisão invocar fontes sem credibilidade e debitar umas anormalidades sobre os alegados hábitos sexuais do casal McCann como eventual pista de motivação de um crime contra os pais da pequena Madeleine. Isso nem chega a ser criminologia de algibeira..."
    Carlos Medina Ribeiro said...
    A QUESTÃO REFERIDA (do Darfur, etc) é tão velha como o aforismo «Longe da vista, longe do coração», e Eça abordou-a magistralmente, não só n' «O Mandarim», como na história da perna partida da vizinha, que impressionava mais o leitor da notícia do que a morte de 100.000 chineses num cataclismo qualquer.
    Mas é mesmo assim, pois o nosso cérebro e as nossas emoções funcionam muito por critérios de proximidade.

    VEJA-SE, A UM OUTRO NÍVEL, as reacções que tem havido em relação à tão falada denúncia de corrupção.
    Porque é que qualquer pessoa aceita denunciar um carteirista (se o vir a roubar 10 euros), mas já não aceita denunciar um colega que prejudica (rouba!) inúmeros cidadãos anónimos em valores infinitamente superiores?
    Porque, tendo de optar, o ser humano é naturalmente levado a ficar do lado de quem está mais próximo contra quem está mais longe. No primeiro caso, a vítima está próxima e o ladrão é anónimo. No segundo caso, é o colega que está próximo e os roubados são desconhecidos.
    Parece paradoxal, mas o nosso cérebro funciona assim mesmo.

    Daí, que o sofrimento de uma família próxima assuma, para o cidadão comum, foros de muito maior importância do que um milhão de sofredores distantes, estejam eles no Darfur ou noutro lado qualquer.
    É mesmo assim, e não se prevê que venha a ser de outra forma.
    naoseiquenome usar said...
    Medina Carreira: "a perna partida da vizinha" - sempre estive convencida de que esta espécie de "aforismo" se referia a "um rasgão nas minhas clças" por comparação a 1 milhão de mortos na china. Coisas. equívocos - ou, a nec essidade de justificar essa questão da proximidade. Somos muito estranhos, não somos? :)
    the law said...
    Sr. José
    Certamente não conhece o Dr. Barra da Costa, porque as suas obras são conhecidas, e muito conhecidas, pelo menos entre quem ESTUDA. Quem se basta a falar mal dos outros sem os conhecer é que não deve estudar nem procurar conhecer. É fácil falar mal dos outros e principalmente em blogues, sem dar a cara em público. Não vou perder tempo a explicar-lhe o mérito e valor que tem o Dr. Barra da Costa, como pessoa e profissional. Agora uma coisa lhe garanto, é que o Dr. Barra da Costa não atira palpites para o ar sem fundamento, e além do mais ele não disse que o casal era swinger, mas sim que "há quem garanta". Mas infelizmente continuam a surgir vozes caluniosas e difamatórias a meter palavras na boca dos outros, como é o seu caso. Uns por interesse, outros para denegrir, outros para calar...mas continue a escrever no seu bloguinho, só evite falar mal de quem não conhece, nem sabe nada a respeito.

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