o sentido do ridículo
quarta-feira, maio 23, 2007
«Só tenho notícia desse caso pelos jornais e lamento o que aconteceu. Mas quero garantir aos portugueses que nem o Governo, nem alguma instituição deste país, deixará que alguém seja sancionado por uso do direito à liberdade de expressão», declarou hoje o primeiro-Ministro, José Sócrates.
A afirmação foi produzida ainda hoje, en passant, sobre o caso estranho do professor Charrua, aliviado das suas ocupações na DREN por decisão da zeladora da insituição.
Parece uma afirmação inócua e de bom senso democrático, mas não é - antes pelo contrário.
Em primeiro lugar, o Governo não pode garantir nada a ninguém, para além das suas funções executivas e atribuições administrativas. A decisão da zeladora da DREN ou de outros zeladores semelhantes, não pode ser controlada directa e imediatamente por nenhum governo democrático, porque a separação de funções no Estado, implica que o Governo respeite as decisões dos órgãos administrativos inferiores, no âmbito disciplinar, respeitando a legalidade, enquanto estiverem nesses patamares administrativos.
Aliás, foi esse o discurso, ontem mesmo, do tal governo, que resolveu que nada tinha a dizer enquanto o processo não chegasse ao “ministério”.
Depois, não pode garantir nada pelas outras instituições, porque o Governo delas está separado em função da lei constitucional.
Não compete ao Governo garantir que o Provedor de Justiça, a Procuradoria Geral da República e os Tribunais, sancionem ou deixem de sancionar alguém por causa do “direito à liberdade de expressão”. Esse direito tem limites e não é o Governo que os define casuisticamente. Estão já definidos na lei democraticamente aprovada, aplicada pelos tribunais dos quais o governo está separado.
O que esta afirmação estranha do primeiro-Ministro revela, é algo bem mais simples e que parece o que é: este primeiro-Ministro quer mesmo garantir tudo o que lhe interessa garantir, principalmente o que instrumentalmente lhe serve para a boa imagem e a manutenção no poder pelo tempo mais longo possível. E quer garantir outra coisa bem mais prosaica e perigosa: a vontade de controlar tudo e todos, mesmo os que nunca poderá, de direito.
Assim, a afirmação acerca do amor assolapado à liberdade de expressão, na retórica do costume, soa a falso e oco, porque os indiícios que vamos tendo, apontam na direcção oposta.
E que ninguém se espante com esta declaração extraordinária. A aparência e a imagem, já tomaram há muito o lugar da essência, neste governo.
Um primeiro ministro que comenta deste modo, um assunto lateral e relacionado com a pouca vergonha do seu percurso académico, perdeu o sentido do ridículo.
Publicado por josé 22:17:00
Evitava-se muita excitação.
"Retirar o que está a mais", etc.