Um cheque careca, do Público

O jornal Público de hoje, numa notícia anónima ( não vem assinada), refere que “Rui Teixeira deu “cheque em branco” ao MP”. Para tal notícia sem assinatura reconhecida, adiantam-se as diligências da Comissão de Inquérito ao envelope de que se fala.
O tal despacho que justifica a asserção aligeirada do jornal, dirá o seguinte:
Fica desde já autorizado o fornecimento da facturação detalhada ao Ministério Público, caso a mesma venha a ser autorizada por aquela autoridade judiciária”.

A seguir, o anónimo do Público adianta as suas opiniões jurídicas sem citar os mestres, para dizer que lhe “parece não cumprir, assim, as exigências legais que obrigam a que as autorizações judiciais se refiram a um pedido e a um período concreto”.

Pois bem, então para o anónimo do Público, vamos lá voltar novamente à vaca fria que continua a requentar-se, servindo-se em repasto a quem pretende juntar a fome com a vontade de comer… os do costume.
Toda a polémica deste autêntico envelope de Pandora, começou com as notícias desse farol de iluminação pública do jornalismo, 24Horas. Aí se escreveu que “ estava junta ao processo facturação detalhada relativa a telefones fixos dessas individualidades, cuja requisição não havia sido autorizada pelo Juiz de Instrução e que viera junta com outra referente a um telefone fixo do, então suspeito, Dr. Paulo Pedroso.”
Para dilucidar tais ilegalidades aparentes e que continuam a justificar notícias anónimas, podemos agora ler o despacho final da entidade – MP- que efectuou a análise factual e legal do assunto badalado.
Os propósitos dessa investigação foram assim definidos:

Coube-nos pois investigar a prática de quaisquer ilícitos relacionados com a requisição, junção ao processo e tratamento dado à facturação contida nesses ficheiros.
Trata-se de um aspecto que reputamos com importância e que deve ser frisado, de modo a corrigir definitivamente ideias inverídicas que foram veiculadas de que no inquérito Casa Pia se tinha procedido a escutas ilegais
. “

Para tal, no Inquérito que demorou meses por causas já mais do que explicadas e que só desentendidos como o antigo PR e talvez o assessor Brederode, nunca entenderam e parece continuarem por entender, foram efectuadas todas as diligências que agora se repetem na referida Comissão parlamentar.
Para já, só por má fé evidente se poderá repetir a atoarda da notícia do jornal de Pedro Tadeu, afirmando convicta e resolutamente, a ilegalidade das escutas.
Como, porém, ainda há uma réstea de esperança para os desentendidos do costume, a qual se pode entrever na notícia do Público de hoje, todas as baterias são agora assestadas no tal “cheque em branco” que vai passar a ser o cavalo de batalha deste jornalismo florido, à beira mar plantado. Lamenta-se ainda que a suspeita sob a forma de estranheza tenha vindo do próprio responsável pela Comissão de inquérito, um antigo ministro da justiça que apesar de ter sido enxovalhado pelo jornalismo de sarjeta, nada tem a declarar quanto a isso, reservando as críticas para responsáveis que ele próprios nomeou...
E no entanto, bastaria um consulta guiada, via Google, para qualquer jornalista que se preza, mesmo anónimo, ter muito mais cuidado e tento na escrita.

Em primeiro lugar, poderia ler o despacho final no Inquérito, já disponível.
Leria então, sobre o assunto particular do tal cheque em branco, que os pedidos de envio de dados de tráfego, - como era o caso e não é despiciendo aqui salientar e perceber o que isso significa - “eram feitos directamente pelo Juiz de Instrução do processo ou, previamente, tinham um seu despacho a autorizar o fornecimento desses elementos ao Ministério Público. Trata-se de elementos que eram, sempre, concretizados e individualizados. “
Por outro, o despacho judicial referido, com data de 31.3.2003, “foi comunicado à PT-Telecomunicações, pelo ofício nº 1013, da mesma data, “ e através dessa comunicação foi “autorizado que esta operadora remetesse ao Ministério Público toda a facturação detalhada que lhe fosse solicitada e que fosse referente ao posto fixo n.º 213964893, de que era titular o, então suspeito, Dr. Paulo Pedroso.
(Ponto 22 do despacho final):”Na sequência, pelo oficio nº 12826, de 10 de Abril de 2003, subscrito por uma das magistradas do Ministério Público com intervenção no processo, foi solicitado àquela operadora que fornecesse esses elementos referentes àquele posto fixo, o que foi satisfeito pela referida operadora, remetendo, a coberto do oficio nº 2003/0464-A, de 12 de Maio de 2003, uma disquete com facturação detalhada daquele posto, conjuntamente com outras sete disquetes, com facturação detalhada de postos de que eram titulares outros suspeitos.

36.Por promoção de 11 de Julho de 2003, o Ministério Público solicitou ao MºJIC, que se insistisse junto da PT pela remessa da facturação detalhada posterior a Janeiro de 1998 e referente a vários telefones, entre os quais o supra referido, com o nº213964893, ou seja, o mesmo que já havia motivado o pedido das disquetes do “envelope 9”.
37.Tal promoção veio a ser atendida por despacho de 15 de Julho do mesmo ano, em cumprimento do qual e através do oficio nº 2133, de 16 de Julho, um oficial de justiça do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa (TIC) insistiu junto da PT pela remessa de facturação detalhada de vários telefones, entre a qual a do mesmo nº 213964893
. “

Ou seja, em resumindo: não há cheque em branco algum. Há um grande cheque careca do Público, nesta informação descredibilizadora , sobre o assunto.
O anónimo do Público deveria saber coisas bem simples e fáceis de alcançar com algum estudo: em 2003, a questão de saber quem tinha competência para solicitar às operadoras telefónicas, elementos relativos a dados de tráfego, como inequivocamente é o caso dos que constam do envelope 9, não era pacífica.
Para o provar, basta ler acórdãos da época em que os juízes de instrução recusavam aceder a pedidos específicos do MPº para autorizarem consultas de registos desse teor, indicando que quem tinha a competência para tal, eram os magistrados do MP- e não eles!-.O acórdão citado vem assinado por Clemente Lima, Isabel Duarte e António Simões...então juízes na Relação de Lisboa
Por outro lado, a lei processual penal, no que se refere à intervenção de um juiz de instrução, para ordenar a intercepção e gravação de conversas telefónicas, ou se também se quiser, obter elementos relativos a dados de tráfego, refere a expressão “ordem ou autorização”. Autorização, em termos processuais penais, significa algo que possa ser contestado no contexto do envelope?! Não parece, mas é mesmo aí que permanecem as críticas de anónimos e heterónomos, para não dizer pseudónimos.
Nesse pequeno reduto de esperança semântica numa responsabilização ( até criminal?)de alguém cuja identidade cada vez se torna mais evidente, por uma pura revindicta, temos um partido político activamente empenhado. Tal como relativamente a um arguido saído de prisão preventiva e aclamado como herói da resistência por todos os elementos parlamentares desse partido e que agora se encarregaram de fazer um inquérito parlamentar à medida.
Em que democracia vivemos, afinal? Que valem os cheques do Público?

Publicado por josé 12:20:00  

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