Costa trama Monteiro

Sexa o Ministro da Justiça que temos, afadiga-se hoje, em entrevista ao “Expresso” (pp. 2–3), a engrandecer a sua obra. O que é normal.

Fala até de medidas-que-podem-ou-não-vir-a-ser-tomadas, incluindo a eventual extinção do pacato DCIAP (tema que o jornal “puxa pelos cabelos” para a glória da primeira página...). Nada mais normal.

Aproveita a oportunidade para louvaminhar Cavaco Silva, que recentemente lhe exigiu resultados e tenta mesmo enredar o PR na polémica decisão de alteração do regime de férias judiciais. Tudo inteiramente normal, democrático e institucional.

Mas – hélas! - Alberto Costa nunca dá entrevistas totalmente normais. O seu peculiar manejo da ministerial língua de pau causa, frequentemente, danos colaterais. Mais uma vez, foi o caso. O atingido: o PGR, Conselheiro Pinto Monteiro.

Com o tacto político de um elefante saltando de nenúfar em nenúfar, o Ministro dá, às tantas (e a fazer fé no jornal), a seguinte resposta:

“P: Foi consultado antes do convite a Maria José Morgado?
R: Essa foi uma iniciativa do PGR, que aplaudi.”


Ora, “foi consultado?” é uma pergunta directa e objectiva. Comporta apenas duas respostas directas: sim ou não. Se um político foge a responder directamente a tal pergunta – como foi o caso – abre a porta a que se suspeite que o faz porque a resposta directa seria politicamente inconveniente.

No caso, a única resposta inconveniente seria assumir um sim. A autonomia do Ministério Público, constitucionalmente consagrada, não é compatível com a auscultação do Ministro da Justiça quanto à nomeação, pelo PGR, de determinados magistrados para processos concretos. E, com esta resposta, Alberto Costa deixou no ar a dúvida sobre se teria sido previamente consultado, quanto ao convite dirigido pelo PGR a Maria José Morgado para coordenar os processos do “Apito Dourado”.

O PGR e o Ministro são, certamente, homens honoráveis. Não é legítimo presumir que se prestassem a tal afronta à legalidade e aos seus deveres funcionais. O próprio Ministro afirma, na mesma entrevista, a propósito da autonomia do MP, que “...quem esperasse alguma espécie de interferência estaria profundamente enganado acerca de mim e acerca das instituições”.

Não querendo incorrer em profundo engano, resta-nos constatar que Sexa o Ministro se terá exprimido de forma infeliz. E que Sexa o PGR foi vítima dessa infelicidade. É a vida.

Publicado por Gomez 22:36:00  

2 Comments:

  1. Anónimo said...
    Bem visto. E extremamente importante.
    Mas ninguém lhe vai pegar. Até por isso - por ser realmente interessante.
    Politikos said...
    Caramba, este poste é quase uma «exegese bíblica» a uma declaração anódina do Ministro...
    Claro, e «tacto», é certamente o que não falta, por exemplo, a Maria José Morgado (um primor no uso da linguagem e na atitude), no anterior PGR (outro primor no uso da linguagem) e noutros agentes da judicatura que normalmente dão a cara nos órgãos de comunicação social...
    Acredite, por pouco dinheiro se pode comprar um bom espelho reflector...

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