O sole mio!


I can't light no more of your darkness
All my pictures seem to fade to black and white
I'm growing tired and time stands still before me
Frozen here on the ladder of my life

Too late to save myself from falling
I took a chance and changed your way of life
But you misread my meaning when I met you
Closed the door and left me blinded by the light

Don't let the sun go down on me

Elton John, Caribou, 1974

Segundo o Diário Digital:

Depois da apresentação do novo jornal na quarta-feira, a Impresa acredita que o layout tem muitas semelhanças com o semanário anteriormente dirigido por Saraiva. O ex-director do Expresso admite algumas coincidências na primeira página, mas acredita que o formato tablóide vai distinguir as duas publicações. «O Sol não é um projecto contra ninguém», defendeu. Segundo o Jornal de Negócios de hoje, Freire afirma que a hipótese de avançar com uma acção judicial ainda não foi analisada.

Bom, para além desta pequena contrariedade, há um aspecto curioso e de relevo luminoso:
O título “SOL” não é original.
Em 10 de Fevereiro de 1976, apareceu pela primeira vez nos quiosques e bancas, um novo jornal semanário que repristinava um velho título da imprensa nacional: O Diabo.
O semanário, dirigido por Vera Lagoa, pseudónimo de Maria Armanda Falcão, que escrevera uma coluna de “bisbilhotices” no Diário Popular e depois disso crónicas no jornal Tempo de Nuno Rocha, foi logo suspenso preventivamente por determinação do Conselho da Revolução da época( e com base na Lei de Imprensa então em vigor), por causa de um artigo em que Vera Lagoa atacava de modo julgado violento e inadmissível a figura do presidente da República,general Costa Gomes. Vera Lagoa, no artigo em causa mimoseava-o como “o senhor Gomes de Chaves” e com outras atenções ainda mais primorosas, como seja a de recusar legitimidade ao então PR para ocupar um cargo, ´usurpado` em função de um “golpe de Estado”.
A esquerda de então, aplaudiu a medida de suspensão decretada pelo CR. Segundo O Jornal da época( 20.2.1976), temiam a ofensiva das forças de direita, representadas pelo O Diabo que lhes pareciam “ descaradamente a tentar dominar os órgãos de informação”.
Diga-se que era a segunda vez que Vera Lagoa se via a contas coma Justiça por causa de escritos em jornais. A primeira também recente, ficara a dever-se a um artigo no Tempo.
O julgamento por aquele facto lesivo da honra de Costa Gomes, também foi alvo de alguma atenção ( pouca) na imprensa da época.
Um artigo de O Jornal, assinado pelo falecido José Silva Pinto, mereceu uma carta de Vera Lagoa, publicada integralmente no O Jornal de 5.3.1976, na qual dava conta das suas razões e informava que Vera Lagoa era militante do …PS! O que mereceu uma queixa à comissão de Conflitos do partido…
As peripécias do julgamento, foram-se desenrolando ao longo dos meses seguintes e a revista Opção nº4 de 20 a 27 de Maio de 1976, cronicava que o julgamento decorria “à porta fechada” e que o advogado de Vera Lagoa, de seu nome Proença de Carvalho, tecera na audiência “severas críticas ao juiz Hermínio Ramos, acusando-o de constantes intervenções abusivas e lesivas do interesse da sua constituinte”. Anunciava ainda que entre as testemunhas de defesa de Vera Lagoa, se contavam Raul Rego, David-Mourão Ferreira, Maria Barroso e o major Manuel Monge.
Para saber o resultado deste julgamento, é escusado ler o Expresso da época( em 15 de Abril publicava uma entrevista com Jean-François Revel a propósito de A tentação Totalitária) ou até mesmo o O jornal ou a mesmíssima Opção. Nada de nada se encontra noticiado, sobre o assunto já acabado. O Jornal, em 7.5.1976, trazia um artigo intitulado “Seminário sobre a informação em tempo de mudança”. Nem uma palavra sobre a suspensão do semanário ou sobre o julgamento. No entanto, em coda ao artigo refere-se a outro semanário maldito – A Rua, dirigido por Manuel Maria Múrias- para noticiar que o jornal, “de extrema direita”, anunciara um livro maldito nas suas páginas: “O pequeno livro negro” de…Hitler.
Na edição de O Jornal de 2.4.1976, no entanto, uma pequena referência ao julgamento, com esta menção: “ Sol e sombra. O julgamento de Vera Lagoa , motivado por um artigo em que visava o general Costa Gomes, foi adiado sine die, devido ao estado de saúde daquela jornalista.”
A referência a Sol e sombra, grafava a palavra “Sol”, porque o Diabo tinha entretanto, sido transformado em …Sol, um título fugaz que durou o tempo de suspensão preventiva do jornal e que terminou com o julgamento, noticiado apenas pela revista Vida Mundial, de 27.5.1976, dirigida então por…Natália Correia que colocou aquela entre os que naquela semana “riam…”, referindo-se à absolvição da jornalistas e exaltando “O exemplar magistrado [ o tal que Proença vituperara…] não só absolveu Vera Lagoa como a exortou, em considerações finais, a continuar a pôr a sua pena ao serviço da liberdade e da Independência do País.” É sabido que a visada não se fez rogada, sendo igualmente previsível que Proença de Carvalho, dessa vez não terá protestado…mas também é sabido que o Sol foi de pouca dura: em 1979, a directora do revivificado Diabo teria outra vez a justiça á perna, por causa de Eanes. E dessa vez, perdeu.
Neste contexto, será que o Sol que se anuncia, poderá de algum modo render homenagem ao Sol que já se pôs e que sendo mesmo de pouca dura, existiu o tempo suficiente para haver memória desse tempo?
Não haverá por aí um qualquer equívoco?

Publicado por josé 00:42:00  

6 Comments:

  1. fado alexandrino. said...
    Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
    fado alexandrino. said...
    A voz ao mesmo tempo estentórica e magoada da minha Mãe acordou-me e ouvi-a dizer entre soluços secos:
    -Meu filho, meu filho, eles vêm buscar-te…
    O meu sono tranquilo, uma vez despertado, permitiu que eu descerrasse as pálpebras com dificuldade e olhasse na direcção à porta do quarto. Vi quatro soldados de armas em punho, os quais rodeavam a minha Mãe. A minha mulher acordou também e esta disse-me mais tarde que eu, ainda ensonado, exclamara:
    -Tanto andaram, até que me meteram nisto…

    Auto-biografia neo-realista de Nuno Rocha “Memórias de um ano de revolução”
    Edição Somuna -Travessa das Chagas 4 2º Esq. Lisboa

    (o post anterior tinha dois erros de ortografia)
    e-ko said...
    Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
    e-ko said...
    Pois é, já no post anterior, comentava com o "sol de pouca dura" e como só chega em setembro, será ainda por cima, "sol de inverno". A mim, nem me aquece nem me arrefece...papel... e as florestas ? Alguém que compra jornais, às vezes aos pares, já pensou nas florestas ? e a internet e a blogosfera e o ou a Wiki, não são para os cães ou para os gatos... jornais... o último que comprei foi o público aonde o JPP publicou o famosíssimo artigo sobre a blogosfera e a fauna das caixas de correio... vómitos... Aaccaabboouuu-se!
    Lola_Chupa said...
    É a isto que eu chamo um comentário perfeitamente corrosivo :-)
    Marta said...
    A mim parece-me que o título é de influência britânica. Aliás, espero encontrar o Grande Arquitecto na página 3, com uma coluna muito cheia de silicone. As usual.

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