Revolution #9
sexta-feira, janeiro 13, 2006
O jornal 24 horas continua à coca dos registos de documentos no processo Casa Pia. Como é difícil de perceber se o processo se encontra ainda em fase de segredo de justiça, o que é deveras caricato, a notícia de hoje do jornal, em manchete é uma “bomba” jornalística. Veremos nas mãos de quem vai estourar…
Segundo a notícia, assinada por dois jornalistas, Joaquim Eduardo Oliveira e Jorge Van Krieken, "um dos dossiês do processo Casa Pia tem um aspecto de pequeno caixote de arrumações, daqueles que se usam para armazenar memórias no sótão. Lá dentro, estão guardadas algumas dezenas de disquetes e cd-rom que contém mais de 10 milhões de registos de chamadas telefónicas que o MP, em 2003, mandou analisar.” A seguir, refere que há cinco disquetes onde “estão registados 208 números de telefone” e o jornal faz uma lista de 63 registos, indicando os nomes de indivíduos com “ligações ao PS”, “ligações ao PSD” e “ligações à magistratura”, indicando o número de “chamadas realizadas”. O campeão é Mário Soares, de um telefone fixo da sua casa particular, seguido por José António Vieira da Silva e …Fausto Correia. O PGR Souto Moura também é listado.
Analisemos então esta notícia...
Segundo os próprios jornalistas, há uma listagem telefónica “a que o 24 horas teve acesso”, reportada a “chamadas feitas entre os dias 10 Dezembro de 2001 e 7 Maio 2002”. Segundo os jornalistas, “não se trata de chamadas feitas para esses números, mas sim a partir desses números”. A seguir escrevem “São várias as chamadas feitas para o número privado de Jorge Sampaio, para políticos e magistrados, sobretudo do STJ. Isto no momento em que o 24 Horas apurou a identidade de cerca de 40% dos propietários dos telefonesem causa” .
Temos assim a conclusão, sem margem para grandes dúvidas, que foi o jornal quem investigou a identidade dos proprietários dos telefones em causa - e os publicitou agora, mostrando a toda a gente nomes que podem muito bem ter pouco ou nada a ver com suspeitos do processo. Edificante, como critério jornalístico que se escreva "até Sampaio e Guterres fazem parte do envelope", quando só os investigadores, até agora o sabiam! Pelos vistos, nem Souto Moura estava a par... pois é preciso que se diga quem à data (Maio 2002), o processo ainda nem tinha visto a luz do dia dos media. Por outro lado, os 63 nomes foram escolhidos segundo o critério apontado e que permite noticiar: “O Estado controlado pelo telefone”. Intenção demasiado óbvia em mais uma vez questionar critérios de investigação de quem tem a competência exlcusiva para o fazer.
Aqui chegados, depois da publicidade dada pelo jornal a algo que aparentemente era segredo e nem deveria ser divulgado, algumas perguntas se impõem...
1. Quem autorizou a que fossem pedidas listas de telefones, com dados de tráfego, ou seja , relativos às chamadas efectuadas e/ou recebidas, no período em causa ( 10.12.2001 e 7.5.2002)? Foi alguém do MP? Se foi, quem teria sido? De que modo chegou ao conhecimento do MP a conveniência em se fazer um tipo de investigação desse género?
Sabendo a resposta a estas perguntas – que o jornal não dá e apenas sugere como tendo sido os suspeitos do costume, ou seja, os investigadores conhecidos do processo, ou seja, os três magistrados do MP, mais o JIC, o que não é ainda líquido e justificaria todas as reservas numa notícia como esta- importa saber se foram diligências efectuadas em termos legalmente admissíveis. Sabendo que algumas figuras do Estado só podem ser investigadas criminalmente através de entidades hierarquicamente superiores a esses investigadores, importa saber se foi esse o caso, ou seja, se havia pessoas investigadas, entre esses “proprietários”desses telefones e se foi nessa qualidade e por causa disso que se elaborou a listagem.
Há pouco, no telejornal da SIC, o bastonário Rogério Alves colocou as questões nos devidos termos que devem ser colocadas:
Falou sobre a admissibilidade do pedidos desses registos, pelas autoridades judiciárias (mencionando o facto de poder ser o MP ou o JIC) e falou na necessidade de se saber, agora, como é que se fez a investigação do processo. A ocasião apresenta-se soberana, perante a instauração de um Inquérito pela PGR.
Aguardemos então por tal Inquérito. Acontece, porém que muitos comentadores, já se pronunciam outra vez pela demissão do PGR, apresentado mais este escândalo como uma prova mais da falta de capacidade de Souto Moura em dirigir o MP. O comentador Ricardo Costa, no mesmo Jornal da SIC até já nem tem dúvidas que a culpa da elaboração desta listagem é da Procuradoria…e daí exigir pela enésima vez a demissão do PGR, mesmo que ao lado, o bastonário Rogério Alves, momentos antes, tenha dito algo que o deveria ter maior contenção neste tipo de acusações e exigências.
Sobre estas listagens deverá porém, dizer-se o seguinte: antes de 2004, e da Lei 41/2004, de 18 de Agosto, discutia-se nos tribunais quem tinha competência para pedir às operadoras de telefone, os chamados “dados de tráfego” que são os relativos à facturação detalhada das chamadas telefónicas realizadas e recebidas num posto fixo de telefone. Esses dados porque susceptíveis de permitirem a identificação (como o jornal 24 Horas o fez agora) , em tempo real ou a posteriori, os utilizadores, o relacionamento entre uns e outros , a localização, a frequência, a data, hora e a duração da comunicação sendo obviamente elementos da telecomunicação deveriam ser solicitados às operadoras pelo Juiz de Instrução. Mas isso, em 2001, não era líquido! Discutia-se nos tribunais quem tinha competência específica para solicitar tais dados, quando o MP entendia que não tinha essa competência e o JIC também a negava a si mesmo. Como exemplo deste entendimento que a Lei de 2004, veio esclarecr definitivamente, poder ler-se este acórdão…que aliás veio na sequência de alguns pareceres do Conselho Consultivo da PGR sobre o mesmo assunto.
As questões que o jornal 24 Horas hoje levanta, são bem mais graves e interessantes...
Atendendo ao período de tempo referido, importa saber, como é que começou este Inquérito. Quem o determinou e do modo como o fez. Quem decidiu investigar determinados indivíduos e não outros. Nas respostas a essas questões reside o esclarecimento de um clima de insuportável suspeição que se instalou na sociedade portuguesa contra determinadas pessoas, visadas na listagem e não só. Nas respostas a essas questões, reside eventualmente o esclarecimento do assunto sísmico, anunciado em tempos, imprudente,corajosa e…ingenuamente pela Provedora da Casa Pia.
Talvez agora, com este Inquérito, se venha saber o quem, o como, o quando, o onde, o porquê, e talvez o quê, do mistério das cabalas, nas quais, um destacado militante do PS, Rui Pereira, sempre disse não acreditar.
Talvez se esclareça de uma vez por todas, se os boatos são apenas isso, ou se são o fumo da fogueira que nunca deveria ser a da Inquisição, mas a da purificação desta sociedade de segredos de Estado. Quem não deve nunca deveria temer estes processos de Inquérito.
Veremos então duas ou três coisas: quem o vai dirigir; se o segredo de justiça se vai respeitar e se a isenção, rigor, competência, serão suficientes para se fazer Justiça que numa acepção clássica significa dar a cada um aquilo que lhe pertence. Aí se incluindo a honra ou o vitupério público.
Faça-se Justiça!
Publicado por josé 14:46:00
Mais uma vez um enorme discurso livrando o MP de qualquer responsabilidade e passando tudo para alguém.
Há crime ou não há? E passa-se tudo debaixo das barbas do MP?