O início de um longo caminho para 2008...

Meio ano depois da trágica reeleição de George W. Bush, já começam a esboçar-se tendências para as eleições presidenciais de 2008 nos Estados Unidos.

Serão eleições bem mais imprevisíveis, na medida em que ditarão, independentemente de ser democrata ou republicano o vencedor, um novo Presidente. Bush, para descanso dos europeus, não poderá candidatar-se a um terceiro mandato e, como tal, assistiremos a duas primárias — uma em cada partido — que prometem ser longas e disputadas.

Por estranho que possa parecer, dentro de um ano já começarão a surgir as primeiras movimentações dos candidatos. Esta é, por isso, uma boa altura para lançar os dados do jogo.

Bush quis deixar a ideia que terá um segundo mandato mais internacionalista. A visita à Letónia, com um discurso pseudo-genuíno sobre o ‘passado de sofrimento’ dos países bálticos, é uma mera operação de cosmética em relação ao mais do mesmo: os oito anos de Administração Bush ficarão para a história como dois períodos de oportunidades perdidas e de recuos na cooperação internacional. Já para não falar da péssima situação económica em que, no plano interno, os EUA se encontram…

O problema é que a vitória de Bush em Novembro de 2004 foi conseguida com base em pressupostos que não passam nem pela política externa nem pela economia. Os valores morais ditaram a tendência, fruto do excelente trabalho de terreno feito por Karl Rove e seus amigos juntos das igrejas evangélicas.

A subida febre de cristianismo evangélico nos EUA penetrou no eleitorado conservador e virado para a ideia de que deve ser a América profunda a ditar as regras.

Foi impressionante como, a três semanas de uma eleição que supostamente estava a ser disputada taco a taco (como a Grande Loja foi reportando dia após dia, as sondagens até 2 de Novembro davam um empate técnico), Karl Rove, o estratega da campanha de Bush, garantiu, com uma segurança que na altura parecia fictícia: «Vamos vencer com mais vantagem do que se prevê. Vamos ganhar o voto popular por cerca de três milhões de sufrágios; vamos ganhar a Florida, desta vez de forma incontestável e vamos ganhar no Ohio por cerca de cem mil votos».

A 2 de Novembro, todos sabemos o que ocorreu: Bush ganhou o voto popular por cerca de três milhões de votos; venceu a Florida por 5 pontos percentuais; e venceu no Ohio por… 100 mil votos!

Esta exacta noção de Rove tem a ver com a capacidade da máquina republicana. O staff de Bush conseguiu vencer todos os targets a que se propôs; em contraponto, os democratas entraram numa crise de espaços: como reagir a tamanha onda republicana?

E, de facto, esta será a questão fundamental que o Partido Democrata terá que saber responder, se não quiser ficar longe da Casa Branca até 2012 ou, quem sabe, 2016.

Os anos dourados de Clinton já lá vão e a não eleição — embora com mais votos — de Al Gore em 2000 impediu a continuidade dos democratas. A partir daí, o partido de Roosevelt, Kennedy, Carter e Clinton tem sofrido uma agoniante falta de liderança. Como consequência, as expectativas de regressarem à Casa Branca têm sido poucas. John Kerry poderia vir a dar um bom Presidente, mas revelou-se um candidato insuficiente.

Perante o domínio dos republicanos na Presidência, no Capitólio, na Câmara dos Representantes, no Supremo e nos governadores dos principais estados flutuantes, o Partido Democrata necessita, urgentemente, de reconquistar a Casa Branca já em 2008. É possível, mas desta vez precisará de acertar em cheio no candidato a apresentar lá para meados de 2007. Já não falta assim tanto tempo e, como tal, o próximo ano e pouco deverá servir de profunda reflexão.

Neste contexto, há duas teses que deverão sobrevir como as com mais hipóteses de virem a ser as escolhidas: ou escolher alguém que reconquiste o espírito de representantes das classes trabalhadoras, das minorias, da classe média e de uma visão multilateralista; ou preferir um candidato que, não perdendo os votos tradicionais dos democratas (por exemplo, à partida, os negros votam esmagadoramente no candidato democrata, mesmo que este se mostre pouco sensível aos seus problemas), consiga penetrar no centro e mesmo nos votos à Direita.

Na América, a dicotomia esquerda/direita tem matizes um pouco diferentes às que estamos habituados, mas sociologicamente continua a fazer sentido dizer que os Democratas representam o eleitorado mais à esquerda, enquanto os Republicanos, mais sensíveis a valores morais, religião e família, correspondem à Direita.

Bill Clinton nunca teve maioria absoluta, mas conseguiu captar o essencial dos votos da classe média, minorias e trabalhadores. O problema é que Kerry perdeu importantes fatias para Bush em sectores como os hispânicos, a classe média e mesmo junto dos negros.

A missão do próximo candidato democrata é diluir a «maioria moral» que deu, há meio ano, a vitória a Bush por 51 por cento. Nessa perspectiva, faria sentido apostar em alguém que conseguisse identificar-se com o centro político, tendo um discurso próximo do investimento nas novas tecnologias e com pequenos traços de religião (basta ler recentes discursos de Hillary Clinton para notar essa preocupação).

Mas se o problema dos democratas tem a ver com falta de organização da máquina, a verdade é que só um discurso ideológico, que recupere o apoio dos sindicatos (ainda com bastante peso em alguns estados importantes como o Ohio ou Michigan), conseguiria fazer do próximo candidato democrata alguém com suporte suficiente para responder à onda republicana.

Do lado republicano, passa-se um pouco o oposto: o normal seria escolher alguém próximo de Bush, tendo em conta os seus sucessos eleitorais, mas a verdade é que os candidatos que se perfilam têm uma vertente menos religiosa e mais virada para um discurso de abertura.

Tudo somado, temos, nesta altura, os seguintes candidatos potenciais…

Do lado democrata:
Hillary Clinton, senadora por Nova Iorque
John Kerry, senador por Massachussets
John Edwards, senador pela Carolina do Norte
Barack Obama, senador pelo Illinois
Evan Bayh, senador pelo Indiana

Do lado republicano:
John McCain, senador pelo Arizona
Rudy Giuliani, antigo mayor de Nova Iorque
Condoleeza Rice, secretária de Estado
Chuck Hagel, senador pelo Nebraska
Jeb Bush, governador da Flórida

Hillary é, claramente, a candidata mais bem colocada do campo democrata. Capitalizaria muitos dos nostálgicos dos anos Clinton, embora seja conotada com um sector um pouco mais à esquerda, quando comparada Bill. O mandato no senado por Nova Iorque é olhado como uma boa rampa de lançamento para uma nomeação que, a confirmar-se, entraria para a história como a da primeira mulher investida como candidata por um grande partido (em 2000, Elisabeth Dole ficou em terceiro nas primárias do Partido Republicano).

Kerry tem o capital de mais de 55 milhões de votos, que, numa situação normal, lhe garantiriam a eleição, mas não se livra do rótulo de flip-flop e candidato cinzento;

John Edwards foi seu candidato a vice. Tem uma excelente imagem e uma visão moderna e positiva da América. Poderá ser uma alternativa consistente, no caso de Hillary não avançar;

Barack Obama é um brilhantíssimo advogado negro que, aos 35 anos, chegou ao senado com uma vitória de 70 por cento no Illinois. Já repetiu que não é candidato em 2008, mas essa hipótese não está totalmente afastada, se os favoritos não avançarem. Há quem defenda que se Hillary não se candidatar, Obama poderá vir a ser o vice de uma candidatura de Edwards ou Kerry;

Evan Bayh é, deste lote, o menos conhecido e o que menos hipóteses terá de ser o nomeado, mas tem sido apontado, nos Estados Unidos, como um potencial presidenciável.

Do lado republicano, a grande dúvida parece residir entre McCain e Giuliani. O senador pelo Arizona quase conseguiu a nomeação em 2000 e é visto como um candidato moderado. Herói de guerra, defende a transparência na classe política, com medidas corajosas. Se for nomeado, ditará o regresso do Partido Republicano a uma visão mais centrista, podendo, assim, fazer a reconciliação do sistema, muito polarizado com a disputa Bush/Gore e Bush/Kerry.

Giuliani saiu com enorme popularidade do 11 de Setembro e tem tido a vantagem de estar fora de um cargo executivo. É um fenómeno de popularidade, mas representa uma ala mais dura dos republicanos (é anti-aborto).

As primeiras pesquisas confirmam a tendência de Hillary Clinton pelo lado democrata e uma acesa disputa, com ligeira vantagem de McCain em relação a Giuliani:

QUINNIPIAC
McCain 43-Hillary Clinton 41
Giuliani 44-Hillary Clinton 43

POLLING REPORT
McCain 49-Hillary Clinton 38
Giuliani 47-Hillary Clinton 41
Hillary Clinton 50-Jeb Bush 47

RASMUSSEN REPORTS
McCain 45-Hillary 38
Giuliani 42-Hillary 40
Hillary 47-Condoleeza 40

Outros dados:
Se Hillary Clinton avançar, terá o apoio imediato de 29 por cento do eleitorado; 36 por cento dizem já que não votam nela; 27 por cento admitem votar, mas ainda não sabem;

Para 43% do eleitorado, Hillary é «liberal», recebendo o rótulo de «moderada» para 53 por cento e 8 por cento dizem que é «conservadora». 44 por cento do eleitorado tem uma opinião favorável da senadora por Nova Iorque; 39 por cento não gosta dela.

Respostas espontâneas sobre possíveis candidatos em cada campo:

DEMOCRATAS
Hillary Clinton 39
John Kerry 21
John Edwards 15
Barack Obama 9
Evan Bayh 1


REPUBLICANOS
Rudy Giuliani 25
John McCain 21
Condi Rice 14
Jeb Bush 7
Chuck Hagel 1

Publicado por André 18:31:00  

2 Comments:

  1. Anónimo said...
    Surpreende-me que não faça um artigo laudatório ao presidente frances e alemão, os bons da europa,
    porque os maus estão nos USA, vide Busch! è preciso ter lata? vote sim
    para ficar feliz............
    Anónimo said...
    Bush ao perder seria dar á Al-queda uma vitória estratégica que não conseguiu no terreno, seria penalizar alguém que fez o que devia ser feito chamar o terror a fazer uma guerra em que perdem as vantagens do terrorismo: escolher o quando, como, onde e assim ter poder com poucos recursos. Só espero que não seja isso que o autor defende.

    "os oito anos de Administração Bush ficarão para a história como dois períodos de oportunidades perdidas e de recuos na cooperação internacional"

    Santa ingenuidade, isso só acontece quando uma politica importante já teve tempo de se estabelecer . Quando há uma recente mudança estratégica no mundo todas as politicas são potencialmente divisivas, tal como seria atacar a Alemanha quando esta invadiu a Polónia . Fica o comportamento vergonhoso e idiota de uma parte da Europa. Idiota porque se EUA falhassem no Iraque quem seriam os primeiros a levar com a ressaca seria a Europa e se os EUA vencessem como venceram ficariam com todos os louros.
    A Europa que armou o Iraque tem moral?
    A obstrução do triunvirato Chirac, Putin, Shroeder são os líderes dos 3 países que armaram mais de 70% do exército Iraquiano. A Alemanha Ocidental que montou a maioria das fábricas quimicas e foi o pais que mais contribuiu para o esforço de guerra nessa área. Como consequência os contribuintes alemães viram-se obrigados a pagar como compensação 2 submarinos dos 3 que Israel obteve da Alemanha porque os Scud modificados que caíram em Israel vinham todos com componentes alemães...
    A "Europa" do autor escolheu uma estratégia em que perde em qualquer das hipóteses. Já para não falar na Aliança e na gratidão devida a quem veio á Europa 2 vezes no século passado sacrificando os seus filhos quando podiam ter ficado quietos a guerrear os japoneses com uma mão atrás das costas. Cooperação internacional é um fim em si mesmo?
    Ficar quieto é bom para a cooperação internacional ou assinar acordos que não vão ser cumpridos = Kyoto ou esquemas petróleo por alimentos.

    "Anos dourados de Clinton" = diletante e inconsequente no combate á Al-queda "ficarão para a história como dois períodos de oportunidades perdidas" no combate ao terrorismo, o primeiro ataque ás torres foi em 1993...


    "Já para não falar da péssima situação económica em que, no plano interno, os EUA se encontram…"
    Quanto á economia dos EUA terá vários problemas um deles é o estado da educação: pedagogias e cultura de esquerda destróem qualquer sistema de ensino, Asiáticos menos politizados e mais práticos consequência de uma cultura menos dada a estados de alma(e as que tiveram com clara influência europeia).
    Mas no tempo presente se 5,2% de desemprego, crescimento da economia a 3-4% um deficite alto em relação aos tempos mais recentes mas nada comparado com outras vezes que os EUA estiveram em guerra é "péssimo" então o que dizer da economia da "Europa" do autor? Talvez valha a pena perguntar como o autor caracteriza uma boa situção económica.

    O fantasma dos evangélicos de volta seria bom que lesse as estatísticas de que quem votou em quem para perceber que o voto evangélico não teve a importância que se diz que teve.

    "três semanas de uma eleição que supostamente estava a ser disputada taco a taco"
    É a vulnerabilidade habitual de quem se deixa levar demasiado pelos média do nosso retângulo , postei na caixa de comentários do Blasfémias que Bush ia ganhar por 52-47 foi 51-48 . Isso acontece porque por cá não chegaram ecos dos democratas desiludidos e das preocupações de muita gente anónima.

    "Presidente. Bush, para descanso dos europeus, não poderá candidatar-se a um terceiro mandato"
    Quais europeus?


    "Guiliani
    É um fenómeno de popularidade, mas representa uma ala mais dura dos republicanos (é anti-aborto)."

    Caracterizar Guiliani ala mais dura dos Republicanos é simplesmente ignorância,inclusive na questão do aborto.

    lucklucky

Post a Comment