O que há em mim é sobretudo cansaço —
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A sutileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto em alguém,
Essas coisas todas —
Essas e o que falta nelas eternamente —;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada —
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Íssimno, íssimo, íssimo,
Cansaço...

Álvaro de Campos


Publicado por Manuel 02:48:00  

1 Comment:

  1. Anónimo said...
    Já conhecia, mas é sempre bonito.
    Agora a propósito da VISITA GUIADA À CADEIA DA RELAÇÃO, por favor avisem porque só perderei por impossibilidade imperiosa!( a minha ignorância impede-me de me manifestar no blog respectivo, daí fazê-lo aqui. Já pedi ajuda mas as instruções generosamente transmitidas não serviram, de certeza que o defeito é meu - ou da máquina, que é bem arcaica....).
    Gabriela Arez

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