TU QUOQUE?

Vital Moreira, escreveu isto...

A Derrota

É desnecessário puxar pelas palavras. A ilibação de Paulo Pedroso no processo Casa Pia constitui uma comprometedora derrota para o Ministério Público (e para o conspícuo juiz Rui Teixeira, que validou as suas decisões), quer quanto à prisão preventiva quer quanto à sua posterior acusação. Sendo um dirigente partidário, ele era o troféu de caça neste processo. O excesso de zelo contra ele não permitiu ver as flagrantes debilidades da investigação, que a condenaram a um desonroso insucesso. A derrota do MP atinge também o próprio Procurador-Geral, que em momentos decisivos deu a sua cobertura à teimosia persecutória dos seus subordinados.
Importa agora ir até ao fim e procurar saber como é que isto foi possível. A anunciada intenção do Paulo Pedroso de mover uma acção contra os seus acusadores pode ser um excelente passo nessa direcção. Este triste episódio da justiça penal nacional carece ao menos de clarificação.


À semelhança do lamento já exarado no Incursões, também aqui se deixa um eco dessa queixa e se amplifica o desapontamento que provoca, ler um constitucionalista reduzir a dinâmica do processo penal a uma espécie de combate de boxe, mesmo com punhos de renda.

Vital Moreira no seu escrito, encosta o MP do processo Casa Pia e por arrastamento o MP em geral, incluindo o seu procurador-geral, às cordas do ringue imaginário em que o colocou. E, fazendo de árbitro do putativo combate que idealizou, levantou o braço de um dos arguidos para o sagrar vencedor, aos pontos, por não ter sido pronunciado. E de embalada convoca o treinador do derrotado, para abandonar o “coach”.

Contudo, o raciocínio não só se mostra simplista e indigno do mestre, como errado. O MP, em Portugal, não é parte que combata nos processos, contra outra parte e com vista à vitória, seja por K.O. ou aos pontos.

Pode sê-lo noutros países e talvez o excessivo visionamento de filmes de “tribunal” que constituem maná para a programação das tv´s em tarde de Domingo, influencie negativamente a opinião do público que assim pensa e escreve. Mas se ao vulgo não se exige rigor, dos doutorados de cátedra não se pode esperar outra coisa.

Sobre o papel do MP, a nossa Constituição é ambígua, ao não esclarecer se pertencem ao campo sagrado dos tribunais. E Vital Moreira, porém, até chegou a dizer que sim, em anotação ao artº 221º (actual 219) ao co-escrever que
“O MP é, depois dos juízes, a segunda das componentes pessoais dos tribunais”

Quanto a desenvolvimentos breves desta ideia, podemos citar uma decisão do STJ, ainda recente, de Dezembro de 2003 e na qual se escreveu (Simas Santos, Costa Mortágua e Rodrigues da Costa) que...
No entanto, o M.°P.° não é interessado na condenação mas unicamente na obtenção de uma decisão justa, partilhando com o julgador do dever de objectividade, isto quer nas fases contraditórias e presididas pelo juiz, quer na fase de inquérito de que é o titular, e assume no tribunal superior uma posição próxima da figura de advogado-geral, tendo o visto como função permitir o contacto do M.º P.º do tribunal superior com o processo.

Nesta perspectiva, como se vê, a posição do MP junto do tribunal de recurso é sempre de colaboração com este. Mesmo aqueles poderes que lhe concedemos para eventualmente "corrigir" qualquer aspecto referente à matéria do recurso, têm apenas por fim garantir aquilo que Cunha Rodrigues define como "dimensão reintegradora" da posição do MP quanto ao objecto do processo (Sobre o princípio da igualdade de armas, p. 102, consequência dos princípios da hierarquia e indivisibilidade do MP): exactamente no sentido de garantir que qualquer aspecto atinente ao objecto do recurso (todavia, tanto em favor como contra o arguido) mereça a "devida" consideração pelo tribunal


E ainda...

O MP goza de autonomia em relação aos demais órgãos do poder e a sua autonomia caracteriza-se pela vinculação a critérios de legalidade e de objectividade e pela exclusiva sujeição dos magistrados do MP às directivas, ordens e instruções previstas no Estatuto (art. 2º).


Para terminar e citando mais uma vez Cunha Rodrigues, num colóquio sobre o 25/04, e em Abril de 2004. Dizia ele que a ...

"tabloidização" e os líderes de opinião são uma "forma de pressão sobre a justiça".


É por isso que aqui fica o lamento.

Publicado por josé 13:47:00  

2 Comments:

  1. Luís Bonifácio said...
    Pelo que tenho lido no Causa Nossa, os postais de Vital Moreira primam pela qualidade dos argumentos expostos (mesmo quando reflectem uma opinião política que não a minha).
    Este Postal é para mim uma surpresa, e acho a explicação está nas própria palavras de Vital Moreira (V.M.). O facto de V.M. ser do mesmo partido que o ilibado Pedroso talvez seja responsável pelo "excesso de zelo não permite ver a flagrante" tendenciosidade do seu postal.
    Eu cá gostaria de saber o que é que na realidade está por de trás desta grande "confusão"
    zazie said...
    pois calinadas e erros à parte eu por mim pegava-lhe nas palavras "A anunciada intenção do Paulo Pedroso de mover uma acção contra os seus acusadores pode ser um excelente passo nessa direcção. Este triste episódio da justiça penal nacional carece ao menos de clarificação."Força, força e toca a esclarecer tudo, sem escapar nada! a começar pela clarificação política de quem tutela a instituição donde partiu este imbróglio. É de crer que o VM, como politico responsável e não apenas na qualidade de jurista responsável, saiba que este é o excelente passo na direcção certa.

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