"Ministério Público"


Há vinte e seis anos, o Ministério Público rompia com o cordão umbilical que sempre o ligara e fazia depender da magistratura judicial.

Eram, teoricamente, separadas as magistraturas, todavia, na prática quotidiana, o Ministério Público não ia além de uma magistratura menor, o "saco" onde a magistratura judicial se abastecia, sendo que os delegados do procurador da República seriam os futuros juízes e os escalões superiores do Ministério Público eram escolhidos de entre aqueles que o poder político entendia serem os melhores de entre os juízes.

Para os que viveram esses tempos bem conturbados resta ainda a memória de firmarem, no dia a dia dos tribunais , a nova estrutura orgânica e as novas funções da magistratura do Ministério Público.

Coisa e tarefa que não foram, nem de perto nem de longe, fáceis de levar a bom porto.
Sem saudosismos melosos, não pode deixar de se lembrar magistrados como Arala Chaves, Cunha Rodrigues, Mário Torres, Artur Maurício, Herculano Lima, Vítor do Carmo, homens de estatura superior que, com o seu contributo nestimável, foram verdadeiros líderes, cada qual no seu campo de acção,para que o novo Ministério Público vingasse, tomasse forma e avançasse intrepidamente na defesa da legalidade democrática e no exercício, de forma constitucional, da acção penal.

Celebrou-se, há dias, o 25º aniversário do novo Ministério Público.

Não me atrevo a fazer balanços, nem sequer tendo dados de facto para o efeito, mas atrevo-me a dizer que a escolha por esta magistratura foi reconfortante.

Atrevo-me, porém, a dizer que, com este Ministério Público, o país tem um corpo de magistrados que, sobremodo na área penal, área da sua especial intervenção, garantem os direitos e liberdades individuais, agem como órgão de justiça, tendo abandonado, apesar de muitas calúnias, aquele espírito de um Ministério Público como "implacável acusador", um Ministério Público que procura, de todo o modo, a condenação, em vez da realização da Justiça e do Direito.

Suponho, contudo, que, no actual momento, esta magistratura se encontra num momento histórico de viragem. Nada é perene e muito menos na vigente sociedade sempre em mutações constantes: o que era válido de manhã, torna-se inválido á tarde e muito mais à noite.

Não estarei muito errado (quem sabe?) se disser que o Ministério Público terá de repensar a forma como se relaciona com a Polícia Judiciária, como deve estar ligado com ela, ou não deve, de conceder o seu contributo sério e devidamente matutado para alterações profundas nesta área tão sensível e que é da investigação criminal.

Que o Ministério Público terá (?) de repensar a forma de reorganização e funcionamento, de modo calmo e seguro, das procuradorias-gerais distritais, estruturas essenciais, mas que, ao que sei, necessitam, a breve prazo, de serem repensadas. Tranquila, mas seguramente. Extorquindo burocracias e exercendo uma hierarquia de competências.

Que o Ministério Público terá de repensar a estrutura e funcionamento dos DIAPs, a sua interligação com a PJ e demais órgãos de investigação criminal.

Que o DCIAP terá de ser repensado e reorganizado, aperfeiçoando-se e optimizando-se ao máximo a sua interligação com a PJ.

Quando, em 1979, foi publicada, com a anotação, a então dita Lei Orgânica do Ministério Público, o procurador-geral distrital do Porto, teve a oportunidade de escrever, em jeito de prefácio, que a lei em causa era um instrumento relevante para todos os que procuravam "uma Justiça digna", mas que esta só se conseguia pela qualidade de trabalho dos magistrados do Ministério Público.

Eram, evidentemente, tempos menos tempestuosos, mais voluntaristas e as exigências ao Ministério Público e Justiça em geral seriam, de certeza, muito menores.
Voltamos sempre ao mesmo: melhor organização de tudo, mais racionalização de meios, melhor e mais profunda preparação cultural e política dos magistrados, cultura constitucional, mais humildade e grande abertura, no quadro legal, à Comunicação Social e aos outros. Numa só palavra: Humanismo.

Alberto Pinto Nogueira


Publicado por josé 14:50:00  

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