"A Carta do Ministro"


Abro a caixa do correio e fico estuporado.

Um ministro, ainda por cima adjunto do nosso primeiro, escreve-me uma carta que diz ser "informal".

Fico nervoso, tenso, a tremelicar. Sempre era um ministro que "me" escrevia, a mim que nunca recebera cartas de ministros, com presidência ou sem ela. Dos ministros recebo, pelos seus mandatários vicinais, aquelas notificações da repartição de finanças para exames à escrita do IRS e para pagar adicionais de impostos.

Guardo pressuroso a missiva, que escondo dos vizinhos que sobem no elevador comigo, não vá o ministro me ter escrito só a mim.

O elevador ronceiro e punitivo, o sacana, nunca mais aportava ao 8º andar. Fui magicando que agora, com esta coisa dos impostos, bem podia acontecer que o ministro fosse ele mesmo a notificar-me para um inspecção ou pagamento extra de tributos já liquidados, mas não inteiramente. E as férias aí à porta...

Já no apartamento busquei desesperadamente aquele corta-papéis de prata que foi a única réstea do acervo que me restou do primeiro casamento. Uma carta de um Ministro deve ser aberta cuidadosamente, não violada à pressa, como quem ansiosamente abre a carta da última namorada nos primeiros meses de inebriamento amoroso.

Mas que quereria de mim, cidadão sem influências social alguma, o ministro, tanto mais que, depois de a ler, verifiquei que a dita missiva deve ter sido enviada a 2/3 milhões de portugueses? E para isso o ministro teria de ter tido o aval da ministra do dinheiro, Manuela Ferreira Leite.

Se se tratava de me inscrever no partido do ministro, se se tratava de conceder donativos para o futebol, não jogava comigo, pela minha iconoclastia conhecida.Ma lá ia ficar fichado por mais uma vez - nome, se inscreveu nem é patriota, recusou a ajudar o Euro. Não para o futebol não dava, para o partido também. Mais duas cruzes vermelhas no meu processo individual que Margarida Blasco vai fazendo fazer aos seus polícias secretos.

O melhor era ler mesmo a carta, tirar dúvidas e decidir. Sentei-me ainda transpirando - o caso não era para menos - no sofazinho que sempre ocupo para me cultivar ante a televisão. Abri muito desveladamente a missiva. Respirei fundo. O Ministro não queria impostos, não queria que me filiasse no seu partido, não queria donativos para o furebol.

Queria dar-me conta, como Ministro do Futebol, que o Euro estava aí e, solenemente, apelando à minha consciência de cidadão, informava-me, coisa que ignorava por completo, que o Euro de Futebol era

...uma oportunidade única para a projecção internacinoal do nosso País, da nossa riqueza humana e patrimonial e da nossa ambição...

E eu que nunca tinha atentado em tantas ambições e benéficas consequências do Futebol, filiei-me logo nele, telefonei ao Ministro que não me atendeu, pois estava num pub de Lisboa a duiscutir o Euro, telefonei a amigos meus intelectuais de gema, tendo de todos recebido a mensagem de que o Ministro do Futebol tinha razão. O Euro/2004 era um feito grandioso e heroico digno de espevitar a inveja de Vasco da Gama e do Infante D.Henrique.

Obrigado, Sr.Ministro. Obrigado Futebol.

Alberto Pinto Nogueira

Publicado por josé 09:55:00  

0 Comments:

Post a Comment