"Medalhem o Cronista"


Se o JN não estivesse aqui em frente, ante o meu nariz (sou narigudo),não cria, é que não acreditava mesmo. Li, reli, voltei a ler e a reler, na busca de encontrar o sentido do texto.Seria mesmo aquilo que me perpassava pela mona? Era mesmo. Infelizmente.

Artur Costa (AC), no JN de 27 de Maio, sugere, se não mesmo propõe, ainda que não muito às claras, um louvor para os que, como ele, no silêncio dos gabinetes, trabalham em processos, são isentos, imparciais, independentes.

São os magistrados, judiciais, é claro. A ideia, ígnita que é, não é, todavia, nova. De todo.

O que ora AC acaba por propor não se sabe a quem, foi concretizado, há umas semanas atrás, pelo presidente da relação de Guimarães que, em letra de forma, publicou no DR um louvor aos magistrados pelo seu bom comportamento "qua tale".

Tais "louvores", sob o meu ponto de vista de magistrado herético, que cultivo a independência sem louvores e a isenção como método de trabalho, a humildade como forma de servir os meus concidadãos, passe sempre a imodéstia e os erros, constituem uma afronta a quem se diz e é magistrado de profissão. Um magistrado não é um militar à espera das medalhas de comportamento exemplar no campo de batalha.

Magistrado que não cultiva o que AC entende digno de louvor, não é digno desse nome, mas não ultrapassa os limites exíguos de um mangadalpaca, com o respeito que é devido a quem exerce, com dignidade, este múnus.

AC pode trabalhar 48 horas por dia, ser isento, imparcial, independente. É para isso que a Comunidade lhe paga. Por isso que atoniza que tenha subscrito a crónica que subscreveu.

Não tenho o espaço adminículo que AC tem reservado nos jornais semanalmente. Todavia, para escrever o que escreveu, mais lhe valera estar calado e pousar a caneta.

Conheço AC há mais de trinta anos, trabalhei com ele 17/18 anos no mesmo gabinete e nunca, em qualquer momento,me dei conta que precisasse de "medalhas", "reconhecimentos públicos", que fosse possuído de um ego tão minúsculo que tenha de ser preenchido por um qualquer louvor publicitado numa obscura página de um obscuro DR que só os da casa lêem.

Suponho que foi Karl Marx quem referiu que o homem é torneado à medida das suas relações de trabalho. Se é assim, agora por mais esta razão, e a adicionar a tantas outras, deixo, uma vez mais, os meus sinceros, honestos e públicos agradecimentos ao CSM, por me ter graduado em lugar que, evidentemente, não me permite ser conselheiro ávido de louvores.

Terá AC atentado nos louvores a dar aos que sofrem de desemprego, aos que trabalham em condições indignas, aos que se deslocam pagando bilhete de transporte indignos, sem transporte gratuito no ALFA, aos que só encontram mulher e filhos no fim de semana e se instalam em pensões rascas por não terem ajudas de custo?

Ou só no STJ se trabalha? Dantes, AC pensava nisso. Asseguro.

O Terreiro do Paço não é o Mundo. A orbe terrestre não está limitada aos processos do STJ por mais relevante que, aí, seja o labor que se leva a efeito.

Alberto Pinto Nogueira


Publicado por josé 11:46:00  

1 Comment:

  1. Kamikaze (L.P.) said...
    Caro Pinto Nogueira:
    no Incursões, onde o artigo de Artur Costa foi referenciado, inseri (tal como o José) comentários bastante críticos ao mesmo. Contudo, creio que nada na crónica de Artur Costa legitima a interpretação da mesma dada neste seu post: a de que o autor da crónica entende que só os juízes conselheiros trabalham e que, afinal, acha é que lhe devia ser dada uma medalha, etc. etc.
    Que extrapolação!!!

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