Testemunhos políticos
domingo, junho 01, 2008
Vasco Pulido Valente, sobre Manuel Alegre, hoje no Público:
“Está a pensar na eleição para a Presidência de 2010. Nessa altura, não terá a sombra de Soares; e Sócrates não tem outro candidato, excepto Jaime Gama ( o que seria um suicídio para o próprio e para o partido). Em contrapartida, uma grande parte do PS ( ou o PS inteiro), o Bloco de Esquerda avulsa e, contrariadamente o PC, votariam Alegre.
Em 2010, com a crise presumivelmente no auge, não custa admitir que a situação se inverta a favor de Alegre, sobretudo se, como se espera, Sócrates perder a maioria absoluta., o “debate” do Porto e a “festa” de Lisboa [ eventos desta semana] são passos para a unidade da esquerda. Uma unidade que presume um objectivo: Belém.”
Este prognóstico de VPV, realista qb, esbarra num obstáculo que desde 2003 se levanta contra o PS tradicional de uma Esquerda perdida, desde que meteu o socialismo na gaveta, mas que anda constantemente a abrir outras gavetas do mesmo armário, para encontrar a pedra de toque do sonho perdido.
O obstáculo de monta e enorme como uma montanha virtual, capaz de produzir abalos telúricos de escala imprevisível, é o processo da Casa Pia e as suas adjacências, ainda em sede de investigação e especulação mediática ocasional.
O problema Paulo Pedroso, a que se juntou o problema Ferro Rodrigues, pouco depois, constitui a maior pedra no sapato dos caminhantes de Belém que saem do largo do Rato.
Atentem-se nos pormenores prosaicos e de estupefacção, para quem se assegurou um poder de facto que dura há decénios: meia dúzia de ganapos de um colégio do Estado, para desvalidos da sorte, tiveram a petulância de acusar por escrito e em testemunhos repetidos, altas figuras desse Estado de facto que assenta arraiais no largo do Rato e noutros sítios onde a política é o prato do dia.
E o pior, é que os investigadores, acreditaram neles e alguns juízes também. Veja-se o despautério!
Logo que estes testemunhos saltaram para os jornais, rádio e tv, a reacção não se fez esperar. O dirigente de topo, fundador e figura tutelar do partido, não teve qualquer pejo em pronunciar em praça pública, a sua convicção segura e firme sobre a inocência dos correligionários entalados nas denúncias graves, com uma desarmante declaração de um evidência óbvia: “as testemunhas podem mentir”, foi o comentário de Almeida Santos, nesse tempo de incerteza e de prisão de um deputado na própria AR.
Nessa altura, todo o partido se uniu em torno dessa verdade assumida como indiscutível: “as testemunhas podem mentir”. Logo, mentiram, porque não é possível que tenham dito a verdade.
Essa verdade, insuportável, significaria muito simplesmente o desmoronar de todo um partido político, o opróbrio seguro por largos anos e a vergonha pública por longos períodos de tempo político.
Impensável, para quem ao longo de décadas viveu da política e para a política, como nunca poderia viver de outro modo, que esses sonhos e realidades de uma vida, se desmoronassem assim, do pé para a mão, por força de uns depoimentos contraditórios e inseguros de uns miúdos desvalidos e sem eira nem beira.
Esses miúdos mentiram, mentem e como está bom de ver, não merecem o crédito de ninguém com capacidade para entender que um partido de poder real e efectivo, capaz de nomear milhares e milhares para sinecuras ou cargos de confiança, nunca poderia estar refém de uns ganapos assim. Inadmissível. Impossível, mesmo.
O problema, de magnitude estrondosa, avolumou-se e agigantou-se com a possibilidade de crédito a esses depoimentos, repetidos pelos media perante a evidência esmagadora dos factos conhecidos: os ganapos eram vários, repetiam em consonância de pormenores os factos que se escondiam em depoimentos em segredo de justiça e tornava-se incontornável dar espavento e notícia deles.
Primeiro foi o Expresso a dar conhecimento da existência de imputações gravíssimas, em termos de moralidade pública, ao líder da ocasião do partido político na oposição, Ferro Rodrigues. Por causa disso, saiu o dirigente, foi demitido um director da PJ e os comentadores de ocasião e interesse mútuo, vilipendiaram a honra do visado, polícia improvisado, em declarações asneirentas e tendenciosas. Vilipêndios, difamações e atoardas que se estenderam a muitos outros que tiveram a veleidade de não aceitarem a verdade oficializada no largo do rato: o descrédito das testemunhas, tal como alvitrara o seu dirigente máximo, como verdade a seguir.
Depois, foram as constantes fugas de informação do processo crime onde se investigavam as ocorrências e os factos indiciadores e que justificaram renovados vilipêndios, contra quem dirigia a estrutura da entidade investigadora, o procurador geral da época, Souto Moura. O que foi dito do mesmo e contra o mesmo, assume tal violência inaudita, da parte dos visados que só se compreende, pelo desespero de uma causa que era a deles e de sempre: a causa do poder político em risco iminente de derrocada total.
Por fim, com uma decisão judicial polémica, pela falta de unanimidade e coerência argumentativa e já depois de todo o ruído provocado pelos apaniguados do poder político em ascensão e de oposição, mais o dos desejosos de o cavalgar em tandem, retornou a esperança de que efectivamente as testemunhas estivessem mesmo a mentir, como ardentemente desejavam, sem alternativa lógica. A verdade oposta, sempre possível, mesmo em teoria empírica, seria insuportável e por isso, impronunciável. Não se podia perder , num espaço de dias ou meses, anos e anos de esperanças de vida e vidinha politicamente recheadas de eventos e regalias. Uma desmiolada política que escreve por aí, chegou a alvitrar um futuro auspicioso para o novo preso político, recém libertado.
Foi esse o discurso oficial de apresentação de indignação dos visados. Seguiu-se o cortejo de aclamação pública ao refém político das decisões dos tribunais que o mandaram encarcerar, em plena escadaria da AR, acolhido como um preso político, regressado da provação da iniquidade dos tribunais de instância acusadora.
Inocentes e sem margem para dúvidas acerca da natureza íntima dos actos dos entalados, foi desde aí, esse, o único discurso oficial de um partido que entretanto conquistou o poder de maioria absoluta, depois de um interregno de meses, em que os candidatos ao tandem governativo, tudo fizeram para desacreditar o líder do organismo que não embarcava facilmente nas justificação assente de que as “testemunhas podem mentir”.
A hipótese , logicamente possível de que também podem estar a dizer a verdade, nunca se lhes colocou como plausível, porque o exercício do poder político não lida com verdades da realidade, mas apenas com a realidade das verdades assumidas como ajustadas a objectivos.
Assim, lutaram e venceram a guerra da alteração das regras que possibilitaram recolher esses depoimentos, através da alteração das leis penais que promoveram com o objectivo indisfarçado de obstarem a resultados tão perversos, num futuro que se anunciava ainda assim, nebuloso e perigoso, com efeitos de abalo sísmico da estrutura política vigente, reais e plausíveis.
Os visados, como não poderia deixar de ser, dirigiram-se aos mesmos locais onde as testemunhas podem efectivamente mentir e apresentaram as suas queixas contras os difamadores, os tais ganapos, que tiveram o topete de se meter com pessoas que mandam no poder político real, em Portugal.
Os pequenos davids, contra todos os golias, da vertigem do poder, encontraram-se face a face com árbitros desse jogo improvável e têm ganho todos os desafios, segundo as regras que os mesmos golias inventaram para o jogo da verdade processual que se desenrola diariamente nos tribunais.
Os visados, na qualidade de ofendidos, têm perdido sistematicamente o jogo nos tribunais, em todas as partidas em que obrigaram os referidos ganapos a jogar à defesa.
Não têm conseguido provar, com argumentos plausíveis e irrefutáveis , reais e segundo as regras de que benficiaram em primeiro lugar, que os pobres ganapos, os difamaram de verdade.
Os árbitros dos tribunais, não lhes têm dado razão, porque a consistência dos depoimentos, obtida no segredo de audiências que aceitam sem grande rebuço e portanto, sem qualquer publicidade, desmentem a asserção inicial de que as “testemunhas podem mentir”.
Não têm conseguido provar aquele desejo expresso de Almeida Santos, mas têm obtido o benefício da dúvida: não se provando a mentira, também não tem sido possível demonstrar a verdade e nesse equívoco, prosperam e satisfazem um objectivo: manter a dúvida, dupla e insanável de que a inocência criminal, quando se apresenta a um passo da culpabilidade, sobrepõe-se sempre a esta, por força de um princípio de direito crimimal: in dubio pro reo.
Ora, é nesta intersecção do judicial e do político que importa equacionar o problema que vai permanecendo e mantendo na sociedade política que temos:
A responsabilidade política, associada a comportamentos éticamente reprováveis, como sejam os de âmbito criminal, no campo da intimidade sexual , do abuso de crianças, nunca poderia partir das mesmas bases de sustentação, porque os pressupostos são diferentes.
Na responsabilidade criminal, procura-se sempre a verdade material, embora cada vez mais, sustentada em bases processuais, apertadas e capazes de a esconder.
Na responsabilidade política, a mesma parte do velho princípio enunciado, de que em política o que parece, é.
A aparência de um facto, mesmo sendo falso e até calunioso, se não se evidenciar a prova da perfídia e manipulação, acaba por se impôr a uma verdade que fica escondida e podendo ser iníqua e injusta, acaba por reflectir-se na dúvida em sentido contrário ao criminal: na dúvida, o político, deve sair. Por um motivo simples: a actividade política não é um modo de vida, mas apenas uma vida em modo de serviço público, temporário de preferência. O poder político, só ganha com alternâncias e perde muito com permanências absolutas em cargos de eleição ou nomeação.
Qualquer político sabe disto e tenta esticar a corda da condescendência, sempre que tal infortúnio o acomete. Tem sido esta a pedra de toque, constante, na argumentação que neste blog se vai expendendo sobre o assunto: Os acusados, mesmo injustamente, de crimes deste teor, com base em provas testemunhais diversas, não deveriam fazer de avestruzes políticas e deveriam afastar-se imediatamente da política, sem prejuizo de procurarem a verdade nos tribunais, no uso de um legítimo direito de defesa, mas diferenciado do argumentário político. Tal, porém, nunca sucedeu neste caso.
O direito a uma presunção de inocência, real, prática e permanente, nunca se colocou como problema, aqui neste blog. O que se coloca como problema constante, é evidência de uma dependência do poder político, dos políticos envolvidos, jogando nesse tabuleiro, pedras chave, para o outro tabuleiro onde as regras são outras.
No caso dos membros ilustres deste PS e de alguns políticos adjacentes, este princípio tem sido sistematicamente postergado e esquecido, transformando o exercício da política, como se de uma carreira profissional se tratasse em que o direito de despedimento obedecesse a regras ainda mais apertadas da defesa dos trabalhadores do que as do código do trabalho.
Na iminência de se produzirem provas ainda mais esclarecedoras dessa dúvida acerca da dupla insanável sobre a responsabilidade pessoal em certos factos e ocorrências repetidos e renovados, a reacção tem sido sempre a mesma: negação pura e simples, indignação pelas afirmações repetidas das testemunhas que “podem mentir” e no final de contas a manutenção do satus quo, com apoio explícito da maioria dos media, associados a um poder similar e com regras de manutenção paralelas.
É neste contexto que deve ser entendido o próximo julgamento de António Balbino Caldeira, do blog Do Portugal Profundo. Adiado já por seis vezes, fica a saber-se pelo Público de ontem que um dos motivos apresentados pela juiz do colectivo para o adiamento, terá sido uma “orientação do CSM”, estrutura máxima de gestão dos juízes , possivelmente de carácter genérico e de ordem logística.
Mesmo assim, a notícia do Público dá conta da indicação de uma lista de testemunhas de acusação com peso político certo e inquestionável:
Ferro Rodrigues, Vieira da Silva, António Costa, Jorge Sampaio, Jaime Gama, José Miguel Júdice, Manuel Alegre, Almeida Santos, Vera Jardim, António Guterres, Mário Soares e José Sócrates.
São estas testemunhas que integram o PS histórico e o seu actual estado-maior que se preparam para prestar juramento em tribunal, assegurando dizer a verdade sobre o que lhes irá ser perguntado. Pelo tribunal, por quem os indicou e pela defesa do arguido que responde por uma caterva de crimes de difamação, por causa do que escreveu num blog, onde exprimiu o seu direito de opinião acerca de factos conhecidos publicamente e relacionados com aqueles acontecimentos. Milhentas pessoas escreveram sobre o processo. Milhentas manifestaram a sua opinião, baseada em convicções, factos conhecidos e eventualmente ilações, algumas delas temerárias.
Mas o direito a uma liberdade de expressão, num caso como este que assumiu tamanha relevância pública, muito por causa da actuação dos próprios correligionários dos envolvidos e pelos motivos expostos, nunca deveria ser capado e lançado ás urtigas como dantes, no tempo que que estes vituperam como sendo de obscurantismo o eram.
Pela natureza dos nomes apresentados, torna-se evidente a vertente política que o caso assume para o queixoso.
É nessa vertente que se podem jogar, neste caso, não os argumentos de que “as testemunhas podem mentir”, que neste assunto pouco convirá lembrar a propósito, mas principalmente o peso institucional de um partido em busca do poder político, em Belém.
Serão essas testemunhas, incluindo o futuro e putativo candidato a Belém, por banda de uma Esquerda equívoca, Manuel Alegre, quem irá proclamar a natureza difamatória dos escritos de Caldeira, num blog. Pasme-se!
Do outro lado, naturalmente, deverão posicionar-se todos aqueles que acreditaram que as testemunhas também podem dizer a verdade, restando apurá-la.
Nestes nomes, citam-se alguns, com algum peso específico: para além dos investigadores do Ministério Público e da Judiciária, os de alguns juízes que assim também acreditaram e escreveram nos processos; a que se juntam os de alguns que subscreveram as considerações destes, para além daqueles que falaram com as próprias "testemunhas que podem mentir". Neste rol, incluem-se naturalmente, Catalina Pestana e Pedro Namora. Esses, são os que estão melhor colocados, pela experiência própria e directa, para saber se as testemunhas podem mesmo, nesse caso, ter mentido.
Manuel Alegre, portanto e toda a Esquerda equívoca, a reboque, apostam no desfecho deste julgamento, acusando objectivamente o acusado, de difamar um correligionário. Porquê?
Ao confundir, mais uma vez, um tribunal com as escadarias da AR, o poder político associado ao queixoso deixa uma mensagem inequívoca de solidariedade entre correligionários. Uma mensagem, mais uma vez errada e deslocada.
Em política, o que parece, é mesmo.
Publicado por josé 16:48:00
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Sem palavras
Mais um post ao seu nível, grande nível.
Eu, num acentuado estado febril e diarreico, não consegui fazer melhor do que tratar esta escória pela matéria viscosa e fedorenta de que eles são feitos.
O nível da minha prosa saiu ao nível deles. Estamos quites.
SEGUNDO: Brilhante. Estou inteiramente de acordo com TUDO o que escreveu! Tudo isto é, de facto, uma VERGONHA!
TERCEIRO: Apelo aos potenciais interessados que se promova a constituição dum PARTIDO SOCIALISTA (ou SOCIAL_DEMOCRATA) que possa servir o interesses dos portugueses e de PORTUGAL!
O grande, verdadeiro e derradeiro teste à Justiça em Portugal!