A impossibilidade de uma comissão de inquérito ao caso BCP
domingo, janeiro 27, 2008
António Sampaio e Mello (ex-director do Departamento de Estatísticas do Banco de Portugal) escreve hoje no Público um dos melhores artigos sobre a crise do BCP e os reguladores.
Nos milhares de caracteres, Sampaio e Mello descreve vários motivos mais que suficientes para a realização de uma comissão de inquérito ao caso. A saber:
"Do processo BCP fica a impressão nítida de que a supervisão se contentou em pedir esclarecimentos aos suspeitos quando havia indícios anormais e depois esperar que estes lhe enviasse a informação que entendessem. Em lugar de se fazeren acções de investigação discretas e sem aviso prévio, com buscas a computadores, inquirição de funcionários e arrolamento de documentação, cumpriram-se apenas formalidades processuais"
"A segunda razão vem de fazer as coisas à maneira do sistema. Um sistema que consiste na teia de cumplicidades e de fidelidades que se protegem mutuamente sob a batuta omnipresente do poder que está. Ele envolve políticos, burocratas, carreiristas de empresas públicas e semiprivadas e empresários alinhados. Os seus membros usam influências e servem-se de compromissos para resolver de forma hermética e opaca os assuntos do país e, por isso, pouca importância dão à necessidade de dotar Portugal de instituições autónomas e de uma cultura de rigor e transparência(...)"
"Quem seguiu de perto oerno, processo de eleição da nova administração do BCP reparou que foi evidentemente a lista do sistema que saiu vencedora: com o beneplácito do Banco de Portugal e a bênção do governo, esta haveria também de ser consegrada pelos grandes accionistas(...)"
Apesar de, como já se disse, tais razões deveriam levar a abertura de uma comissão de inquérito, porém, no mesmo artigo, Sampaio e Mello viaja até ao Japão para explicar porque é que a tal comissão será impossível. A propósito da crise que afectou o sistema bancário nipónico nos anos noventa, citou um resposável pela Union des Banques Suisses de Tóquio: "As pessoas honradas só podem ir até certo ponto para além do qual são agarradas pelo sistema. Os japoneses têm este péssimo hábito de proteger a tribo a todo o custo. Coisas que são consideradas criminosas noutro lugar, no Japão são aceites desde que feitas para proteger e manter o sistema". No Japão?
Publicado por Carlos 22:56:00
Quanto ao facto de eles fazerem "coisas criminosas" para protegerem a tribo, a diferença em relação a nós é que a maioria das vezes o sistema trabalha para o bem comum. Isto é, o sistema para funcionar no Japão tem que fazer muito mais "pelo povo" do que em Portugal...