Costa Andrade dixit


Eu admito a tortura para salvar vidas”, afirmou hoje, o penalista e professor de Coimbra, Costa Andrade, numa conferência realizada no tribunal da Relação de Guimarães.

Na conferência, participada por dezenas de juristas, muitos deles magistrados, o professor da faculdade de Direito de Coimbra, teceu considerações sobre o novo regime de escutas telefónicas do Código de Processo Penal.

As críticas ao novo sistema, foram várias, sustentadas e resumidas a uma ideia básica: antes, havia cerca de oito ou nove regras a observar, na realização de escutas telefónicas ( ou intromissões em comunicações, como o professor prefere dizer); hoje, há para aí, umas trinta. E todas elas com observância rigorosamente obrigatória, sob pena de nulidade absoluta que inquinará todo o procedimento posterior, em caso de violação pontual de qualquer uma delas. O que fatalmente irá suceder, por força dos recursos que virão e da particular propensão do Direito para se moldar às aldrabices secantes, como dizia outro professor de Coimbra, colega daquele e já falecido- Orlando de Carvalho.

Costa Andrade, vincou mais uma vez o carácter casuístico da reforma penal, cingida a um único processo, apontando as inovações como exemplos de problemas surgidos com esse processo em concreto, a saber, o da Casa Pia.

Na sequência da exposição, Costa Andrade, respondeu a algumas questões colocadas por circunstantes. Um juiz-Conselheiro, Lázaro, antigo presidente da Relação de Guimarães, enunciou princípios básicos de bom senso e sensibilidade comum, como o de se andar a proteger processualmente suspeitos e arguidos, em detrimento óbvio dos ofendidos, inventando-se regras processuais, cuja violação conduz directamente à impunidade de prevaricadores sociais e ao esforço deletério de quem investiga e tem o dever de julgar.

Foi a propósito desta intervenção, a destoar com a exposição de razões ultra-garantísticas em favor de arguidos, como é o caso da prova obtida através de escuta que o professor de Coimbra produziu aquela extraordinária observação pessoal, cerca das 16h e 45m , no salão nobre da Relação de Guimarães, perante dezenas de pessoas e minutos depois de ter produzido esta:

Se um bombista colocar uma bomba na estação de comboios de S. Bento ou Campanha, não se sabendo em qual e eu o tenho na mão, então eu vou muito mais longe do que o legislador…” Subentende-se que Costa Andrade, iria mais longe na defesa dos interesses dos potenciais ofendidos, não se importando com as garantias concedidas generosamente aos suspeitos, pelo nosso Código de Processo Penal, pós Casa Pia.


Fantástico, não é?

Publicado por josé 18:38:00  

9 Comments:

  1. lusitânea said...
    É triste ver pessoas envolvidas em escandaleiras a legislar à sucapa só para se safarem das malhas da justiça.Como a única maneira de os mandar embora seria a eleição por circulos uninominais, isso pelos vistos fica para as calendas...
    Mas que temos um polvo em crescimento na politica temos.Claro que todo este edificio que estes tipos andam a fazer pode muito bem ruir um belo dia.E não será certamente a última vez...
    Gabriel Silva said...
    bom, entendo que há aqui uma diferença que pode ser importante.

    Pelo contexto do que é transcrito, em especial o último parágrafo, sou levado a entender que CS falava, nesse último caso a título de atitude pessoal, do género: «se fosse comigo...».

    O que até certo ponto entendia. Por exemplo, eu, e julgo que quem seja também pai, por exemplo, numa situação de rapto (ou pior), parece-me humano e elementar que se tívessemos entre mãos alguém que pudesse fornecer alguma pista e se recusasse a divulgar, de um bom enxerto de porrada o dito cujo não se livrava até dar com a língua nos dentes. Provavelmente, sem grandes hesitações. Mas isso é a gente a falar....

    Outra bem diferente (e exactamente porque estariam em causa outros valores e para prevenir abusos, enganos, mal-entendidos, etc.) seria aceitar tais «métodos» nas autoridades.

    ao ler o último parágrafo, fiquei portanto, com a ideia que CA estaria a posicionar-se numa situação hipotética de «ele» estar perante a situação: «e eu o tenho na mão». (pessoal e não como autoridade)

    ainda que assim seja, evidentemente entendo que CA não deveria ter dito o que disse, pois é-se levado, pela pessoa, pela sua «autoridade» e pelo contexto, a entender que ele em certas circunstancias admitiria tal prática, o que é inaceitável.

    Em certas circunstancias (e este era o caso),não deve a pessoa, em público, desfazer-se da sua pele pública. Sob pena de se ser mal interpretado. Legitimamente.
    josé said...
    Pois, mas eu ouvi bem e a frase " eu admito a tortura para salvar vidas", foi dita com o significado preciso que tem: em termos práticos a lei, em certos casos, vale nada. E isso com base na ponderação dos interesses em jogo, feita por quem avalia no momento.

    É esse o problema. >Aceito que haja pessoas que assim o digam e defendam. Mas depois, não venham com o discurso das garantias porque isso cheira a falso e artificial.

    Parece-me o caso, embora o compreenda. Por isso é que costumo dizer que isto é uma aldrabice. Secante, como dizia o outro.
    Gabriel Silva said...
    ok,
    essa frase "eu admito a tortura para salvar vidas", torna as coisas distintas em relação ás considerações que acima produzi.
    Unknown said...
    Acabaram-se-me as dúvidas:sou mesmo um bárbaro e um primitivo.Então não vou dar comigo a concordar com o juiz-conselheiro Lázaro e com o Prof. Costa Andrade?
    "Shame on me",nestes tempos polìticamente correctos - mas civilizacionalmente suicidários,pelo que se vai vendo por aí.
    zazie said...
    Pois é, José, há coisas que não se podem defender pela metade.
    Josão said...
    Direito penal do inimigo - Jakobs
    Josão said...
    estabilização contrafáctica. Certo?
    Anónimo said...
    El CNI alertó a cuatro países europeos de que grupos de paquistaníes tenían planeados atentados inminentes (El País)

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