Os cronistas- de jornal e de blog
sábado, dezembro 29, 2007
A revista americana Time, em finais do ano passado, escolheu para personalidade do ano, “you”, nós que vemos, ouvimos e lemos. Na primeira página, um papel espelhado, mostrava a “pessoa do ano”, no caso, aquela que virtualmente se reflectia.
A revista, mostrava a importância de cada um dos utilizadores das tecnologias, que usam o You Tube para trocar imagens; os blogs para trocar opiniões e sítios diversos para trocar mensagens pessoais, para além dos lugares de busca rápida de informação e conhecimento.
Reduzir este fenómeno aos blogs, centrando a atenção em meia dúzia deles, desta vez sem os nomear, caseiros e de produção nacional, onde se comentam factos, repercutem notícias, formulam teorias ou produzem opiniões, é, em si mesmo, também pobre.
No meio do artigo, Pacheco Pereira, esvazia a sua própria crónica, ao escrever que “ainda é cedo para medir o papel dos blogs em Portugal enquanto consumo cultural e mediático, como fonte quase única de conhecimentos “dinâmicos”, envolventes, para as gerações que se estão a educar mais fora da escola do que dentro dela.”
A Time do ano passado, discorria de modo positivo sobre esta novidade, cujo reflexo imediato é o aparente alargamento da comunidade que vai eliminando o papel da mediação informativa, das agências de notícias, dos jornais, rádio e tv, através do relacionamento directo, pessoa a pessoa, que a Rede 2.0 potencia.
Pacheco Pereira, com um ano de atraso, prefere ainda glosar sobre a pobreza do discurso blogosférico, apontando alguns defeitos, patentes nos blogs caseiros: a ligeireza na opinião, sustentada com palpites avulsos sem consistência de maior que não a mera impressão e ainda o amiguismo clubístico que se gera com a interacção de alguns blogs e os seus animadores internos. Pelo menos, desta vez, evitou alguma ( nem toda, afinal) da sua diabolização recorrente, dos blogs maledicentes, dos boateiros, dos anónimos etc etc., um discurso que repetiu por várias vezes, numa catilinária pouco inteligente.
Como se isso fosse o calcanhar de Aquiles dos blogs! Como se a mediocridade, a ignorância, a obscenidade ou a hostilização pessoal, de categoria ou de grupo, fossem por si mesmas, suficientes para neutralizar o potencial de diferenciação e aproximação a uma realidade que nos escapa quando observada pelos media do costume e tradição.
Esta aparente fraqueza dos blogs, afinal, poderá ser a sua força maior. Mesmo nos blogs caseiros e de equipa.
Não adianta muito teorizar sobre os blogs, a cultura bloguística ou a idiossincrasia do blogger lusitano. O que interessa nos blogs, nacionais ou estrangeiros, é o seu conteúdo, e o que ele acrescenta ao que se pode saber de outro modo e feitio.
Tal como há jornais que se dedicam a recompilar textos e artigos de outras publicações ( Courier International, por exemplo, até com tradução portuguesa), também uma boa parte dos blogs se dedica a publicitar, glosar e comentar notícias recolhidas algures, com destaque para os jornais, agora quase todos online e com notícias frescas em cima da hora. Os blogs de âmbito social, parasitam na sua maioria, as notícias que se publicam noutros lados. E isso é bom, porque permite o contacto directo e imediato com certas realidades e a apreciação também imediata dos acontecimentos, pelos seus intervenientes ou espectadores e por vezes dos seus destinatários ( legislação diversa que afecta diversos grupos ou categorias de pessoas, por exemplo).
O exercício de opinião, mais ou menos livre e em alguns casos- raros, e pouco estimulados , diga-se- simplesmente libertários, em termos de valor intrínseco, para mim, não se distingue em nada do exercício opinativo na imprensa, a não ser num aspecto nada despiciendo: o panorama é infinitamente mais rico e variado nos blogs, permitindo uma escolha do pontos de vista que por vezes, nem se podem ler noutro lado.
A opinião crítica, mesmo acerada, perpassa muitas vezes pelos jornais ( por exemplo na crónica de MST, hoje no Expresso), de modo elíptico e sem direcção ao fulcro das questões glosadas. Nos blogs mais apreciados, pelo contrário, é esse fulcro o alvo imediato da escrita, com possibilidade de reescrita, comentada logo a seguir por outros interessados em manifestar opinião.
A ideia que o exercício opinativo se funda muitas vezes em “impressões fluidas” que servem para formar “convicções maciças”, é plenamente verdadeira, mas válida em todos os campos e modos de comunicar, seja na imprensa, tv, rádio ou blogs.
Assim, o que resta para se aquilatar a qualidade de escrita opinativa? A inteligência e interesse do próprio leitor, nada mais.
É neste campo escorregadio que os cronistas conhecidos e que vivem do exercício opinativo, pago por jornais com interesse nisso, podem sentir o chão da influência, a fugir debaixo dos pés. Frequentemente, nota-se que a qualidade de opinião de quem escreve à peça, semanal ou esporadicamente, é de fraca qualidade, em comparação com outras que se podem ler de graça e muitas vezes por graça.
A autoridade opinativa em diversos assuntos, reveste-se cada vez mais de exigências que sempre deveriam ter sido obrigatórias, para um módico de credibilidade pública: conhecimento de causa, do que se fala ou escreve. Quem escreve sobre Justiça, por exemplo, deve pelo menos saber o básico e fundamental da nossa legislação, para não falar já da organização e modelos; sabedoria suficiente para formular opiniões fundamentadas, reconhecida pela experiência em certo domínio do conhecimento ou em áreas de actividade. Escrever sobre política em geral, parece ser campo aberto a todos e mais alguns, mas escrever sobre educação, já será um pouco mais restrito e exigente ; modo de escrita agradável ou pelo menos legível ( há crónicas de Saldanha Sanches, por exemplo, que são incompreensíveis, por defeito de escrita) e por fim, vontade de comunicar algo que pareça interessante ou pelo menos permita discussão.
O exercício opinativo nos jornais, reveste uma característica generalizada que não se distingue do exercício opinativo noutro lado qualquer: os crónicos do costume, escrevem sobre tudo e mais um par de botas. Estão habituados ao palpite fácil e corrente e fazem-no já sem qualquer rebuço e porventura à espera do retorno opinativo de quem os lê.
A inflação de cronistas de página ou de coluna, tem sido uma verdadeira praga, que infesta os jornais dos últimos anos. Poucos se podem ler com verdadeiro proveito e poucos merecem o lugar onde escrevem. A sabedoria de cronista, dantes, espelhava-se numa forma de escrita agradável a quem lia, independentemente do motivo de fundo, mero pretexto, muitas vezes, para o exercício estilístico.
Ainda temos disso, hoje em dia, nas letras de um Ferreira Fernandes, de um Manuel Pina ou até mesmo nas de um Vasco Pulido Valente. Dantes tínhamos mais, mas foram desaparecendo.
Agora, no entanto, em vez da beleza estilística da forma, temos alguns cronistas de jornal, com destaque naturalmente para um Pacheco Pereira ou para um Sousa Tavares, a assumirem-se como entendidos nas mais diversas matérias que notoriamente não dominam e por isso, emitindo opiniões que têm a validade de outras produzidas por anónimos. Com a desvantagem da carga opinativa, desprovida da beleza formal da letra do texto.
Se algo mostra a nossa pobreza intelectual, não são os blogs quem o demonstra, mas sim os jornais, com crónicas deste tipo, num discurso repetido, de matriz politicamente partidarizada, sem surpresas nas ideias ou palpites, num serviço de causa própria.
Publicado por josé 19:45:00
Artigos destes 'e que nao lemos nos jornais. Nem pela pena de Historiadores (com H capital).
Ao início, quando Pacheco Pereira diz que os blogs espelham o que é o nosso "Portugalzinho", pensei que ia haver nomeações, como noutros tempos. Desta vez, ficou-se por generalizações. Melhor assim.
JPP é um intelectual que respeito e que aprecio embora tantas vezes em desacordo.
No entanto, é preciso dizer (ele pede-o no final do texto) ao JPP que ele, também, tem alguns dos defeitos que aponta estarem nos bloggers. Por exemplo, o da vaidade, a presunção de tudo poder e querer comentar e o gosto pelos ataques pessoais.
A forma como conclui o artigo - dizendo qualquer coisa como: sabem que eu também tenho um blog e os leitores que julguem se os males de que falei se se me aplicam -, é sintomática.
Quando, nos blogs, se começa a falar de blogs a coisa começa a ter um ar masturbatório em que os intervenientes desatam a arrancar pequenos prazeres de um mundo virtual. Deixe lá o Pacheco Pereira nas suas punhetas...
Pode não parecer, mas o que JPP escreve, por vezes, interessa-me. São poucas coisas, como por exemplo o de tentar safar a pele maldita de um extremista de direita, um tal Machado, contra a opinião geral dos media, da polícia e do MP.
O que escreveu sobre o Porto e a sua noite, pareceu-me certo ainda que incompleto no retrato que aliás só pode ser feito com cores mais carregadas e em texto alongado.
De resto, continuo a dizer que a JPP, interessa-lhe manter a visibilidade. Seja aqui, na blogosfera, seja nos media em geral, por uma simples razão: vive disso. Ou precisa disso para viver bem, o que vai dar ao mesmo.
Quanto a nós, anónimos dos blogs cujo prazer extraimos em poder comentar livremente estas coisas, temos o nosso retorno nessa mesma liberdade e quanto a mim, nada mais devemos pretender.
Também é verdade que no momento em que JPP atacar os blogs e blogueiros anónimos, tem adversário pela frente, para lhe tentar "fazer a folha" da sua escrita maledicente.
Só é pena que o gajo se limite ao voyeurismo de espreita blogs e caixas de comentários e quando se atreve a comentar, puxe do nome anódino ( Álvaro por exemplo) para contestar evidências ou chamar nomes aos outros ( não muito graves, só invejosos e coisas assim).
Enfim. De JPP não se espera grande coisa, geralmente, mas por vezes, vem algo interessante. Como de outros, aliás.
A sua sociologia é de bolsillo como a minha ou a de outros. Empírica, da observação da realidade muitas vezes mediatizada e também muitas vezes afastada da verdadeira realidade complexa e situada.