Os feudos do MP
segunda-feira, outubro 22, 2007
O PGR, Pinto Monteiro, na entrevista ao Sol-Tabu, referiu-se ao Ministério Público em modo equívoco. Disse que o MP “é uma estrutura hierarquizada – é assim que está na lei. Mas não é assim na prática: o MP é um poder feudal neste momento. Há o conde, o visconde, a marquesa e o duque”.
O actual procurador- geral da República, desde 1979, “fez carreira essencialmente na área cível”. Os anteriores ocupantes da cadeira, foram responsáveis também pela área penal, directa ou indirectamente e o Ministério Público, lida essencialmente com essa área delicada da nossa sociedade.
O actual PGR, mostra esse lado civilista, descontraído e sem grandes preocupações em provar seja o que for, porque “ se amanhã deixar de ser procurador-geral, volto a ser conselheiro”, o que já era há oito anos e meio.
Talvez por isso, no último ano, deparou com a outra magistratura, a do MP que é estatutariamente paralela à de juiz e passou a chefiar a hierarquia da mesma.
Não obstante aquela afirmação polémica e que causa perplexidade na magistratura do MP, o actual PGR, afirmou na mesma entrevista acreditar na autonomia do MP, o que o leva a defender a formação comum, ab initio, dos magistrados. Pinto Monteiro opõe-se à funcionalização da magistatura do MP.
Hoje, no programa da TSF em que intervêm ouvintes em directo, um juiz desembargador, Eurico Reis , sujeito muito susceptível e que não autoria que se brinque com o que vai dizendo por aí, declarou-se amigo do actual PGR; defendeu-o da polémica sobre as escutas, de modo judicioso, e ao mesmo tempo declarou perceber e justificar o que Pinto Monteiro dissera sobre a magistratura do MP ser um poder feudal.
O referido juiz, especializado na área cível, habitual comentador da TSF, logo de manhã e que conjuntamente com outro colega de profissão, Rui Rangel, constituíram recentemente uma nova associação de magistrados judiciais, de carácter sindical, reafirmou velhas ideias sobre a magistratura do MP. Que é mesmo um poder feudal e que se assim não fosse, não estaríamos a assistir a determinadas coisas, que a entrevista do PGR reflecte e que este só falou publicamente porque esgotou a possibilidade de falar dentro da instituição.
Foi assim mesmo que eu ouvi. Defendeu publicamente a extinção do Conselho Superior do Ministério Público e reafirmou a necessidade de responsabilização hierárquica e subordinação dos magistrados de escalão inferior aos superiores., de modo que não explicou, como de costume, mas que deixa adivinhar a ideia de chefe, de respeitinho e de ordem nova.
Rui Rangel, mais tarde na mesma TSF que parece não conhecer outros juízes a quem entrevistar, depois destas declarações, reafirmou-as no mesmo sentido, atirando ainda outras achas para esta fogueira que ambos se têm esforçado por não deixar esmorecer, sem que alguém lhes oponha contraditório condigno. Sente-se muito encolher de ombros, que apesar de tudo faz muito barulho.
Estes juízes que se declaram amigos e defensores entusiastas do actual PGR, em confronto com o anterior que notoriamente execravam, deixam perpassar naquilo que vão dizendo, uma ideia de hostilização do MP, entendendo , na prática do que vão dizendo, esta magistratura como subalterna e necessitada de arrimo.
Ora este arrimo pretendido, pode significar uma de duas coisas: a perda de autonomia face ao poder político-legislativo, o que carece de revisão constitucional e os coloca contra o entendimento explícito daquele que dizem defender e ainda a estruturação do poder hierárquico de modo legalmente diferente do actual, que necessita igualmente de revisão legal, no código processual recentemente revisto e no estatuto respectivo.
Nesta última vertente, não se percebe a essência da argumentação dos ditos especialistas do cível, sempre prontos a palpitar ideias frescas sobre penal e processo penal.
A intervenção hierárquica do PGR, efectua-se no interior da estrutura do MP que é complexa e compreende vários órgãos, o mais importante dos quais é a Procuradoria Geral da República, que compreende ainda Conselho Superior do MP, precisamente aquele que o tal juiz quer ver extinto, mas não fundido com o Conselho da Magistratura, como acontece na Itália, com bons resultados. O procurador- geral da República é apenas o presidente desse órgão de cúpula do MP.
Para além disso, a própria Constituição afirma o estatuto do MP como um corpo de magistrados “responsáveis, hierarquicamente subordinados, e não podem ser transferidos, suspensos, aposentados ou demitidos senão nos casos previstos na lei, cuja nomeação, colocação, transferência e promoção dos agentes do Ministério Público e o exercício da acção disciplinar competem à Procuradoria-Geral da República.”
A composição do MP e da Procuradoria em particular, não comporta a ideia de “chefe”, de caudilho, de general comandante, operativamente actuante como tal e com a informalidade de comando que é própria a essas organizações, com obediência imediata e permanente às ordens dele emanadas. Quem disser ou pensar o contrário, terá que repensar e desdizer-se e quem quiser mudar o actual estado de coisas, deverá antes do mais, justificar porquê, atendendo em primeiro lugar ao interesse do povo em geral.
Ao PGR compete uma série de atribuições, entre as quais, a de “inspeccionar ou mandar inspeccionar os serviços do Ministério Público e ordenar a instauração de inquérito, sindicâncias e processos criminais ou disciplinares aos seus magistrados”.
Mas o poder disciplinar sobre os magistrados em concreto, esse, pertence ao Conselho Superior ( a que o PGR aliás, preside) , nestes termos:
“A gestão de quadros e a acção disciplinar relativas à magistratura do Ministério Público pertencem ao Conselho Superior do Ministério Público, ao qual compete: a) nomear, colocar, transferir, promover, exonerar, apreciar o mérito profissional, exercer a acção disciplinar e, em geral, praticar todos os actos de idêntica natureza respeitantes aos magistrados e agentes do Ministério Público, com excepção do procurador-geral da República; “
Por aqui, será fácil de entender, porque é que o PGR, não tem o poder de mandar directa e imediatamente sobre os seus subordinados: por causa da própria lei que estabelece esses limites em função da noção de autonomia que se caracteriza, simplesmente, por isto: “pela existência de mecanismos de governo próprio, pela vinculação dos magistrados a critérios de legalidade e objectividade e pela sua exclusiva sujeição às directivas, ordens e instruções previstas no Estatuto do Ministério Público.”
Confuso? Não: democrático e para atenuar a característica monocrática do MP. Retirando-se ao PGR o poder de exercício disciplinar e ainda de apreciação do mérito profissional. Estes dois poderes, pertencem ao CSMP.
É isto que aqueles dois juízes, como muita gente que opina e palpita de modo avulso, não aceitam nem aparentemente percebem.
Publicado por josé 23:10:00
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Boas josé, já algum tempo que tenho acomapnhado os seus textos, preferencialmente os referentes ao MP/justiça, de um modod geral entendo as suas ideias, mas desta vez confesso que aminha ignornacia não me entender quem é o Conde, o Visconde , a marquesa e o duque. Agradecia se me podesse ilucidar.
Um abraço amigo
Aí vai um desenho:
São os dirigentes dos departamentos do MP que elenquei e ainda algumas figuras gradas que estão sempre na berlinda como os sindicalistas.
Não há mais. O problema grave é que a maioria das pessoas, incluindo o director do Público, não quer entender que o MP não se dirige como quem dirige um jornal.
É um problema de formação cívica que julgam ter mas mostram que ainda não têm efectivamente.
Não percebem a estrutura do MP, acham que um PGR deve ser chefe e pronto.
Esquecem que chefes há vários e todos estão sujeitos ao mesmo chefe inefável: a lei.