Observatório 2008 - as propostas de Hillary

Hillary Clinton entre os seus rivais, John Edwards e Barack Obama: a liderança da senadora por Nova Iorque é confortável, mas a nomeação ainda não está garantida


A Grande Loja retoma hoje a cobertura das primárias norte-americanas para 2008, fazendo um ponto da situação das três candidaturas que ainda reúnem condições de lutar pela vitória no campo democrata: vamos começar pela favorita, a senadora por Nova Iorque e Primeira Dama entre 1992 e 2000, Hillary Clinton; no próximo post, falaremos sobre a actual situação da candidatura do senador pelo Illinois e único negro no Capitólio, Barack Obama; e, num terceiro texto, abordaremos as (curtas) esperanças que o ex-senador pela Carolina do Norte, e candidato a vice-presidente em 2004, John Edwards, ainda reúne para chegar à Casa Branca.

No próximo bloco de capítulos deste «Observatório 2008», faremos o mesmo em relação aos quatro candidatos que podem obter a nomeação no campo republicano: o ex-mayor de Nova Iorque, Rudy Giuliani; o ex-senador pelo Tennessee, Fred Thompson; o senador pelo Arizona e segundo classificado nas primárias de 2000, John McCain; e o ex-governador do Massachussets, Mitt Romney.

Mas centremo-nos, hoje, no campo democrata, aquele que, de acordo com a actual tendência, mais hipóteses tem de investir o próximo Presidente dos Estados Unidos.

Os últimos estudos, a nível nacional, dão Hillary com uma vantagem confortável, de cerca de 15 pontos percentuais, em relação a Obama, mas o senador pelo Illinois voltou a ganhar algum impulso nas últimas semanas, conseguindo recuperar (ainda que muito ligeiramente) um atraso que chegou a ser de mais duas dezenas de pontos sobre Hillary.

Edwards continua muito forte no Iowa, o estado de arranque, mas perdeu a liderança nas sondagens para aquele estado-chave e, depois de quase ter apanhado Obama no segundo lugar, volta a cair para números pouco acima dos 10 por cento — manifestamente pouco para sonhar com uma viragem.

Vejamos, então, os pontos fortes e fracos de Hillary Clinton.

HILLARY CLINTON: é, indiscutivelmente, a favorita
, tanto da corrida democrata como da eleição geral. Tem sabido responder aos ataques dos republicanos ainda que, para muitos analistas, o tradicional jogo sujo do GOP ainda esteja para vir — virá, em crescendo, se se confirmar o claro ascendente da senadora nas primeiras consultas nas urnas.

Como front-runner inequívoca, que está à frente de todas as sondagens nacionais que se fizeram desde Maio (a única que deu Obama à frente foi a do Rasmussen Reports, a 11 de Maio, numa pequena diferença de 35-33), Hillary pode dar-se ao luxo de fazer uma campanha de minimização de danos. Mas a senadora tem-se revelado muito forte e determinada nos debates, onde, até ao momento, não cometeu qualquer gaffe significativa.

Os analistas elogiam a consistência das propostas da ex-Primeira Dama, que tem sabido centrar a agenda da campanha democrata nos seus temas favoritos, que domina há anos e onde se sente particularmente à-vontade: a reforma da Saúde e da Segurança Social, a reanimação da economia, o combate à exclusão social e às tensões raciais (continua a ter vantagem sobre Obama no eleitorado negro, potenciando o apoio esmagador que Bill Clinton tinha junto dos negros). É aí que Hillary se sente melhor e é nessa esfera que tem apostado: na classe média, por um lado; e nas classes desfavorecidas e minoritárias, por outro.

Não por acaso, esses dois megaestratos foram, ao longo de oito anos, a base social de apoio de Bill Clinton e Hillary já escolheu, claramente, recuperar esse trilho que levou o casal Clinton ao poder, pela primeira vez, na década de 90.

Mas será que Hillary vai tentar decalcar a papel químico a presidência do marido? Ela garante que não: «Bem, não faria tudo igual ao que aconteceu nos anos 90. Estou, desde aí, mais velha e mais prudente. O mundo mudou muito nos últimos anos, temos que o abordar noutra perspectiva», garante, citada num longo artigo na New Yorker, sob o título: «The political scene: the legacy problem».

O que fará, então, Hillary de diferente? «Não assinaria o NAFTA (ndr: North American Free Trade Agreement, o acordo de comércio livre entre EUA, Canadá e México) nos termos em que o fez Bill. Creio que o tratado não atingiu os benefícios que chegaram a ser anunciados».


Também não assinaria, diz, o Acto de Telecomunicações assinado em 1996, que diminuiu a regulação sobre os operadores de novos meios tecnológicos, mas, nesse aspecto, iliba o marido e responsabiliza o então Vice-Presidente: «Têm que perguntar a Al Gore por que o fez...»

Seja como for, numa campanha tão vasta, em que Hillary tem tentado dirigir-se ao maior leque possível de eleitores — de modo a diminuir a taxa de rejeição elevada que, até há poucos meses, tinha junto dos americanos (46 por cento deles diziam, à partida, que «nunca votariam em Hillary», muito acima da taxa de rejeição de Obama, 33%, talvez reflexos, ainda, dos tempos de polarização dos últimos anos do segundo mandato de Bill Clinton) — a líder da corrida democrata tem sabido gerir, com perícia, o tal legado dos anos Clinton, conseguindo herdar os aspectos bons (e são muitos) e sair relativamente ilesa dos maus (que foram alguns).

Outro mérito de Hillary tem sido contornar a questão do Iraque que, no início da sua candidatura, prometia ser o seu calcanhar d’Aquiles. Mesmo tendo sido um dos membros do Senado que deu apoio ao Presidente Bush para invadir o Iraque e derrubar Saddam (ao passo que Obama, então ainda no senado estadual em Chicago, foi dos poucos democratas a estar contra a guerra desde o início), Hillary soube virar a agulha a tempo e, desde que está na corrida, tem sido uma crítica feroz do pós-guerra e da forma como Bush se tem atolado no caos do Iraque «democrático».

Apesar de alguma inconsistência na mudança de posição sobre este tema tão central para a realidade americana, a verdade é que as sondagens mostram que Hillary não será penalizada pela questão do Iraque. Se, porventura, Obama conseguir roubar a nomeação à senadora por Nova Iorque, é quase certo que não será pela questão do Iraque.

Para reforçar as suas garantias no plano militar, Hillary já anunciou, de resto, que escolherá Wesley Clark, general na reserva e terceiro classificado nas primárias do Partido Democrata em 2004, para seu secretário da Defesa.

O senador Joe Biden (também candidato a Presidente e actual líder da Comissão de Relações Externas no Senado) e Bill Richardson (candidato presidencial e governador do Novo México) são duas hipóteses muito fortes para futuras escolhas de Hillary para Vice-Presidente, tendo em conta a sólida experiência internacional que congregam. Richardson foi, de resto, secretário do Comércio na primeira Administração Clinton e Biden é um dos aliados de Hillary no Senado.

Usando a sua experiência na primeira Administração Clinton, quando tentou uma reforma ousada do Medicare e do Medicaid (1993/1994), Hillary retomou as suas ideias sobre o Sistema Nacional de Saúde e tem dominado a sua mensagem, nas últimas semanas, com este tema.

Hillary aprendeu a lição de há 14 anos, quando foi simplesmente trucidada pelos republicanos por ter querido implantar um sistema pesado, que daria grandes protecções aos utentes mas implicaria grandes custos e aumentos de impostos.

Mais moderada, apresentou agora uma proposta menos arrojada, mas que, garante, permitirá que «cerca de 40 milhões de americanos que, neste momento, não têm seguro de saúde passem a receber cuidados médicos essenciais». O segredo parece estar na escolha: «Quem estiver satisfeito com o seguro que tem, óptimo: nada terá que mudar. Mas o Governo federal tem a obrigação de dar uma resposta aos 40 milhões de desprotegidos do actual sistema», lança a poderosa senadora.

No actual clima da vida política americana, os republicanos não terão, agora, grandes condições de desconstruir este argumento — pelo menos, durante a campanha.

Hillary tem sabido lançar os seus trunfos. E, se os próximos três meses não trouxerem grandes novidades, está muito bem lançada para vencer as primárias no Iowa, New Hampshire e Carolina do Sul. Se o fizer, obterá, certamente, a nomeação, dado que revela já vantagens muito confortáveis nos estados que conferem mais delegados, como Califórnia, Nova Iorque, Florida ou Ohio.

No próximo post falaremos sobre Barack Obama, que tenta fazer história ao ser o primeiro Presidente negro e o mais jovem desde John Kennedy, a par de Bill Clinton (terá 47 anos à data da eleição).

Publicado por André 18:52:00  

0 Comments:

Post a Comment