Inquérito parlamentar, já!

"A tragédia desta reforma foi o facto consumado", declarou ontem, no Porto, o professor catedrático de Direito Penal, Costa Andrade, perante dezenas de juristas, no Tribunal da Relação do Porto.

O Público que noticiou hoje o acontecimento, em artigo assinado por Arnaldo Mesquita, continua:

«Os penalistas da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra receberam um telefonema de uma funcionária da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República comunicando-lhes que tinham quatro dias para se pronunciar sobre a revisão dos Códigos Penal e do Processo Penal.
A revelação foi feita ontem pelo professor catedrático Manuel da Costa Andrade, durante uma sessão promovido pelo Tribunal da Relação do Porto, a que assistiram dezenas e dezenas de magistrados judiciais e do Ministério Público, e foi presidida pelo presidente daquele tribunal superior, desembargador Gonçalo Silvano.»
Costa Andrade revelou o episódio quando um juiz lhe perguntou por que não foram envolvidos na revisão daqueles dois diplomas, alguns dos mais conhecidos penalistas portugueses. "Se fosse o Scolari, escolhia dos melhores", acrescentou o juiz, antes de citar nomes bem conhecidos: Figueiredo Dias, Costa Andrade, Teresa Beleza, Maria João Antunes e Anabela da Costa Rodrigues. Não foram só os penalistas esquecidos, também o procurador-geral da República, conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça e outros magistrados."

Costa Andrade, lembrou que na Alemanha, o poder político tem encarado a revisão do Código Penal, num processo que decorre há muitos anos, e a ser profundamente reflectido.

Por cá, só para dar um exemplo, o artigo 30º do Código Penal sofreu um acrescento apócrifo que estabelece como letra de lei, a aplicação do regime de crime continuado, mais favorável para o arguido, no caso de ofensas a bens pessoais, desde que a vítima seja a mesma.
As denúncias desta alteração legal, cirúrgica e com objectivos enviesados, particularmente para aplicação a crimes sexuais, em julgamento e em investigação , ligados à Casa Pia, foram já publicadas. O primeiro a fazê-lo foi o advogado José António Barreiros. Seguiram-se outros.
Mesmo em termos de jurisprudência, a alteração não seria inteiramente pacífica e houve oposição de juristas, mesmo os ligados directamente à revisão do Código de Processo.
Segundo notícia do Correio da Manhã, dois nomes se destacam neste procedimento obscuro: Uma certa Catarina e o deputado Ricardo Rodrigues, o autor da ideia peregrina do "procurador especial" e incentivador da ideia do Inquérito parlamentar ao caso do envelope nove.
A notícia dizia:

«Segundo apurou o CM, a proposta para retirar a parte final partiu de Ana Catarina Mendes. No entanto, a deputada foi de licença de parto, sendo substituída por Ricardo Rodrigues, e o texto acabou por ser aprovado com a versão inicial. Ao CM, o deputado açoriano revelou que também teve dúvidas sobre o artigo, mas acabou por votá-lo favoravelmente após ter consultado “seis acórdãos desde 1996/97” do Supremo Tribunal de Justiça que defendiam a aplicação da figura do crime continuado aos bens eminentemente pessoais. “Para corresponder à jurisprudência do Supremo”, acrescentou.» (...)

Se este assunto não é caso para Inquérito Parlamentar, não sei o que seja.


Publicado por josé 21:08:00  

1 Comment:

  1. Marta Rocha said...
    É revoltante e desumana a reforma do Código Penal! A despenalização dos crimes contra as pessoas é injustificável por princípio.

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