Arquivamentos na República
quarta-feira, agosto 01, 2007
Do comunicado da PGR de hoje, sobre o Inquérito à licenciatura de José Sócrates:
“29 diligências, das quais 27 inquirições, duas buscas e recolha de variada documentação proveniente da Câmara Municipal da Covilhã, Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, Instituto Superior de Engenharia de Lisboa, Direcção-Geral do Ensino Superior, Inspecção-Geral do Ensino Superior e Ordem dos Engenheiros" , para chegar a uma conclusão: arquive-se, nos termos do artº 277 º1 do C.P.P.No dia 11 de Abril de 2007, José Sócrates chegou às instalações da RTP1, numa comitiva de cinco carros de Estado, com o estadão de primeiro-ministro, com assessores e seguranças, para responder a perguntas de dois jornalistas, sobre dois anos de governo. A entrevista, no entanto e como se previra, centrou-se no assunto relevante da sua licenciatura, cujas dúvidas José Sócrates admitiu então serem legítimas, depois de apodar de caluniadores quem as levantou em primeiro lugar, particularmente nos blogs ( hoje, já depois de conhecido este comunicado, voltou a apodar de caluniadores os que colocaram dúvidas sobre o seu percurso académico e retomou a tese da campanha ). A este propósito, importaria esclarecer que o que o DCIAP fez e faz, é apenas investigar a prática de crimes. Há outros aspectos de relevância importante, no caso concreto que nada têm a ver com responsabilidade criminal, mas com a pura e simples vergonha ou com a ética política e pessoal, se se quiser. Há perguntas cuja resposta não está dada e que o Inquérito em causa, certamente não dá nem deve dar. Por exemplo, como é que se compreende que haja dois documentos na A.R, fotocópias, um deles rasurado, sobre habilitações literárias, sem que se tenha descoberto o original? Há resposta cabal e decente para isto, há? Enfim.
Durante semanas, um silêncio ensurdecedor, adensou dúvidas sobre a correcção na obtenção dessa licenciatura, levantadas em primeira mão, por António Balbino Caldeira e desenvolvidas pelo Público.
Na entrevista, dois pormenores, entre vários, mereceram atenção de quem esteve atento.
O primeiro, na altura
Dias depois, a TVI noticia que afinal, existia um documento, ( seria o mostrado por José Sócrates, na RTP1, com evidente relevância jurídica?) que fora usado posteriormente (em 2000?), para reclassificação profissional naquela Câmara, pelo mesmo, e era apócrifo, pois continha dados posteriores à suposta data de emissão e que demonstravam contradição com outros existentes.
Afinal, José Sócrates, através do seu gabinete de primeiro-ministro (?) , perante esse novo dado de facto, deu o dito por não dito e voltou à data jocosa, como sendo a da sua verdadeira licenciatura: o Domingo, dia 8 de Setembro de 1996.
Foi este assunto que agora foi investigado pelo DCIAP. O comunicado de hoje é taxativo:
“Da análise conjugada de todos os elementos de prova carreados para os autos, resultou não se ter verificado a prática do crime de falsificação de documento autêntico (...), na modalidade de falsidade de documento, ou de crime de uso de documento autêntico falso, envolvendo a licenciatura
Das duas, uma: ou o documento mostrado por José Sócrates na RTP1 é verdadeiro, autêntico, não apócrifo e atestado válido que a licenciatura em engenharia civil ocorreu no dia 8 de Agosto de 1996 e isso foi devidamente apurado através das 29 diligências realizadas, ou não é, como o gabinete do primeiro-ministro acabou por reconhecer.
Além disso, se o documento mostrado na RTP1, for o certificado apócrifo, implicitamente reconhecido como falso pelo primeiro-ministro, e se for esse o apresentado na Câmara da Covilhã em devido tempo, continua a dúvida sobre a natureza e relevância das investigações do DCIAP. Afinal , o que é que se investigou mesmo? O documento mostrado por José Sócrates era verdadeiro ou não? E o seu detentor, sabia ou não desse pormenor juridicamente relevante?
Atenta a natureza do assunto, supõe-se que será legítimo perguntar e saber como se fizeram as investigações, para que não ofereça qualquer dúvida mínima acerca do modo como se faz investigação criminal em Portugal, neste como noutros casos.
Esse é o primeiro aspecto que merece consideração, sobre o processo agora arquivado.
O segundo, ligado a este, por motivos óbvios e que deveria igualmente ter sido averiguado, supondo-se que o terá sido, tem ainda a ver com datas, coincidências e amizades perigosas. O percurso académico de José Sócrates no seu núcleo central, encontra sempre um nome no caminho: António José Morais, o professor do ISEL que acompanhou a transferência de José Sócrates para a UNI; que lhe fez o plano das equivalências e que o acompanhou já como docente nessa universidade, nas quatro das cinco cadeiras para a licenciatura, responsável por isso pela aprovação nessas cadeiras esseciais e fulcrais para a licenciatura. Morais, em Março de 1996 fora nomeado por Armando Vara, director do GEPI, um organismo do Estado que acabou envolvido em negócios com uma empresa de consultadoria de que Morais…chegara a ser sócio.
À parte o pormenor esquisito de José Sócrates em declarações publicitadas pelo Público, ter referido inicialmente que não se recordava dos seus professores na UnI, subsiste ainda outra questão básica e central, ainda não esclarecida:
José Sócrates disse, para toda a gente ver e ouvir, na RTP1, em 11.4.2007, que apenas conheceu António José Morais, enquanto seu professor. Nem esclareceu que tinha sido no ISEL e ficou a impressão que fora apenas na UnI. Portanto, para registo futuro, ficou a afirmação de José Sócrates de que só conheceu António J. Morais, enquanto seu aluno. O mesmo António J. Morais, confirmou tal facto , numa entrevista ao Diário de Notícias de 22 de Abril de 2007.
Agora só falta saber se isto é verdade e se de facto, José Sócrates disse a verdade. Disse? Apurou-se? Se este assunto não foi abordado, ponderado ou investigado minimamente, resta ainda uma conclusão: a investigação criminal em Portugal, relativamente a certos assuntos, continua na mesma. Arquive-se, portanto.
Nota correctiva, em 3.8.07:
Impõe-se uma correcção no que acima ficou escrito sobre o que José Sócrates disse na RTP1, em 11.4.2007. A data que o mesmo referiu como sendo a da sua licenciatura, segundo os registos dos jornais, foi efectivamente a de um Domingo de Setembro, noticiada antes da entrevista.
Nos dias seguintes a essa entrevista, foi noticiado que afinal havia um certificado de habilitações, depositado na Câmara da Covilhã, tendo a data de 8.8.1996, como sendo a verdadeira data da licenciatura.
Imediatamente, o gabinete do primeiro-ministro, aproveitou a deixa e fixou para a posteridade de alguns dias, que afinal ficaria assim "explicada a situação de uma alegada conclusão da licenciatura num domingo: podia ter acontecido, mas não aconteceu".
Como se veio a verificar pouco depois, a discrepância de elementos deste certificado, originou a suspeita de falsificação ou de uso de documento autêntico falso, que terá sido investigada pelo DCIAP, com o resultado conhecido.
Fica aqui a correcção, nomeadamente no que se refere à afirmação que José Sócrates desmentiu implicitamente o que teria afirmado na RTP1. Não desmentiu, efectivamente. Quem desmentiu – e por duas vezes- foi o seu gabinete. Certamente sem o seu conhecimento. Por isso mesmo parece que já nem serão os mesmos elementos, os que dele farão parte…
E fica também por aqui a conversa sobre esta assunto que já farta e que afinal, para uma boa maioria, não passa de um fait-divers. Seja.
Publicado por josé 19:48:00
Com efeito o cidadão comum que não percebe palavras técnicas, mesmo as contidas em comunicados, percebe isto perfeitamente : em Portugal a investigação criminal compete ao Ministério Público, constituído por magistrados independentes e imparciais, presididos por um Procurador Geral da República nomeado e exonerado sob proposta do Governo.
Sendo assim, quando se mostra ainda pendente um outro processo onde igualmente se discutem , de algum modo, as habilitações do Primeiro Ministro, À CAUTELA, melhor seria que nada se tivesse tornado oficialmente público sobre este processo ora arquivado.
Muitos se interrogarão porque foi esta decisão tornada pública neste momento e se foram ponderadas devidamente as repercussões desta informação.
Não há que levar a mal, é natural que as pessoas se interroguem.
De facto, é mesmo aquela velha máxima de que " à mulher de César não lhe basta ser séria, importa também que o PAREÇA "...
Pessoalmente devoto inteira fé na independência da investigação criminal portuguesa.
Entendo por isso, já que a informação foi dada, que devem ser dados os esclarecimentos complementares para que o cidadão comum compreenda o que é que foi efectivamente demonstrado no processo e o que não foi.
Não pode a Justiça Portuguesa permitir que indirectamente utilizando a sua imagem de seriedade e independência se venha a público se certa forma insinuar que foi o processo arquivado, logo havia campanha orquestrada e consequentemente o senhor Primeiro Ministro foi reconhecido " judicialmente" engenheiro.
Para dignificação do exercício das funções das Instituições envolvidas, impõem-se esclarecimentos que a COMUNIDADE " comum" compreenda.
E sobretudo o reconhecimento de que este arquivamento declarando não existirem suficientes indícios de que determinado documento foi objecto de falsificação, não demonstra a licenciatura de ninguém, questão esta , tanto quanto se compreende, ainda não investigada.
Talvez pela sua irrelevância pública ...
Saudações
Maria
Então está bem... A outra foi uma chalaça
":O.