RTP-50 anos
quarta-feira, março 07, 2007
A RTP faz hoje cinquenta anos. Parabéns à televisão pública, apesar de não ter muito de quê.
Quem tem a mesma idade, que balanço pode fazer dos anos que passaram já a ver tv?
Nos anos sessenta, época da meninice, que programa escolher como exemplo que ficou na memória do tempo que entretanto passou? E nas seguintes décadas?
Vamos a ver…
No final dos sessenta, a tv mostrou o passeio do Homem na Lua. Gostei de ver e lembro-me. Foi em 1969, em Julho. No mês de Junho, mas em 1966, tinha mostrado o campeonato do mundo de futebol, com a equipa portuguesa das Quinas, a ganhar o terceiro lugar, depois de dois jogos memoráveis: um contra a Coreia e outro contra a Inglaterra.
Acontecimentos de vulto, anuais, eram os Festivais da Canção. Nacionais e da Eurovisão. De visão obrigatória, as músicas que de lá saiam, eram êxitos certos nos meses a seguir.
Em finais de 1969, um programa mereceu atenção geral, mesmo para um puto imberbe, mas interessado na novidade: o Zip-Zip, foi um marco, na tv e na música ligeira, com gravações de discos que marcaram época. O nome de Carlos Cruz, como personagem dos media, é incontornável neste panorama de finais dos sessenta, início de setenta. Curiosamente e bem à portuguesa, o seu papel na tv, tem sido obliterado nos media dos últimos dias. Mas não devia, apesar das circunstâncias que deixam adivinhar sinais dos tempos.
Nessa altura, em 1969, ainda antes da morte de Salazar, começaram as Conversas em Família de Marcelo Caetano. Lembro o ar composto e sério do então presidente do Conselho, a ensaiar a abertura do regime, a que se chamou Primavera marcelista. Falava-se nisso, mesmo com censura prévia.
No mesmo registo chato de quem ouve algo que ainda nem entende muito bem, a não ser uns termos esotérios, aparecia então à noitinha de Sábado, no écran, Vitorino Nemésio. Lembro-me da palavra cibernética, usada pelo literato, para impressionar ouvidos pedantes. Aliás, Vitorino podia ser lido, numa revista aparecida pouco depois ( em Fevereiro de 1971), O Observador.
Mas lembro sobretudo, nesses anos de transição da infância para a adolescência, as tardes de Sábado e Domingo, com os filmes e séries então apresentados.
O Santo, Daktari, Bonanza, Os Cavaleiros do Céu, Shane, Os pequenos vagabundos, nas séries que não se perdiam por nada, como não se perdiam os bons filmes das tardes de Domingo, nem sequer por uma partida de futebol no adro da igreja ou na relva do campo à beira-rio.
Nos filmes de impressão mais duradoura, ficam as memórias dos filmes de cóbois ou de aventuras, tudo a preto e branco, com destaque para as comédias com Shirley Temple.
Como o efeito surpresa era ainda seguro, na ausência de leitura da programação, o filme da tarde dos Domingos, era crucial para se saber se havia futebol, correrias e brincadeiras diversas ou sessão de cinema. Aos Domingos, havia sempre o TV7, no II Programa, com a crónica dita e assinada por João Coito ( ainda escreve no O Diabo). Conservo a crónica que escreveu e publicou na revista Nova Antena de 7.8.1970, sobre a morte de Salazar que ainda hoje poderia ser escrita.
No início dos setenta, o panorama mudou um pouco, melhorando a qualidade da tv, progressivamente.
Nas séries cómicas, houve Get Smart, - Olho Vivo, na imagem acima- , com Don Adams e a agente 99, a lutarem contra o Kaos em meia hora de tv do começo da noite de Domingo, com ritmo narrativo moderno e americano.
A Missão Impossível passava no II programa. Às segundas havia o Curto Circuito e antes o Silêncio! Vamos rir, com pequenos sketches de cinema mudo, depois de se ouvir a narração das Imagens da Poesia Europeia, por David Mourão-Ferreira.
Logo a seguir, vieram as séries de culto e inesquecíveis: O Fugitivo, Arsène Lupin e depois Columbo e McCloud e os desenhos animados das segundas-feiras. O Museu de Cinema das Quintas, na II, com António Lopes Ribeiro e partenaire, eram o must dos ragtimes televisivos.
No panorama musica, pouco havia. Telediscos, passavam por vezes no Do La Si. Mas foi apenas com o Pop 25 de José Nuno Martins que começou a valer a pena ouvir música na tv. Ao mesmo, tempo os programas de António Vitorino D´Almeida, sobre A música e o Silêncio, produzidos na Áustria, ganhavam prémios da crítica de Mário Castrim e Francisco Mata. Tal como os de José Hermano Saraiva, com O Tempo e a Alma.
Chegados a 1974, a música mudou. A principal mudança visível, foi a dos apresentadores que nesse mesmo dia, apareceram sem a gravata ritual ( “tira a gravata, pá!”, era mote da altura).
A tv em 1974, a 25 de Abril, não esteve presente nas primeiras horas. A rádio, sim.
Lembro os separadores sonoros, do “Programa segue dentro de momentos” e as marchas militares a anunciar as imagens da Junta de Salvação Nacional, dos Movimentos dos Capitães.
Outra era começava. De grandes esperanças. Até hoje. Desses trinta anos de tv que se seguiram, recordo, as reportagens de Adelino Gomes no 11 de Março de 1975, os comunicados incríveis do capitão Clemente, da 5ª divisão; as noites de eleições com debates a perder o sono; as comissões de trabalhadores e as comissões de gerência que repetiam a voz do dono; as demissões e prateleiras dos Mensurados e dos Cruzes. A tv da segunda metade dos setenta, é a do nosso PREC, a seguir ao Sinal do Dragão de David Carradine e do kungfu e ao Sangue na Estrada de Filipe Nogueira.
Com a telenovela Gabriela de 1977 e o concurso A Visita da Cornélia, acabou a tv criativa portuguesa. Nem a cor lhe trouxe alegria inovadora. Apenas panache. Logo a seguir, apareceu o Rangel e o José Eduardo Moniz. Prefiro nem falar disso. São memórias sem interesse, porque representam a decadência da imitação dos formatos estrangeiros, sem originalidade para assinalar.
Imagem: revista R&T nº 762 ( ano XIX), de 1971.
Publicado por josé 20:34:00
Aliás, para o ramalhete dos 50 anos, nada como a anódina - mesmo a cores - sessão de chamar os "caras" que passaram a ser conhecidos por terem aparecido na tv. Ontem foi um epitáfio à tv com 50 anos. E provavelmente, daqui a 50 anos será assim. Até com Moniz e Rangel. Mas comigo mais distante do televisor e conhecendo menos gente e menos séries e programas.