Estudos sobre o Estado Novo
terça-feira, março 13, 2007
O jornalista José Manuel Barroso, antigo director das agências portuguesas de notícias, Anop e Notícias de Portugal, de 1977 e 1987, e actualmente da Lusa, dirigiu ainda o Diário de Notícias, entre 1987 e 1992, e antes do 25 de Abril, foi um dos obreiros intelectuais do Movimento dos Capitães, ainda na Guiné, onde prestava serviço militar, com o general Spínola.
É talvez a este tipo de jornalistas que o artigo de Dan Rather citado pelo Manuel, se destina inteiramente. Ligado ao poder desde o advento da democracia, é um jornalista que está ligado ao poder político efectivo de modo inextricável e já sem remédio, para o ideal do jornalismo independente.
José Manuel Barroso, faz, assim, de pleno direito, parte da nossa inteligentsia e nomenklatura dos poderes difusos do establishment, paralelos aos constitucionalmente consagrados.
Hoje, no DN, articula uma ideia simples, sobre o fenómeno sempre renovado do fascismo salazarista, fascínio antigo dos antifascistas e que dele dependem para a identificação.
Descobre agora, com acuidade visual centrada na tv, que é preciso conhecer melhor Salazar e Cunhal, sem complexos de esquerda ou à direita.
E para sustentar o crescimento de tal ideia, arrebimba o malho no lombo antifascista, culpando-o de obliterar imagens conhecidas, guardadas em álbuns, a fim de veicularem a mensagem convenientemente desejada. Com o balanço, faz o paralelo assimétrico, equidistanciando-se, com o salazarismo da repressão e censura prévia.
Na visão estereotipada do articulista, o antifascista desgraçaria sempre o retrato presencial de Salazar, da mesma forma que o fascista salazarento, safaria rapidamente o Cunhal, do imaginário popular do Alentejo.
Defende por isso, e para garantir a fidelidade das imagens ao dono da máquina de retratos, os museus vivos da História, com figuras realistas, mas retocadas.
O museu Salazar seria o “retrato vivo da época, sem propaganda e sem ocultação”. Já o de Cunhal, seria antes, e “para além da sua evocação favorável”, um repositório de artefactos que “nos desse a conhecer a personagem e a sua época”, como “uma fonte de ensinamentos sobre a História de uma força importantíssima na luta contra a ditadura do Estado Novo”.
E o cronista assegura, com objectividade e rigor, que “conhecer Mao não torna alguém maoista, assim como conhecer Mussolini, não torna ninguém, fascista”.
No topo do bolo deste argumento, a cerejinha da vermelhinha que ludibria: os jovens que lutam no Nepal, em nome das ideias do antigo ditador chinês, se tivessem um museu à vista, onde pudessem conhecer as desigualdades sociais e a ferocidade do regime chinês, talvez não vivessem no obscurantismo, como vivem.
Para emoldurar esta ideia simples, o jornalista, manifesta ainda a sua perplexidade que é comum a outros: o silêncio dos historiadores perante o “debate”.
Realmente, parece ser essa, a sede do problema: a ausência de estudos de História que nos permita citar com proveito e exemplo e ensinar o que se passou, aos mais novos. Temos agora, em demasia, Adolfos Simões Muller, no campo da esquerda e faltam Antónios Josés Saraivas, Antónios Sérgios e até Eduardos Lourenço.
Quem são os historiadores da nossa História recente que ensaiaram estudos precisos, isentos, rigorosos e já divulgados? Rui Tavares? Rui Ramos? Apenas dois ruis e ainda com provas a prestar no capítulo da isenção. O caso particular de Eduardo Lourenço está arrumado num livro esgotado.
Assim, para além dos verbetes de enciclopédia, nos círculos do verbo, não se detecta alma viva a escrever sobre mortos e feridos recentes.
A história do salazarismo fica assim por conta de “ensaístas”, vindos do jornalismo nas notícias e agências de comunicação. São esses curiosos, diletantes dos métodos de investigação histórica e voluntaristas da consulta livresca, quem nos tem valido.
A ausência de nomes, origina o aparecimento de pronomes, em livros de estudo escolar que definem o salazarismo como o fascismo e o 25 de Abril, como uma revolução que libertou Portugal da longa noite fascista. “E assim se faz Portugal. Uns vão bem; outros mal”.
Para equilibrar pronomes e adjectivos, podemos sempre ler Fernando Dacosta e Joaquim Vieira, este na parte dos retratos. Os livros do primeiro, particularmente, Nascido no Estado Novo, de finais de 2001 da editorial Notícias, ( e também o mais recente, As máscaras de Salazar) sendo excepcionalmente bem escritos e documentados, e de equilíbrio e isenção bastantes, não sustentam teses de mestrado ou doutoramento e por isso não encantam academias.
Breve, são livro de “jornalistas”, mesmo que outros jornalistas estrangeiros os acolham como repositórios da nossa História contemporânea, em detrimento dos doutorados que agora criticam os concursos de tv.
Podemos ler João Medina, no seu livrinho sobre os Portuguesismos. E temos um volume editado pela Assembleia da República, sobre os livros proibidos que afinal não o foram sempre.
Temos ainda o acesso a blogs como o Futuro Presente e o Kontratempos, de assinalável qualidade expositiva e erudita, sobre o assunto em causa.
O problema com esses exercícios de voluntarista esparso, ressalta aparente, da leitura da crónica de José Manuel Barroso: perante a sua sugestão de museu vivo, a objectividade histórica, ficaria dependente dos museus que evoquem “favoravelmente” as figuras de cera. Como exemplo acabado, temos já os mausoléus que conservam quase intactas as figuras históricas para serem visitadas em romaria.
Noutros casos de escrita sobre os nossos anos 40 a 70 , regressaremos ao passado, com visões distorcidas do psicadelismo revolucionário que ainda hoje pretendem à viva força garantir os amanhãs a cantar, ou teremos pequenos ensaios politicamente correctos, como o do citado jornalista, alinhados pelo centrão ideológico. É óbvio que falta por aqui alguma coisa para equilibrar e corrigir a visão que nos apresentam como a mais certa.
A História, nisto tudo, acaba refém de ideologias e a tributar visões alheias e peregrinas. E ninguém se lembra que a “História é um carro alegre, cheia de um povo contente que atropela, indiferente, todo aquele que a negue.” no dizer de um cantor sul-americano.
É talvez a este tipo de jornalistas que o artigo de Dan Rather citado pelo Manuel, se destina inteiramente. Ligado ao poder desde o advento da democracia, é um jornalista que está ligado ao poder político efectivo de modo inextricável e já sem remédio, para o ideal do jornalismo independente.
José Manuel Barroso, faz, assim, de pleno direito, parte da nossa inteligentsia e nomenklatura dos poderes difusos do establishment, paralelos aos constitucionalmente consagrados.
Hoje, no DN, articula uma ideia simples, sobre o fenómeno sempre renovado do fascismo salazarista, fascínio antigo dos antifascistas e que dele dependem para a identificação.
Descobre agora, com acuidade visual centrada na tv, que é preciso conhecer melhor Salazar e Cunhal, sem complexos de esquerda ou à direita.
E para sustentar o crescimento de tal ideia, arrebimba o malho no lombo antifascista, culpando-o de obliterar imagens conhecidas, guardadas em álbuns, a fim de veicularem a mensagem convenientemente desejada. Com o balanço, faz o paralelo assimétrico, equidistanciando-se, com o salazarismo da repressão e censura prévia.
Na visão estereotipada do articulista, o antifascista desgraçaria sempre o retrato presencial de Salazar, da mesma forma que o fascista salazarento, safaria rapidamente o Cunhal, do imaginário popular do Alentejo.
Defende por isso, e para garantir a fidelidade das imagens ao dono da máquina de retratos, os museus vivos da História, com figuras realistas, mas retocadas.
O museu Salazar seria o “retrato vivo da época, sem propaganda e sem ocultação”. Já o de Cunhal, seria antes, e “para além da sua evocação favorável”, um repositório de artefactos que “nos desse a conhecer a personagem e a sua época”, como “uma fonte de ensinamentos sobre a História de uma força importantíssima na luta contra a ditadura do Estado Novo”.
E o cronista assegura, com objectividade e rigor, que “conhecer Mao não torna alguém maoista, assim como conhecer Mussolini, não torna ninguém, fascista”.
No topo do bolo deste argumento, a cerejinha da vermelhinha que ludibria: os jovens que lutam no Nepal, em nome das ideias do antigo ditador chinês, se tivessem um museu à vista, onde pudessem conhecer as desigualdades sociais e a ferocidade do regime chinês, talvez não vivessem no obscurantismo, como vivem.
Para emoldurar esta ideia simples, o jornalista, manifesta ainda a sua perplexidade que é comum a outros: o silêncio dos historiadores perante o “debate”.
Realmente, parece ser essa, a sede do problema: a ausência de estudos de História que nos permita citar com proveito e exemplo e ensinar o que se passou, aos mais novos. Temos agora, em demasia, Adolfos Simões Muller, no campo da esquerda e faltam Antónios Josés Saraivas, Antónios Sérgios e até Eduardos Lourenço.
Quem são os historiadores da nossa História recente que ensaiaram estudos precisos, isentos, rigorosos e já divulgados? Rui Tavares? Rui Ramos? Apenas dois ruis e ainda com provas a prestar no capítulo da isenção. O caso particular de Eduardo Lourenço está arrumado num livro esgotado.
Assim, para além dos verbetes de enciclopédia, nos círculos do verbo, não se detecta alma viva a escrever sobre mortos e feridos recentes.
A história do salazarismo fica assim por conta de “ensaístas”, vindos do jornalismo nas notícias e agências de comunicação. São esses curiosos, diletantes dos métodos de investigação histórica e voluntaristas da consulta livresca, quem nos tem valido.
A ausência de nomes, origina o aparecimento de pronomes, em livros de estudo escolar que definem o salazarismo como o fascismo e o 25 de Abril, como uma revolução que libertou Portugal da longa noite fascista. “E assim se faz Portugal. Uns vão bem; outros mal”.
Para equilibrar pronomes e adjectivos, podemos sempre ler Fernando Dacosta e Joaquim Vieira, este na parte dos retratos. Os livros do primeiro, particularmente, Nascido no Estado Novo, de finais de 2001 da editorial Notícias, ( e também o mais recente, As máscaras de Salazar) sendo excepcionalmente bem escritos e documentados, e de equilíbrio e isenção bastantes, não sustentam teses de mestrado ou doutoramento e por isso não encantam academias.
Breve, são livro de “jornalistas”, mesmo que outros jornalistas estrangeiros os acolham como repositórios da nossa História contemporânea, em detrimento dos doutorados que agora criticam os concursos de tv.
Podemos ler João Medina, no seu livrinho sobre os Portuguesismos. E temos um volume editado pela Assembleia da República, sobre os livros proibidos que afinal não o foram sempre.
Temos ainda o acesso a blogs como o Futuro Presente e o Kontratempos, de assinalável qualidade expositiva e erudita, sobre o assunto em causa.
O problema com esses exercícios de voluntarista esparso, ressalta aparente, da leitura da crónica de José Manuel Barroso: perante a sua sugestão de museu vivo, a objectividade histórica, ficaria dependente dos museus que evoquem “favoravelmente” as figuras de cera. Como exemplo acabado, temos já os mausoléus que conservam quase intactas as figuras históricas para serem visitadas em romaria.
Noutros casos de escrita sobre os nossos anos 40 a 70 , regressaremos ao passado, com visões distorcidas do psicadelismo revolucionário que ainda hoje pretendem à viva força garantir os amanhãs a cantar, ou teremos pequenos ensaios politicamente correctos, como o do citado jornalista, alinhados pelo centrão ideológico. É óbvio que falta por aqui alguma coisa para equilibrar e corrigir a visão que nos apresentam como a mais certa.
A História, nisto tudo, acaba refém de ideologias e a tributar visões alheias e peregrinas. E ninguém se lembra que a “História é um carro alegre, cheia de um povo contente que atropela, indiferente, todo aquele que a negue.” no dizer de um cantor sul-americano.
Publicado por josé 23:22:00
4 Comments:
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Também lí o artigo da “preocupação” do jornalista, para escrever a História… Para isso, nada melhor que um espírito livre, o que pouca gente parece ter!
Em
http://sorumbatico.blogspot.com/2007/03/curiosidade-e-dvida.html
podem ver-se duas versõs da MESMA fotografia (da LUSA), ambas publicadas no «DESTAK» de hoje, em que uma está completa e a outra aparece manipulada, com várias personagens "apagadas" e substituídas por uma espécie de parede, metida "ad-hoc".
Como não sou jornalista, pergunto - na esperança de que alguém me esclareça: esse procedimento é aceitável?
A imagem da LUSA foi, de facto, manipulada, mas pelo jornal que a publicou e não pela agência.
O assunto é tema de notícia no PÚBLICO de hoje (17 Mar 07, pág 15), que se pode ler em:
http://sorumbatico.blogspot.com/2007/03/e-esta.html