Desalmado

James Brown morreu. Mais um dos gigantes da música soul que deixa o mundo dos vivos.
Na primeira metade da década de setenta, do século que passou, costumava discutir gostos musicais com os da minha igualha, no liceu. Numa época em que num único mês, podiam sair a público obras primas musicais, aos pares, discutíamos, por exemplo, se Stevie Wonder seria o maior dos cantores da música soul ou se nesse pedestal poderíamos colocar, antes dele, James Brown.
Embora a mim puxasse mais ao ouvido, a sonoridade suave e melódica de Yester me, yester you, yester day, do Wonder de 1969, havia coriáceos que me desdenhavam essas músicas, trocando-as pelo ritmo funky de James Brown, -esse, sim!,- the real thing. Não percebia então, como continuo a não perceber, a razão substancial da troca. Afinal, Stevie Wonder viria a publicar Innervisions, pouco tempo depois. E Songs in the key of life um par de anos a seguir.

Em 1973, passavam já dez anos sobre o lendário disco ao vivo de James Brown, no Apollo de Harlem, ( Live at the Apollo) quando saiu Talking Book de Stevie Wonder que continha músicas como Superstition, You are the susnshine of my life e ainda I believe ( when i fall in love it will be forever). A comparação, a mim, parecia-me facílima e em favor de Stevie, mas…qual quê! À força elevadora da melodia celestial, impunham-me o gosto chão pelo ritmo pagão. E Brown ganhava, nessa competição de gostos.
Em 1973, James Brown já tinha gravado e cantado It´s a man´s man´s world ( de 1966) , I feel good, de 66 e principalmente Get up i feel like being a sex machine ( de 1970) e a comparação com o disco de Wonder, era o Get on the good foot, saido nesse mesmo ano e terceiro volume do Live at the Apollo. Em 1968, saíra o segundo volume de Live at the Apollo e em 1972, o terceiro, dessa série original, daquele que muitos consideram um dos maiores discos gravados ao vivo, por qualquer artista.
Em 1970 saíra Sex Machine, outro disco musicalmente enérgico de James Brown (o “super soul dynamite”). Mas...Stevie Wonder nunca teve nos seus discos, a força do ritmo puxado a cavalos de metais sonoros, com baixos calcados para bater em paredes de discotecas e fazer ricochete nos copos vazios.
Por isso, a partida estava ganha pelo apelidado Padrinho da Soul, à força de gritos apelando ao sexo palavroso, à política panfletária ( apoiou Nixon), aos baixos ribombantes misturados com bombos profundos e aos metais afinados em frases salteadas. A música de James Brown é música de dança, essencialmente. Aliás, o próprio afirmava-se, modestamente, como o “ inventor de todas as danças”!
Os discos ao vivo de Brown, granjearam-lhe toda a fama e proveito e o primeiro foi logo o fundamental, de 1963, gravado na casa de espectáculos Apollo, no bairro de Harlem . Dizem entendidos ( CD Review, de Outubro de 1992) que pode muito bem ser o maior disco de música popular, ao vivo, jamais gravado. À frente de Amazing Grace de Aretha Franklim, de 1972; de Almann Brothers at Fillmore East, de 1971, de Bob Marley e os Wailers,no Lyceum de 1975; de Who, Live at Leeds, de 1970 e outros como os Grateful Dead, de Live/Dead.
Em Maio de 1975, antecipando uma onda disco que nascia, James Brown, refazia Sex Machine Today, cuja versão em mp3 pode ouvir-se por aí. Em 1979 já se proclamava “ The original disco man”e foi já nos anos oitenta que ouvi, numa aparelhagem sonora instalada num carro, com um tremendo subwoofer de levantar os assentos, uma versão amplificada de Sex machine, pelo padrinho da Soul.
Perante as inúmeras compilações de temas e discos lançados ao ritmo do funky de James Brown, há quem garanta que os temas antigos não passam de moda e quem quiser ver James Brown no seu melhor, pode sempre espreitar por um tubo, no You Tube. Vão por aqui. Ou ler por ali ou acolá, melhores obituários que este que aqui fica. Pode ainda consultar-se o melhor que há para ler na crítica aos discos, aqui.
Para mim, basta-me esta imagem tirada de uma Penthouse antiga, dos setenta...e que nos liga ao Apollo. I Feel good.

Publicado por josé 23:45:00  

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