A corrosão democrática
segunda-feira, dezembro 04, 2006
Ainda a propósito da organização do poder político e do fenómeno da corrupção adjacente, na sequência das declarações continuadas de João Cravinho, de Euclides Dâmaso, de Maria José Morgado, do próprio procurador-geral da República actual( no discurso de tomada de posse) , fica aqui um pequeno excerto da entrevista de Paulo Morais, antigo vereador na Câmara do Porto, ao JN de hoje.
A claríssima radiografia do fenómeno efectuada por João Cravinho, ainda há pouco tempo, aquando da apresentação de um plano legislativo de combate, em nome de um partido, deve completar-se com outros retratos que perfilam a corrosão da nossa vida pública.
Este pequeno esboço que por aqui se deixa, da autoria de Paulo Morais, permite mais um pouco de luz nessas sombras persistentes da democracia.
O retrato perfeito do fenómeno não se torna fácil de delinear, porque no mundo das sombras todo o recato é pouco. Assim, as achegas de quem sabe, tornam-se fundamentais para que todos fiquem a saber. E o acrescento de Paulo Morais, neste ponto, é importante: a ligação das pequenas estruturas intermédias dos partidos aos fenómenos de corrupção séria e persitente, não deve ser desvalorizada. E a explicação quase sociológica para a ascensão e permanência no poder nos partidos, é algo de que habitualmente não se fala nem comenta. Porém, parece essencial para aquele retrato.
Jornal de Notícias (J.N.)- Temos alguns "Salazares" na política?
Paulo Morais (P.M.)- Temos. Com a Revolução, as corporações organizaram-se por forma a assaltar os partidos. A democracia é pouco participada não porque os portugueses recusem participar mas porque não os deixam. O espírito de Salazar mantém-se e todo um conjunto de salazaretes de segunda que andam aí a dominar o sistema fazem com que estejamos a ficar quase irremediavelmente afastados do desenvolvimento.
J.N.- Esses "salazaretes" são os líderes dos partidos?
P.M.- São alguns dirigentes intermédios dos partidos. E estão mais ao serviço de quem financia a sua vida política e até pessoal.
J.N.- E os grupos de pressão de que fala no Urbanismo?
P.M.- Normalmente, o planeamento é uma gestão de bolsa de interesses. Criam-se mecanismos de tráfico de influências e corrupção.
Publicado por josé 10:14:00
Vida extremamente difícil para estes autarcas, verdadeiros resistentes, “ignorados” ou até ostracizados pelo poder político…
No pasa nada?
Não foi meu propósito, ao mencionar a entrevista de Paulo Morais, anunciá-lo como "cidadão vertebrado" ou até promover a sua imagem (que notoriamente pretende).
Propósito foi o de anunciar uma denúncia pública feita pelo mesmo: " Normalmente, o planeamento é uma gestão de bolsa de interesses. Criam-se mecanismos de tráfico de influências e corrupção."
Por outro lado, a corrupção aparece onde o terreno é propício e adubado para tal.
Os municípios são um latifúndio de interesses vários, mas a Administração Central, politicamente marcada, também terá os seus coutos bem fortificados.
Isso, segundo João Cravinho, Saldanha Sanches, etc etc.
Trata-se apenas de um caso. O que interessa observar, será sempre o tal “ mecanismo “.
Eu não sabia. Normalmente quando se fala nestes assuntos é para dizer que todos os políticos são corruptos, é tudo a mesma corja, etc. Nada que possa ser levado a sério. Mas ao ouvir o que Paulo Morais tem para dizer, podemos realmente acreditar numa rede de corrupção que envolve "alguns dirigentes intermédios". Bom trabalho José... como sempre.
Só não percebo porque é que Paulo Morais esteve tão caladinho enquanto esteve na Câmara do Porto e só começou a falar em corrupção quando perdeu o lugar por o CDS/PP não o ter indigitado para novo mandato.