Ideias feitas

José Manuel Fernandes, do Público, exprime hoje em editorial uma ideia quase apresentada como um achado: “As ideias são importante em política . Tão importantes que podemos encontrar uma das raízes do nosso atraso no domínio que a Inquisição e os jesuítas tiveram, durante séculos, sobre o que podia ou não ser conhecido e debatido”.

Confesso que ao ler isto, ocorreu-me logo a ideia de que esta ideia é mais uma das que circulam por aí, como um crédito fiduciário. Resta saber se será uma das ideias sólidas ou se pelo contrário, é mais uma das que circulam “má moeda” ou até moeda mesmo falsa.
Apresentar a Inquisição e os jesuítas como a causa do declínio do povos português, não é ideia inteiramente nova. Dir-se-ia até plagiada, porque está em moda, a cópia.
Antero de Quental, seguido de Oliveira Martins e Alexandre Herculano, já tinham feito o esforço de apresentar a contra-reforma e o jesuitismo como uma das causas da decadência do Portugal seu contemporâneo, alargando até a toda a península a ideia peregrina. Mas não se ficaram por aí e espalharam a nova de que também a monarquia absoluta e os descobrimentos tiveram a sua quota de responsabilidade na queda.
Para verificar se a Inquisição será uma das causas seguras dos nossos males presentes, poderemos sempre ver um exemplo, de comparação: o da nossa vizinha Espanha, país economicamente atrasadíssimo, onde quem entra numa livraria só encontra exemplares do Caminho ao lado da Hola e que ainda nem tem TGV ou regiões autónomas. O nível de vida dos espanhóis anda pelas ruas da amargura e são eles quem nos invade para tentar nichar um emprego nas obras públicas.
Como é sabido, a Inquisição Espanhola, foi outra coisa que a nossa nunca foi. Os dominicanos fervorosos do reino de Aragão e depois de Castela, lograram um Tomás de Torquemada, escolhido pelos reis católicos, Fernando e Isabel, em finais do séc XV e durou mais de trezentos anos. A inquisição espanhola e o temível Torquemada são tomados como os papões máximos da repressão religiosa e política. Segundo relatos históricos, 2000 pessoas terão sido mortas, em…300 anos.
Muitos dos judeus perseguidos vieram para Portugal, onde assentaram arraiais e só em pleno séc. XVI, no reinado de D. João III a inquisição teve o seu Inquisidor-Mor que aliás ninguém conhece como conhece Torquemada.
Porém, em Portugal, por força das tais ideias que peregrinam em jornal, tipo Público, ultimamente, quem pretende atacar suspeitos redutos ideológicos ou fontes de corporativismo ou secretismo orgânico, fala em Inquisição. Fala nisso, como dantes falava em “fascismo”, ou “pide” ou mesmo “bufos”. A “inquisição” está a tornar-se muleta de estultos para levaram água ao moinho das ideias feitas.
É por isso verdade que as ideias são importantes em política.
Já houve um tempo em que por cá germinaram bem as ideias certas de Marx, Engels e Lenine, a quem alguém acrescentava…Mao Tse Tung. Por causa dessas ideias certas e de cientificidade indiscutível, até 1989, ainda se podia ler na Constituição que nos ampara, que éramos uma sociedade empenhada na sua transformação em sociedade sem...classes!

As ideias feitas de então, tributavam sensivelmente os mesmos, que agora, com o mesmo fervor, se viram para santo Hayeck, para a beatificada Thatcher que acabou com o domínio do mafarrico encrustado nos sindicatos e corporações e até para um génio da política e das ideias que dava pelo nome de Reagan e tinha sido galã de Hollywood, na juventude.
São estas as ideias fontanárias a que um outro português, com apelido de fora- O´Neill- se referia.

Publicado por josé 14:10:00  

1 Comment:

  1. zazie said...
    Há coisas que nunca mudam. Quem foi formado por ideologia nunca largará os tiques. O fio condutor é o mesmo. A visão jacobina e utilitária da sociedade.

    Como dizia o Timshel num post iconoclasta- é a ideologia burguesa a funcionar.

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