O retorno aos clássicos


Um leitor que saudavelmente se intitula de “mabeco” e solicita anonimato, escreveu o seguinte, há uns dias atrás, a propósito do estudo dos clássicos e das edições a condizer:

Há quantos anos o amigo não vai às livrarias? Há 30, 40? Então não há uma colecção de clássicos na Cotovia, outra nas Edições 70, outra naAlcalá, outra ainda na Relógio de Água, outras na Imprensa Nacional,fora as colecções da Gulbenkian, do Inic, da Jnict e agora daFct-Gulbenkian? Meu caro, nunca os clássicos gregos e latinos foram tãoestudados e traduzidos. Fique sabendo que classicistas de Coimbra e deLisboa, mas também do Porto, Aveiro e Braga traduziram nos últimos 25anos Ésquilo e Sófocles, quase todo o Eurípides, muito Aristófanes,todo o Terêncio, quase toda a obra plautina, muito Cìcero, quase todosos diálogos platónicos, Aristóteles, Plutarco (é verdade faltam as obramaiores), Heródoto (está bem, falta Tucídides), Homero, Virgílio, oslíricos gregos, Horácio, Marcial, Petrónio, etc., etc.. Mas essa elite- sim é uma elite e por isso os beócios querem acabar com ela -, fezmais, muito mais. Estudou a historiografia, o teatro, a filosofiamoral, a poética e a retórica, a épica grega e latina; revelou muitasobras da nossa Idade Média Latina; deu a conhecer a riquíssimaliteratura novilatina do Portugal de Quinhentos. Foram classicistas quetrouxeram de novo à luz obras de Cataldo, André de Resende, AntónioPinheiro, Damião de Góis, Aquiles Estaço, Jerónimo Osório, Inácio deMorais, Luís da Cruz, Miguel Venegas, Aires Barbosa, Diogo Pires, LopoSerrão, etc., etc. A esses classicistas se deve a história do humanismoem Portugal feita a partir dos textos e não de conjecturas mais oumenos preconceituosas.”

Ora, meu caro “mabeco” ( o privilégio deste tratamento, como saberá, é aqui da Loja e tem o copywright assegurado por Vital Moreira), folgo muito em ler tudo o que conta, mas que conta pouco, no panorama mediático português.
Por isso mesmo, as referências de Maria Helena da Rocha Pereira a um grupo de classicistas de muito valor, formados pelas escolas de Coimbra e Lisboa, foram apontadas no texto em causa, embora circunscrito a uma espécie de seitas escondidas nas faculdades.
E também por isso mesmo, é que se estranha que nos jornais apareçam diletantes a escrever crónicas avulsas, quando poderíamos certamente com muito proveito e exemplo, ler artigos e textos de quem se esmerou a estudar labirintos.
Estranha-se, mas não se entranha porque a razão para tal fenómeno, foi também apontada a seguir, no meu modesto entender: quem dirige jornais, sabe de jornalismo e pouco mais. Logo, co-opta para a escrita quem lhes parece sábio…segundo a sua própria sabedoria, feita de valores e referências idiossincráticos e de mediocridade patenteada.

Como também já disse, uma das razões do nosso atraso geral pode muito bem residir nesse nicho de mercado de que ninguém fala. Aliás, quem é que nos media, levantaria essa voz?! Só um "maluco" , pela certa. Vamos lá a ver...

Publicado por josé 12:10:00  

3 Comments:

  1. james said...
    Ficou demonstrado que a cultura clássica continua a sobreviver por debaixo dos panos e que a este fenómeno (de exclusão) também não são alheios os agentes educativos - cabalísticos e tribais.

    Quanto aos jornais, estão a ver o Morgado Fernandes, o Teixeira, o José Manuel Fernandes ou o Henrique Monteiro a fomentarem a "divulgação" deste tipo de matérias?

    Mas quem é que marca a agenda?

    São os visados, ou pelo contrário, são o Pacheco Pereira, o Graça Moura, o Victor Gonçalves da RTP, o Dias Alves ou o Fernando Seara?
    josé said...
    Claro que é esse o problema, caro hefastion!

    Apesar de existir um bom naipe de pessoas que sabem destas coisas, ficam confinadas às catacumbas universitárias, escrevendo os seus achados em publicações obscuras a que chamam teses de doutoramento e que lhes consomem anos de trabalho para ficarem a aguardar em estantes labirínticas.

    Quem se reserva o direito à ribalta são estes arrivistas da cultura massificada armados em intelectuais.
    Xantipa said...
    Já passaram dois meses desde este post, mas como só agora o vi (dado que sou uma recém-chegada à blogosfera), não quis deixar de vir agradecer ter discutido este assunto, aqui e no outro post que deu origem a este. Nunca são de mais as chamadas de atenção para os estudos clássicos.
    Vou «lincá-lo» no meu blogue.
    Obrigada!
    Adriana Nogueira

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