Quando tiver 64...
segunda-feira, junho 19, 2006
When I get older losing my hair
many years from now
will you still be sending me a valentine
birthday greeting, bottle of wine
If I'd been out till quarter to three
would you lock the door
Will you still need me
Will you still feed me
When I'm sixty-four
Beatles, 1967.
Em 1966, Paul McCartney compunha esta canção, publicada no ano seguinte, no LP Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band, em que perguntava explicitamente se alguém lhe ligaria alguma… quando tivesse 64 anos! Fê-los ontem!
A pergunta, porém, tem aqui resposta hoje mesmo.
Quando envelhecer , perdendo o cabelo,
Daqui a muitos anos,
Será que me mandam um postal a desejar bom aniversário?
É para já, Sir Paul McCartney! O que lhe devo em alegrias musicais, ao longo dos anos, justificam uma plena homenagem em formato de postal num blog despretencioso, no imenso universos blogosférico global.
A música e algumas palavras de Paul McCartney, nos Beatles e em trabalhos “ a solo”, para mim significam tanto como as melhores obras artísticas, literárias, pictóricas ou de outra ordem.
A música composta por McCartney ao longo dos anos, reúne alguns dos melhores sons que alguém jamais produziu para serem ouvidos.
É essa singela homenagem que aqui fica.
A canção dos 64 anos, gravada há quase quarenta , em finais de 1966 e incluída no mítico Lp de 67, dos Beatles, Sg Peppers Lonely Hearts Club Band, trazia em anexo uma nostalgia futura: lembrava aos novos que a velhice dos sessenta viria lá para o fim dos tempos e se atingiria lá para o séc. XXI, numa data de ficção científica.
Acontece porém que já lá chegamos e a ciência, ficcionando promessas, ainda não nos permite viajar no tempo, como então se julgaria possível.
Viajemos então nas memórias, que são interstícios do tempo, com sensações fragmentadas de “alegrias e dores, penas e trabalhos”.
Em 1966, até 1970, para mim e em termos estritamente musicais, havia os Beatles e pouco mais.
E os Beatles, pouco mais eram do que as canções Ob La Di Ob La Da, Yellow Submarine, All you need is love ou Oh Darling.
Era mais um grupo de singles do que um disco de longa duração.
Contudo, o grupo já vinha a compor êxitos desde 1963, com o álbum Please Please me que continha pérolas musicais como Love me do ( inteiramente de McCarteny), Do you Want to Know a secret, para além do tema título do disco que começava com uma sonoridade de harmónica.
O segundo disco, With the Beatles, do mesmo ano, continha por exemplo All my loving (inteiramente de McCartney) e o terceiro, lançado em 1964 com o título Hard Days Night, continha Things we said today( inteiramente de McCartney) , You can´t do that e And i love her (inteiramente de McCartney). No mesmo ano saiu Beatles for Sale que tinha I´ll follow the sun (inteiramente mcCartney) , I don´t want to spoil the party e No reply .
Em Agosto de 1965 ouvia-se Help!, com as canções do filme do mesmo nome, realizado por Richard Lester e que incluía três canções das melhores do grupo: You´ve got to hide your love away ( Lennon, influenciado por Dylan, segundo uma entrevista de McCartney à revista Playboy, em 1984) , Yesterday e I´ve just seen a face .
A canção Yesterday , talvez a mais interpretada por outros autores na história da música, é um clássico da autoria exclusiva de Paul McCartney que a terá escrito definitivamente, a caminho do Algarve, com algumas hesitações quanto à letra que começou por se referir a ovos estrelados e ao amor às… pernas duma rapariga. A melodia e a letra definitivas , porém, sintetizam na perfeição as agruras de um afecto perdido de um dia para o outro, sem remédio e por culpa própria.
Em Dezembro do mesmo ano, novo lançamento. O álbum Rubber Soul representa uma viragem na obra dos Beatles, já decisivamente influenciados por Bob Dylan que os encontrou em Londres e a construção de uma identidade para além da herança dos anos 50 e do rock n´ roll. As letras, até aí de algum descomprometimento social, começam a reflectir, aos poucos, outras preocupações para além das mulheres e do amor conquistado e perdido. Nowhere man fala de solidão e In my Life , a primeira de John Lennon, e a última de McCartney, esta última com a curiosidade do cravo, e de nostalgia de lugares do passado. Michelle ( inteiramente de McCartney) é uma cançoneta cantada em inglês e francês, de letra simples e de beleza desconcertante. Norwegian Wood, inteiramente da autoria de John Lennon, integra a primeira intervenção do instrumento indiano, “sitar”, na música rock e refere-se à infidelidade matrimonial ( de Lennon, supõe-se).
O disco de Agosto de 1966, Revolver, é outro marco da música pop. Seguramente entre os dez melhores discos da década, contém pérolas musicais como Eleanor Rigby( essencialmente de McCartney) , com uma parte de violinos directamente inspirada na música de Vivaldi ( Lennon dixit) e letra a contar a história de mais solidão; Here there and everywhere, de Paul McCartney, sobre o que significa amar em perfeita harmonia; For no one, também de McCartney e uma das preferidas de John Lennon, juntamente com a anterior, é uma crónica dum amor a dois que ficou órfão, com saudades de quem ficou. Yellow Submarine,( inteiramente de McCartney) cantada por Ringo Starr, é um exercício de virtuosismo conceptual de McCartney, a nível musical e com um refrão facilmente apreendido e cantado. Um clássico.
O disco seguinte, já de 1967, Sgt Peppers Lonely Hearts Club Band é o primeiro álbum conceptual da música rock, utilizando as treze canções como um todo, em sequência e ligadas entre si, com influências musicais de diversas proveniências e que transcendiam o tradicional blues e rock n´roll,. Não continha singles evidentes, mesmo que Lucy in the sky with diamonds ( de Lennon) viesse a atingir o primeiro lugar de vendas nos USA, em 1974, na interpretação de Elton John. O disco vale como exercício de inovação e composição em estúdio, de uma complexidade superior e levou seis meses a completar. Na altura, Pete Towshend dos Who achou-o fantástico e aquilo que ele próprio queria fazer. Para completar o quadro, a BBC proibiu a faixa A day in the life, por entender que continha referências implícitas ao consumo de drogas.
A revista Time , na época, para além de lhes dedicar a capa , escreveu que “ a capa num novo LP chamado Sgt. Pepper´s Lonely Hearts Club Band é uma fotomontagem de um grupo de pessoas reunido à volta de uma campa. Um curioso grupo: Está lá Marylin Monroe e também Karl Marx, Edgar Allan Poe, Albert Einstein, Lawrence da Arábia, Mae West, Sonny Liston e oito Beatles. Oito? Bem, quatro deles, de pé, parecendo bonecos de cera, são de facto figuras de cera dos Beatles como a maioria das pessoas os reconhecem: cabelo bem penteadinho, fatos escuros, caras de meninos de coro. Os outros quatro Beatles estão bem vivos: magritos, com aspecto hippie, de bigode, vestidos com uniformes esquisitos."
No mesmo artigo, é citado um compositor de “canções de arte “, Ned Rorem, o qual refere que uma das composições do disco, She´s Leaving Home(inteiramente de McCartney) , é equivalente a qualquer uma das canções que Schubert escreveu. Também Leonard Bernstein tem idêntica opinião. Cita Schumann e um musicólogo, Henry Pleasant diz estarem os Beatles onde a música `estava`, nesse momento.
Contudo, numa entrevista à revista Musician, em Agosto de 1980, Paul McCartney dizia que o disco tinha sido muito influenciado pelo Lp Pet Sounds, dos Beach Boys, saído no ano anterior e que os tinha impressionado sobremaneira pela invenção musical, o que levou directamente a uma emulação criadora. Curiosamente, Brian Wilson, o criador de Pet Sounds, dizia nas notas à reedição do disco em cd, em 1990, que em Dezembro de 1966 começou a ouvir Rubber Soul e que este também o impressionou e o desafiou pela qualidade artística de cada uma das músicas e sentiu a necessidade de competição…
A seguir a essa obra prima, e ainda no mesmo ano, os Beatles lançaram Magical Mistery Tour, filmado também para um espectáculo na televisão. O disco, na Inglaterra só saiu em 1976, mas a edição americana continha os singles Penny lane ( inteiramente McCartney) e All you need is love, saídos anteriormente e ainda Your mother should know ( inteiramente McCartney) e Strawberry fields forever ( Lennon). É um disco sem história, uma extensão do anterior , mas com essas músicas memoráveis, apesar de tudo.
Em 1968, Paul McCartney escreveu dois temas – Lady Madonna e Hey Jude – que se tornaram sucessos como singles e precederam a saída do album duplo de capa branca, por isso mesmo chamado Álbum Branco, um compêndio do génio musical do grupo e de McCartney em particular.
Este disco contém trinta canções que são uma espécie de testamento dos Beatles, pois abrangem todas as facetas musicais do grupo e algumas obras primas como Ob la Di Ob La Da, Piggies ( George Harrison), Martha my dear , Blackbird ( essencialmente McCartney) , Júlia ( Lennon) , Sexy Sadie ( Lennon) e While my guitar gently weeps( George Harrison). Não sendo um álbum conceptual é um álbum de conceitos: Piggies, de G. Harrison é sobre porcos e porquinhos que vivem na sujidade e se deleitam com isso; Julia de John Lennon é sobre a mãe deste, e também sobre a mulher Yoko Ono.
Sexie Sadie, de John Lennon, é sobre o guru Maharishi e foi escrita à partida da Índia. Dear Prudence escrita na Índia por J.Lennon, é sobre uma irmã de Mia Farrow que aí se tornou uma meditadora compulsiva em busca da descoberta cósmica, à frente dos demais e numa óptica de competição.
Em 1969, os Beatles publicaram Abbey Road.
As contribuições de McCartney para esse disco já “do meu tempo”, mais que perfeito:
Maxwell´s silver hammer; Oh Darling, numa interpretação que marcou a minha entrada séria na música dos Beatles, com vontade de conhecer tudo o que havia para trás; You never give me your Money; Carry that weight; The end.
Em 1970, o último disco do grupo chamou-se Let it be e já foi aqui cronicado em tempos.
De McCartney podemos ouvir:
Let it be, na sua magnificência clássica e The Long and Winding Road, no seu classicismo magnífico, resumem o disco, sem necessidade de esperar pela última, Get back.
Regressando porém, ao futuro das décadas seguintes, de 70 e 80, McCartney produziu ainda algumas obras primas de relevo singular, em single publicadas. A escolha por álbum quanto a mim, recairia em duas ou três obras: uma de 1973, Band n the Run e outra de 1975, Venus and Mars e a última , em 1978, London Town.
HAPPY BIRTHDAY, Sir Paul McCartney.
Publicado por josé 16:36:00
Recordo mesmo que havia um "maluco" que tinha gravados em gravador (um grundig enorme) três ou quatro anos de Em Órbita e mais uns quantos programas (Europa, A grande roda etc... Eram centenas e centenas de fitas que o raio do tipo conservava na garagem. Tê-las-á ainda? estará vivo?
Ah aquela descoberta diaria de músicas...
Ora aqui está algo de que nunca mais me esquecerei!
Essa descoberta do tal "maluco" ( que eu aprecio, num desequilíbrio sustentado e consciente) é que seria uma autêntica lança em África!
E a recuperação do espólio do Grundig vetusto em em formato de gravação em bobine de não sei quantas polegadas, então seria mesmo a conquista do continente todo, incluindo o Sahara, pois quatro anos do Em Órbita do Jorge Gil, significam exactamente toda a história da música popular, na altura em que a mesma explodiu em quantidade e qualidade inultrapassáveis.
E pelo que julgo saber, o próprio Jorge Gil será guardador de algumas gravações. Suspeito, porém , que serão as relativas ao final dos setenta e psteriores, em que já só jurava pela música erudita, barroca e o diabo em forma de intervalo de 4ª aumentada.
Tenho que investigar esta autêntica mina de ouro.
Agarre-me esse "maluco" e se tal não for possível, escreva essas memórias musicais porque eu não as cheguei a ter, por não ter tempo para tal...
Por outro lado, tenho o dia ganho, só com estas memórias.
Grande postal e merecida homenagem.
McCartney é talvez o maior génio melódico da música popular do séc. XX. Nas letras, ficava milhas atás de Lennon (em especial a partir de 1966) e chegava a roçar o que hoje se qualificaria de "pimba", mas poucos músicos se poderão gabar de ter assinado tantas obras-primas (individualmente ou em co-autoria) como Sir Paul.
Só uma nota a esta sua magnífica evocação. Sempre me custou a acreditar que a letra de "Eleanor Rigby" fosse essencialmente de Paul. Numa entrevista famosa à Rolling Stone Lennon diz "..."Eleanor Rigby" I wrote a good half of the lyrics or more...". Talvez seja mais justo creditar essa pérola à dupla Lennon - McCartney.
Quando escrevi que Eleanor Rigby é "essencialmente" da autoria de McCartney e não "inteiramente" como nos outros casos que citei, tive em conta essa particularidade, porque li( e tenho-a guardada, de época...hummm) a entrevista que Lennon deu à Playboy, onde se pronuncia detalhadamente sobre as mais importantes composições dos Beatles.
Em relação à Eleanor Rigby, diz assim, ipsis verbis:
Paul´s first verse, and the rest of the verses are basically mine. Paul had the theme, the whole bit about Elanor Rigby in the church where a wedding had been. He knew he had this song and he needed help, but rather than ask mo to do the lyrics, he said:
"hey you guys, finish up the lyrics," while he sort of fiddled around with the track of the arranging or something ar another part of the giant studio at EMI."
O resto do depoimento de Lennon, não transcrevo, porque afinal o postal pretende homenagear Paul McCartney e o seu génio musical.
Mas...mesmo assim, continuo a preferir a franqueza e a desenvoltura e mesmo a profundidade de sentimentos expressos, de John Lennon, como já escrevi.
Mas, por exemplo, Fool on the hill é uma canção totalmente de McCartney, e na entrevista, sobre essa canção, Lennon diz assim:
" Paul again, proving that he can write lyrics if he´s a good boy".
Lennon era impagável, na frontalidade.
Quanto à franqueza de Lennon - e à emulação entre ambos - aqui fica mais uma amostra (da entrevista à Rolling Stone):
"What do you think Paul will think of your album?
I think it'll probably scare him, into doing something decent. And then he'll scare me into doing something decent and I'll scare him... like that".
Ainda sobre as canções de Paul McCartney, talvez seja interessante ler o que sobre elas, disse o autor, numa entrevista precisamente à Playboy ( com link assinalado). Sobre estes assuntos, só lendo os autores e mesmo assim…
Sobre a canção Eleanor Rigby:
PLAYBOY: Eleanor Rigby.
PAUL: I wrote that. I got the name Rigby from a shop in Bristol. I was wandering round Bristol one day and saw a shop called Rigby.. And I think Eleanor was from Eleanor Bron, the actress we worked with in the film Hep! . But I just liked the name. I was looking for a name that sounded natural. Eleanor Rigby sounded natural.
E sobre a tal dos 64 anos, como canção da adolescência, parece ter sido composta ao piano quando o autor tinha 15 anos, logo seria por volta de 1957, altura do aparecimento do rock n´roll. Pelo menos, é isso que diz, na tal entrevista.
Anos depois, juntou-lhe a letra.
Anos depois? Quantos? Se foi em 1966, seriam mais nove anos , na altura da gravação de Sgt peppers. Seria? Who knows?!
PLAYBOY: What about When I'm Sixty-Four?
PAUL: Who knows? Yeah, I wrote the tune when I was about 15, I think, on the piano at home, before I moved from Liverpool. It was kind of a
cabaret tune. Then, years later, I put words to it.
PLAYBOY: In his Playboy Interview, John said that was a song he didn't like and never could have written.
PAUL: Who knows what John liked? You know, John would say he didn't like one thing one minute and the next he might like it. I don't really know what he liked or didn't like, you know! It would depend on what mood he was in on a given day, really, what he would like. . . . I don't care; I liked it!
Quanto às datas de gravação e lançamento dos dois últimos LP´s dos Beatles:
Let it be, originalmente seria um programa de tv, com gravações extraídas do recente Álbum Branco.
Com o tempo, passou a um conjunto de gravações totalmente novas, embora mantendo a ideia de concerto para televisão, sonoramente dirigido por…Glyn Johns ( o mesmo produtor do primeiro LP dos Eagles) com a supervisão de George Martin, o habitual guru dos Beatles.
AS gravações ocorreram eventualmente e estão disponíveis.
Numa delas pode ver-se o grupo no telhado do edifício de Saville ROw. Imagens célebres.
O single Don ´t let nme down e Get back foram lançados no início do Verão de 1969. Don´t let me down não foi incluído no Let it be publicado em 1970.
Abandonando a ideia da gravação do concerto para a tv, regressaram ao estúdio , na primeira metade de 1969.
Quem pode dizer o que foi gravado antes e depois, relativamente aos dois últimos álbuns?
Segundo as notas do livreto no duplo cd Let it be…naked, publicado em 2003, doze canções de Abbey Road, já tinham sido escutadas, em Janeiro de 1969, aquando da ideia da tal gravação do concerto para a tv. Logo, não se pode dizer assim sem mais que foram gravadas depois das canções de Let it be.
Por exemplo, Across the Universe, de John Lennon, aparece em Let it be, embora gravada em 1968.
Mas I me mine, foi gravada em Janeiro de 1970 e entregue ao produtor Phil Spector.
Por outro lado, o resultado das gravações aquando da ideia do concerto para a tv, foi recolhido e tratado por Phil Spector, que lhe adicionou a instrumentação que deu o produto final que se pode ouvir e comparar com o Let it be…naked. Diga-se de passagem que Phil Spector fez um excelente trabalho que prefiro, à sonoridade do álbum original.
Ora este tratamento sonoro, com muro de som à la Phil Spector, ocorreu já em 1970, embora as gravações originais do disco ocorressem em Janeiro de 1969.
Logo, por mim, continuo a dizer que a cronologia da discografia dos Beatles será a que escrevi.
Segundo a imprensa da época, ( NME de 7.6.1969) John Lennon declarou nessa altura que o próximo disco dos Beatles chamar-se-ia “Get back,Dont´ Let me down & 12 Other tracks”
Abbey Road acabou por ser lançado em Setembro de 1969…e em Novembro o single Something de George Harrison disparava nas vendas. Os Beatles, por essa altura, já eram.
Em Maio de 1970, sai Let it be, na versão de SPector, mas My sweet Lord de George Harrison já tinha sido gravado.
That´s it, mas…who cares?!