Apelo à calma
quarta-feira, março 01, 2006
Processo contra Isaltino Morais volta à fase de inquérito
O Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) anulou a acusação deduzida no passado mês de Janeiro contra o presidente da Câmara Municipal de Oeiras, Isaltino Morais. Pelo que o processo volta, assim, à fase de inquérito. A decisão foi tomada hoje pelo juiz Ivo Rosa, em virtude de não ter sido ouvido pelo Ministério Público - na fase de inquérito - um dos arguidos no processo, José Algarvio.
Segundo a agência Lusa - que cita informações de fonte judicial - a declaração de nulidade suscitada pela defesa de José Algarvio foi tomada na primeira sessão do debate instrutório, pelo juiz do TCIC, que terá invocado o artigo nº120 do Código do Processo Penal, que estabelece que «a insuficiência do inquérito ou da instrução e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade».
Recorde-se que Isaltino Morais foi acusado de corrupção passiva, branqueamento de capitais, abuso de poder e fraude fiscal, num processo que envolve também um promotor imobiliário, um gestor e outros arguidos.
P.S. - Entretanto, a procuradora Leonor Furtado que dirigiu o inquérito - avocado pelo Mnistério Público - foi nomeada para o Instituto de Reinserção Social, organismo do Ministério da Justiça. (É apenas uma notazinha de rodapé, singela, de boa vontade, sem qualquer tipo de intenção a não ser uma pequena informação)
Publicado por Carlos 23:49:00
O que custa a perceber é que este entendimento, que, em abstracto, se afigura um evidente corolário do mais elementar direito de defesa, possa, em alguns casos, não ter sido perfilhado ou praticado por quem de direito.
Quando escreve "um evidente corolário do mais elementar direito de defesa, possa, em alguns casos, não ter sido perfilhado ou praticado por quem de direito."
Essa jurisprudência saiu agora por causa da nova redacção do artº 272 do C.P.P. que reza assim:
"Correndo Inquérito contra pessoa determinada, é obrigatório interrogá-la como arguido. Cessa a obrigatoriedade quando não for possível a notificação"
Contudo, na na versão do C.P.P. de 1987, tal redacção não existia. E durante anos a fio ninguém se lembrou de dizer que osa sagrados direitos dos arguidos andavam a ser prejudicados...nem o tribunal constitucional se lembrou disso.
Enfim, estas coisas têm o seu lado interessante mas convém perceber o contexto, a evolução legislativa e os diversos porquês.
Um ponto prévio: já aqui disse várias vezes que não me dedico (salvo raríssimas excepções) ao direito e processo penal, pelo que as minhas opiniões sobre essas matérias serão fruto mais do atrevimento que da sapiência...
Em todo o caso, tenho entendido que, em matéria de direito de defesa e garantia do contraditório em processo penal, devem prevalecer, sempre, as interpretações que se revelem mais conformes aos princípios constitucionais.
A essa luz, o que agora se dispõe no n. 1 do art. 272 do CPP é, como v/ gosta de referir, um “óbvio ululante”. Não se compreenderia que um cidadão - que se presume inocente – seja objecto de uma acusação com o “peso” de uma acusação criminal, formulada por uma magistratura que se deve reger pelo princípio da imparcialidade, sem ter sido ouvido - sendo tal viável - para se pronunciar sobre os factos que lhe são imputados. Com que grau de probabilidade e de imparcialidade pode ser formulada uma tal acusação?
Na minha perspectiva – e sempre s.m.o. que me venha a convencer do contrário - não há “contextualização” ou interpretação legal que possa ilidir, mesmo na ausência da norma do art. 272 do CPP, a evidente imperatividade de ser assegurado no inquérito o elementar direito de audiência do arguido, nessa qualidade.
Como diz, a actual redacção do art. 272 do CPP (que, salvo erro, já remonta a 1998) veio “facilitar” o entendimento vertido no aresto de uniformização do STJ. Anoto, porém, que, mesmo na sua vigência, tem havido entendimentos divergentes e que já antes da sua vigência havia jurisprudência no sentido de que, nestes casos, o inquérito estaria ferido de nulidade, embora se discutisse se careceria de ser arguida pelo interessado (v. o Ac. Rel. Évora de 13-5-1997, CJ, 1997, III, 282).
Em resumo e como disse acima, continuo a pensar que esta solução é “um evidente corolário do mais elementar direito de defesa” e custa-me sinceramente a conceber que, em alguns casos, uma magistratura com o estatuto do nosso MP proceda diferentemente (em especial face à actual redacção do n. 1 do art. 272 do CPP). Mas os especialistas melhor opinarão.