Como não podia deixar de ser
sexta-feira, dezembro 02, 2005
Miguel Sousa Tavares, no seu artigo fleuve de hoje, no Público( sem ligação), descobre a pólvora para a resolução do problema das escutas telefónicas reveladas ao público: capar a autonomia do MP! Nem mais.
E para arrazoar esta proposta arenga uma declaração de tomo:
" Nos últimos dias, tem sido crescente o número de casos em que o teor das escutas telefónicas feitas ao abrigo de um processo de investigação e supostamente validadas por um juiz acabaram "sopradas" para os jornais – sempre, sempre como não podia deixar de ser, por iniciativa dos que promoveram e realizaram as próprias escutas."
MST já sabe quem violou o segredo de justiça! Na sua investigação particular, feita de pressuposições certificadas pela própria presunção do seu saber específico, foram "como não podia deixar de ser", os que as promoveram! E vai de escrevê-lo livre e alegremente que o disparate ainda não paga imposto em Portugal, pelo que depois, logo se vê se alguém o paga . Para já, foram esses. E assim, fica já a sentença sumária: foram os que as promoveram, sem margem para dúvidas porque tal "não pode deixar de ser". Podia lá ser outra coisa! Um conceito de justiça original , este raciocínio redondo.
Depois, alcandora-se a justiceiro ainda mais sumário dos investigadores no nosso sistema jurídico- constitucional:
" Como também é fácil verificar , na maioria dos casos, as escutas acabam por não dar origem a qualquer acusação judicial ou a não conseguirem sustentá-la, funcionando a sua divulgação pública como uma forma de julgamento popular promovido pela magistratura e destinado a compensar, aos olhos da opinião pública, a total incompetência dos investigadores"!!
"Noutros casos ainda, a leitura do sentido das fugas de informação nesta matéria indicia claramente uma tentativa de coacção ou chantagem sobre o poder político."
Ora já vimos que para o cronista, indícios significam no seu particular sistema de justiça penal, certezas porque "tal não pode deixar de ser" e por isso, nada mais natural do que aplicar o seu próprio raciocínio enviesado e bacoco, e fazer aqui e agora, tipo juiz Roy Bean, um julgamento popular em que a acusação é ele quem a produz; a defesa fica amordaçada porque "tal não pode deixar de ser" e por isso a sentença vem logo a seguir , condenando-se como não pode deixar de ser, todos os magistrados como culpados de todas as violações de segredo de justiça!
E contudo, o que escreve a seguir desmente-o no próprio escrito:
Pergunta se não temos o direito de saber se continuamos a ter direito ao sigilo de correspondência, "salvo rigorosas excepções, a avaliar, antes e durante as escutas, por um juiz de instrução – e não como sucede, com horas e horas de escutas a acumularem-se nas mãos dos investigadores, sem que o juiz encontre tempo, dentro do prazo razoável de que fala a lei, para as validar ou mandar destruir."
Bastaria reflectir no que escreveu neste parágrafo, para deixar os outros no éter. Mas isso, é pedir de mais a um Roy Bean de pacotilha.
Para além destas anedotas avulsas, avulta ainda o aspecto mais grave e sinistro:
"Hoje, confrontado com a deriva antidemocrática a que conduziu a autonomia total do Ministério Público, prefiro o perigo de uma investigação criminal hierarquicamente subordinada aos poderes legítimamente eleito do que entregue aos próprios, sem orientação nem controlo democrático externo." Pronto! Acautela-ta, Vital Moreira! Temos constitucionalista à vista!
Dito por outras palavras, o que MST prefere abertamente agora é que uma investigação criminal possa ser devassada por um qualquer membro de um governo que "controle democraticamente o MP" !
Por exemplo, no caso Portucale onde aparentemente se envolveram personalidades políticas de relevo e um caso como o furacão nos bancos, um Ricardo Salgado, parente de MST, por via familiar, poderia assim ser oportunamente avisado do que se está a passar, com toda a legalidade de um "controlo democrático". E em casos de terrorismo e de abuso sexual de menores que envolvem suspeitos de alto coturno, o que sugere então MST?
Ora, apenas isto:
" Que houvesse um órgão independente, com membros designados pela Assembleia e pelo Presidente, a quem a PGR submeteria regularmente um relatório completo das escutas telefónicas e em curso, quem e porquê as tinha ordenado e com que resultados"! Nem mais!
Desse modo, por exemplo, teríamos escapado a conhecer ( não às conversas propriamente ditas, entenda-se...) a elevada linguagem de um dirigente partidário para quem o segredo de justiça é para evacuar pela porta dos fundos. Teríamos igualmente sido poupados a certos diálogos edificantes ente ilustres membros da maçonaria que se dedicam exclusivamente ao Bem e abominam certos metediços que cumprem escrupulosamente a lei. E são essas inconfidências que preocupam MST, não o problema que elas descobrem nem a podridão que elas tapam! E abomina, claro, em nome da democracia, ora essa! Porque MST é filho de democrata e assim foi baptizado. Por isso que ninguém duvide dos seus princípios democratas em que todos são iguais perante a lei!
Só desse modo, aliás e segundo MST, a democracia não correrá risco algum, porque para MST é infinitamente preferível que seja um ministro a avisar o suspeito do que este saber o que se passa pelos jornais, devido a um erro de um funcionário que deixou exarado num papel umas quaisquer buscas avulsas. Compreende-se a preocupação de MST. Muito parecida, aliás à do regime salazarista que até tinha normas de garantia para os funcionários públicos não poderem ser processados! E que mandava arquivar autos por causa dessa garantia adminsitrativa. Foi assim que os caos de Carlos Burnay e dos ballet Rose foram arquivados.
Foram-no porque como toda a gente sabe, o MP nessa altura tinha plena autonomia do Governo ou seja, no dizer de MST, era uma "hierarquia" subordinada a "poder legitimamente eleito". Proença de Carvalho defende o mesmo e Freitas do Amaral, talvez. Anda bem acompanhado, MST!
A autonomia do MP, no entanto e para quem se preocupa a sério com a democracia, é o garante para que todos os cidadãos possam confiar num sistema de justiça independente. Isso tem sido dito pelos penalistas. Sabe-se quem na Europa quer exactamente o que quer MST: Berlusconi, na Itália! Vá-se lá saber porquê! Será também porque "tal não pode deixar de ser "?!
Publicado por josé 15:12:00
Não houve a hipótese de não haver escuta?
Se fosse assim tão simples, já estaria resolvido.
V. sabe como se processa uma escuta num processo como esse?
1. Há uma denúncia. NO caso parece que partiu da Adminsitração Fiscal, no sentido de existirem suspeitas muito firmes de que alguns empresários utilizavam os serviços bancários para transferir dinheiro para paraísos fiscais. Estou a falar do que não sei directamente, e apenas presumo.
2.A denúncia, atenta a natureza do facto- branqueamento de capitais- tem que passar a ser investigada por quem tem competência legal para o fazer. A lei diz que é a PJ. Podia dizer que era o MP ajudado pela PJ. Mas não! Diz que é deferida à PJ a competência exclusiva para a tarefa de investigação.
3. A PJ, tendo em mãos o assunto, vai querer saber mais. COmo é possível saber se determinado empresários suspeito coloca dinheiro lá fora, em paraísos fiscais, com a ajuda do sistema bancário nacional?!
Investigando e a PJ recorre a escutas para tal. COmo o faz?
4. Propõe no processo, por escrito, ao magistrado do MP que seria útil fazer escutas a x,y,z telefones pertencentes a A,B,C. Explica melhor ou pior por que razão é útil. Geralmente são muito convincentes nesta tarefa e o magistrado que dirige o Inquérito mas ainda nem sequer sabe o que a PJ sabe, lá promove ao juiz de instrução que atenda o pedido urgente da PJ e que defira a escuta aos telefones x,y,z pertencentes a A,B,C.
5. COmo o papel da autorização do juiz em mão, as escutas são efectuadas aos telefones referidos e ficam a gravar toas as conversas recebidas e efectuadas desses telefones.
Durante dias, semanas, gravam-se horas e horas de paleio solto. É a PJ quem primeiro ouve estes telefonemas.
Se recolhe indícios importantes e é preciso fazer mais alguma coisa, por exemplo uma busca, vai comunicá-la ao MP que por sua vez a comunica ao juiz, no mesmo processo que acima apontei.
6. Durante todo este processo, a PJ pode ou não contactar com quem dirige o Inquérito, ou seja o MP. Geralmente náo contacta e fica-se assim umas semanas à espera de resultados.
Entretanto as escutas têm de ser transcritas e validadas pelo JUiz de instrução que as autorizou.
Se o MP dirige, quem deveria ser o responsável por esta triagem?!
Sabe quem é? O juiz! Tem algum sentido?
7. Depois de transcritas e conhecidas as conversas e o teor ficar nos autos, em segredo, o Magistrado pode saber alguma coisa, mas o inspector da PJ é de certeza quem sabe mais.
8. Pode acontecer nesta fase o seguinte: o inspector ou alguém que o acompanha ou até o magistrado, comentam com uma amigo dos copos, ou por simples vaidade que FUlano e SIcrano fizeram isto ou aquilo. É aqui que reside o perigo real de violação do segredo de justiça.
Aquele a quem foi dito, por sua vez diz a outrém que diz a outrém...
9. O número de pessoas envolvido nestes processos pode ser elevado, embora se possa restringir a poucas na sua fase inicial. ALiás, não é nesta fase que ocorrem as maiores violações do segredo, o que demonstra que o sistema tem virtualidades para funcionar correctamente.
10. As violações ocorrem logo que mais pessoas tomam conhecimento do teor das transcrições no processo.
Descobrir nesta fase quem violou o segredo de justiça, quando ele não se destina já a proteger as investigações reval-se impossível ou quase.
Logo quem come por tabela são os jornalistas. De facto são eles quem o viola flagrantemente ao dar comnhecimento público daquilo que náo deveria ser dado.
E resguardam-se no segredo profissional.
Por mim, o segredo de justiça devia nesta fase ser abolido.
Acabavam as vestes que se rasgam! Acabava a farsa de pedir responsabilidades ao PGR!
Acabava a hipocrisia que se vê: só querem que não se saiba os trastes que são...mas não se preocupam com a essência das coisas.
Assim, atirar à PGR o ónus da prova, negativo neste caso, das violações de segredo de justiça, redunda em justiça à Sousa Tavares: sumária e tipo Roy Bean.
Tudo bem, aceito que hoje seja tudo assim. Mas passe a ter um só responsável, do MP, sobre a escuta. Ou então, despeçam todos os envolvidos porque todos os envolvidos falharam na tarefa de guardar segredo.
Se me diz que isso é impossível ou que é preciso reunir 2/3 da assembleia...FECHE-SE!
Sobre o segredo de justiça tenho apenas a dizer, por agora, isto:
O segredo de justiça destina-se exclusivamente ( já sei que vai aparecer alguém a gritar aqui d´el rei que a honra das pessoas e patati patata) a proteger a investigação criminal. O crime está inserido num capítulo do C.Penal que se chama "crimes contra a realização da justiça". É punido com pena de prisão até 2 anos ou multa.
É um crime de caca, como se costuma dizer.
Fazer desse crime o mais hediondo de todos os crimes do código penal É UMA HIPOCRISIA que se utiliza para arremessar a quem interessa, servindo de pretexto qualquer coisa.
O MST de certeza que não sabe isto, porque se soubesse não escrevia as aleivosias que escreve que denotam interesses incomodados.
Assim, andar a fazer um escarcéu destes por causa de um crime que o legislador equiparou a um de condução sem carta, é pouco razoável e só se justifica por causa dos envolvidos serem notáveis que se julgam acima das leis e estranhma que haja um PGR que não se verga à sua(deles) importância presumida.
O MST e alguns outros alinham pelo lado que mais lhes convém: o dos señoritos, como seria de esperar, aliás.
Como já alguém aqui disse, nunca houve problemas com violações de segredo de justiça até aparecerem arguidos excelentíssimos que foram apanhados a falar com políticos conhecidos.
Claro que um político não é igual ao cidadão comum, como sejam um josé ou um tonibler.
Um político julga-se intitulado a uma consideração que ultrapassa a regra do Código Penal que atribui à difamação a pena de 6 meses de prisão ou multa...
Já tive esta conversa algures( 4ª república) e vejo que adiantou nada, caro tonibler...
Consigo. E já falo. Mas aqui sou advogado de defesa...de uma causa que parece perdida e por mérito dos jornalistas e demérito dos próprios envolvidos que não falam; não ouvem e não olham. São os tais macacos sábios, com toda a propriedade neste caso. Esta atitude é do mais irritante que há.
Mas quando leio o blog Sine Die, apesar de me recordar muito dessa atitude de macaco sábio, típica da magistratura mais conservadora, vejo que ainda há esperança.
Assim, a balança ainda está muito desequilibrda. Não precisa, por isso, de mais um peso para o lado errado.
Mas o que aqui escrevo não é a defesa de um corporativismo acéfalo, sem mais. É apenas tentar mostrar que a abordagem de alguns jornalistas tem sido pelo lado errado.
Acertem as agulhas e não me verão a tentar defender o indefensável...
Não me peça, porém, neste circunstancialismo, para deitar ainda mais achas para uma fogueira que já arde em chama solta, só para mostrar que também sei atacar.
Mas se os jornalistas acretarem no alvo certo, não serei eu quem lhes atira pedras nesta escrita...
O país que na Europa mais se aproxima desse sistema que enunciou é a Itália.
Mesmo com Berlusconi.
E se alguma coisa na política me faz pensar, é isso mesmo: o desprendimento partidário que advém do desinteresse pessoal em mandar e encher os bolsos,- os próprios ou do partido.
É por isso mesmo que os políticos( políticos, não necessariamente as pessoas em si) que mais detesto neste Portugal pós Abril, são Dias Loureiro, Ângelo Correia, Catroga,Jorge Coelho,A. Vitorino,Duarte Lima. Sintomaticamente, são todos amigos.
E so menciono esses porque são os quem de repente me ocorreram, porque há uma catréfia deles no PS e PSD.
Muitos. Demasiados. Todos anjinhos de coro que se lhes perguntarem acham indigno e ofensivo que se possa sequer desconfiar da sua incorruptibilidade e da sua poluição...
E na verdade, são todos incorruptos e impolutos. A lei ,de facto não chega para eles! Chegaria a ética, mas essa como dizia a impagável Teresa Guilherme "não dá de comer".
E devoristas é que mais há!
De repente, deram consigo impunes e prestigiados e resolveram ajudar os respectivos clubes. Atiraram-se aos que já têm cortes e prebendas e escribas pagos à linha, e aí o caldo entornou.
Agora, com ele entornado, e despidos na praça pública, aflitos tentam tapar as vergonhas com palavreado, o que não resulta, pois a asneira foi grossa e deixou mossas.
Talvez com o correr do tempo, e com adequada contrição o MP volte ater o prestígio que teve.
É que não estou a ver e custa-me muito pôr-me no seu lugar com tantas certezas...