A França vista de cá

Para se perceber melhor o sentimento que os acontecimentos de França despertam por cá, talvez valha a pena ler alguns blogs. Mais do que os jornais e media em geral, aí se escreve a opinião diversa do politicamente correcto que por vezes advém da pressa em escreve qualquer coisa.
Por exemplo, aqui, no 4R-Quarta República, pode ler-se a opinião de um sociólogo:
(...)"Como é natural, o que há de comum é a condenação da violência e da intolerância. Mas logo de seguida vêm as teses da integração e da inclusão social pelas palavras de Sampaio e Soares. Aquele fala da necessária “capacidade de integração”, este das políticas de “inclusão”. Nos dois a mesma raiz ideológica que atribui à desigualdade e à exclusão a legitimidade social da violência, transformando os réus em vítimas e passando um pano desculpabilizante sobre as acções dos amotinados. Nem sempre o conflito decorre da lógica estritamente social, das desigualdades e da exclusão, e este parece-me ser um dos casos mais evidentes."

Aqui, no Blasfémias, reaviva-se o fantasma de Maio de 68 , para alimentar obsessões:

"Há uma geração que cresceu politicamente embalada nas lendas gloriosas dos lutadores pela liberdade (!?) dos anos 60 do século passado. Que apreendeu a sua realidade nas letras das músicas de vanguarda, nos relatos mistificados do Maio de 68, em visões deturpadas da história e nas recordações das ocupações selvagens das Universidades onde alguns foram revolucionariamente recompensados com passagens administrativas.Muitos deles petrificaram para sempre o seu cérebro nesses míticos lugares. Ainda que se tenham tornado burgueses barrigudos e contagiosamente bocejantes, julgam-se cavaleiros andantes (sem Antero) sempre prontos a afrontar a autoridade e a desafiar o status quo.
Nunca o fazem, porém. Até porque eles são o actual status quo. Mas gostam de fingir para si próprios que não."


Aqui, no causa nossa, prima o simplismo da ideia feita, eventualmente correcta mas com correcção essencialmente política e que vai ser retomada pelo socialismo partidário:

É evidente que a prioridade é acabar rapidamente com a onda de violência e restabelecer a ordem e a segurança pública nas cidades francesas. Mas seria ilusório pensar que depois tudo pode ficar na mesma, com a prisão e condenação de algumas dezenas de responsáveis pelas destruições ocorridas. A situação de crise que os gravíssimos desacatos em Paris e noutras cidades francesas vieram evidenciar carece de respostas políticas de fundo que proporcionem uma esperança de vida decente e digna para todos os que habitam os subúrbios degradados por essa Europa fora. Quando Paris está a arder, convém lembrar que nem só ela é combustível...

Aqui, Do Portugal Profundo, contextualiza-se politicamente e descreve-se o fenómeno aculturado:
Racaille em verlan, a língua contraditória e sincrética da zone, dos jovens voyous. A escumalha dos vagabundos a limpar com o Kärcher de Sarko. Keufs contra keums. CRS brancos contra rebeus maghrebinos. A palavra república gasta de tanto ser usada para significar França em oposição ao Islão africano. Xenofobia de um lado e racismo do outro.Em rigor, é uma política que arde: o socialismo. O socialismo do Estado Social e o socialismo do politicamente correcto de François ex-Vichy Mitterrand e outros.

São estes os que me são dados ler, em estereofonia de vozes de opinião livre.
Há outros sítios, porventura mais interessantes e especulativos, mas este panorama acima exposto, chega para reflexão.
Ah! E a minha opinião, para quem interessar, é esta:

"A realidade da emigração dos anos sessenta em Portugal.
A meu ver, que conheci essa realidade pois nasci numa aldeia em que o fenómeno também se verificou e julgo poder tornar extensível de modo a formar uma petite téorie, a mon insu, quem emigrou de Portugal para a Paris da década de sessenta, por cá trabalhava por conta de outrém, nas mais diversas atividades: pedreiros ( que não eram livres, eram mesmo só pedreiros); carpinteiros; mecânicos; electricistas; empregados fabris. Essencialmente, actividades dedicadas à construção civil ou outras indiferenciadas, incluindo pequenos "caixeiros" como dantes se chamavam aos empregados de comércio.Foram sózinhos, ou em grupo. A "salto", e isto quer dizer, sem passaporte e com riscos de prisão, reais e palpáveis.Floresciam então os "engajadores" e os "passadores" que se reciclaram depois no contrabando raiano ou viraram taxistas refastelados.Por cá, em Portugal, cada notícia de abalo em grupo dava inquérito da Pide, com indagação directa e imediata junto do presidente da Junta de freguesia, para saber como foi possível e quem ajudou.Isto era real e foi presenciado por mim.Assim, os portugueses que abalavam estavm habituados por cá a uma vida de muito poucos privilégios.Trabalhavam num horário das 8 às 18, com uma hora e meia para almoço; trabalho ao Sábado ( a semana inglesa só surgiu nos anos setenta). Regalias sociais mínimas, se tanto. Assistência social reduzida e sem SMN ou vislumbre de apoio social digno desse nome.Havia Casas do Povo, que se foram construindo, com médico e enfermagem para atender os casos da aldeia. Funcionava bem. Os médicos ainda eram Joões Semana e as pessoas adoeciam menos e morriam mais.O salário era de miséria porque o PIB começava só então a crescer nas casas dos 5, 6%, mas a distribuição começava primeiro pela meia dúzia de famílias que agora mandam outra vez.O SOusa Tavares era da oposição e o filho, agora, é da família dos Salgados, Ricardos e Manuéis por ligações de casamentos e que então eram os tenentes das tais famílias.Os emigrantes, na Paris dos anos sessenta, não iam experimentar condições de vida concretas, mais duras do que já aqui experimentavam no dia a dia.As casas deles, por cá, eram tugúrios sem aquecimento que não o das lareiras a lenha; não tinham luz eléctrica numa boa parte dos casos e se tinham poupavam na conta; água corrente era uma miragem, pois vinha dos poços particulares e das fontes públicas. Os motores Rabor e Efacec qie tiravam a água dos poços, só se massificaram na produção anos mais tarde e foi por isso que um Narciso Miranda que experimentou bem este modo de viver e sabe muito bem como é, foi para a fábrica da Via Norte, trabalhar como operário qualificado.A comida também era pobre de variedades, mas rica em proteínas e sabores. Aí, provavelmente, os emigrantes perderam umas coisas e ganharam outras. Em vez do caldo de couves pela manhã, acompanhado a tijela de vinho, começaram a ganhar outros hábitos mais refinados, como o gosto pelo brie e pela baguette.O que encontraram em França, não foram residências HLM, pois era isso que eles iam para lá construir.Não encontraram quase nada e tiveram que se desenrascar em bidonvilles e em apartamentos baratos de de subúrbio, aos montes, como agora acontece com os imigrantes de leste, numa escala mais suave.Assim, o que tinham de útil e podiam dar e vender, era a força de trabalho. E nisso, foram melhores do que muitos. Tinham vontade, pois por cá também trabalhavam e por isso não viram novidade alguma, a não ser nos melhores salários e nas melhores condições de vida nos locais de trabalho.E tinham algo que era comum a todos: vinham de uma mesma civilização que ia à missa ao Domingo e obedecia a valores comuns pregados em comunidade.Franceses e portugueses, nisso, entendiam-se e só os separava a pobreza de uns em contraste com a afluência dos outros.Mas isso não é novidade, pois há disso em todo o lado e por cá também havia- como continua a haver.Assim, o paralelo a fazer entre a emigração portuguesa dos anos sessenta e os problemas actuais, têm um enquadramento e permitem perceber todo um mundo de diferença e também porque é que os portugueses se integraram e prosperaram e estes desgraçados árabes vegetam no isolamento social.Não há milagres na sociedade e tudo tem explicação."

Publicado por josé 12:18:00  

5 Comments:

  1. |..| said...
    Eu fui ao terreno ouvir as opiniões de quem lá vive, como é o caso do Manuel Alpiarça, 39 anos, residente em Clichy-sous-Bois e vendedor de rolamentos para montanhas russas
    Dr. Assur said...
    Há que retirar ilações dos distúrbios em França. Uma delas é que os "excluídos" moram em casas dadas pelo governo Francês, a maioria recebe pensões ao fim do mês. Tal como um dos bombistas suicidas ingleses. Logo não é por aqui que se extingue o problema, tal como pensam os "iluminados" deste cantinho à beira-mar plantado.

    Não esquecer que também os Portugueses foram para a França viver nesses "bairros de lata". Simplesmente foram para lá trabalhar e nem uma só caroça incendiaram, quanto mais carros. E na altura os franceses eram mais racistas porque não estavam habituados à imigração. Agora são dignos da vida que têm e ninguém os exclui.

    A realidade é bem outra. Estamos perante um universo de cultura específica e totalitarista, aonde as populações desintegradas (muitos por vontade própria) e desenraizadas não têm qualquer vontade de pertencerem ao mundo aonde vivem. Nessas condições são objecto fácil de aproveitamento por parte de grupos criminosos.

    Efectivamente a União Europeia e abertura das fronteiras é um total fracasso. Há que ser realista: os "bárbaros" estão dentro do "império".
    josé said...
    Tens razão, ó Kzar. Azar o teu que não vi antes.
    Mas vi agora e até citas o Miquelanxo Prado. Só por isso merecias uma agradecimento em forma de postal!
    xatoo said...
    Segundo uma testemunha luso-descendente “a polícia actuou, desde o início, de forma provocatória e a resposta não se fez esperar. Dizia ele que viu a polícia a invadir os bairros, com arrogância, fazendo barulho desmedido, (chegaram, claro, a atacar uma mesquita) o que teve como resposta, após a passagem da polícia, os actos de vandalismo”. Esta lógica de acção/reacção “espontânea” não colhe. A reacção foi instrumentalizada!
    Tal como na economia selvagem se conseguem resultados pela aplicação de impulsos de capital em pontos fulcrais, também na manipulação de massas e de grupos sociais a técnica é idêntica – Usa-se hábilmente o vandalismo e a violência para atingir a prossecução de interesses ocultos. No imediato os dividendos vão direitinhos para Sarkozi e para a extrema-direita que pretende retirar “Direitos Humanos” adquiridos a vastas camadas das classes médias, naquilo que é actualmente a politica assumida da Direita Europeia pela tentação autoritária. As próprias populações sentindo-se inseguras virão pedir a ditadura. É dos livros
    lobo mau said...
    opa eu já estive em França e integrei me perfeitamente,e muitas das vezes há pessoas que fazem asneiras e depois a sociedade olha de lado para toda uma raça,ou etnia ,sou de Amarante e até queria falar de uma caso de um emigrante que decidiu fazer um blog a falar mal das gentes de Amarante,sempre com ar de superioridade por ter tido a sorte de lhe correr bem a vida menospreza as gentes que brincaram com ele, e são essas pessoas que nos estragam a imagem no estrangeiro

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