O presidente do STJ
segunda-feira, outubro 03, 2005
Logo, na RTP/1, o programa Prós & Contras reincide na temática da Justiça.
A propósito das greves que se anunciam no sector, estão anunciados intervenientes de tomo: o ministro da Justiça e ainda o presidente do STJ, José Moura Nunes da Cruz, entre outros. Homem de quase 70 anos, prepara-se para concluir o mandato "herdado" de um outro juiz, parecido com ele no dizer e seu amigo, Aragão Seia, falecido há poucos meses.
Não é costume, nem é vulgar, um presidente do Supremo Tribunal de Justiça, quarta figura do nosso Estado, aparecer em público a falar sobre assuntos judiciários. Tirando uma entrevista ou outra, brevíssima, em jeito de comentário e a correr para um microfone que se lhes coloca, a propósito de uma cerimónia protocolar, um juiz do STJ, tem sempre pouco a dizer.E é pena.
Por isso, aguarda-se com expectativa acrescida o que hoje vai ser dito pelo presidente do STJ. Entretanto e como aperitivo, fica aqui um excerto de uma outra entrevista concedida ao Correio da Manhã na revista Domingo:
CM - Como é que se exercia a Magistratura no tempo da ditadura?
JMNC- Normalmente. Nunca tive problemas com a ditadura. Sempre fui muito independente.comentário: é óbvio que não é um juiz de "esquerda" e mesmo que o fosse, essa faceta nunca o afectou de molde a projectar o discurso contra o "fassismo".
CM- Mas era possível essa independência?
JMNC- Era. O facto de ser independente e de decidir sem a interferência de ninguém era a única vantagem. A única tentativa que o poder político poderia ter feito para nos ter na mão era aquilo que nos pagava. Tão mal, tão mal, que não podíamos recalcitrar. Além do mais, estas coisas passavam de comarca para comarca e quando lá chegávamos já sabiam que tipo de juiz iriam enfrentrar.
CM - Nas comarcas do interior o juiz é uma das personalidades mais importantes. Nas cidades, esse respeito está mais diluído.
JMNC - Há uma crise de valores actualmente em que as pessoas quase se não respeitam mutuamente. Na comarca éramos poucos, tínhamos uma posição de recato. Não andávamos em festas. A certa altura, a magistratura até foi acusada de se meter numa concha e de estar desfasada da realidade. Agora os juizes são diferentes. Quem é que se lembraria de vestir jeans? Gravata? Tenho a impressão de que nunca a tirei. Agora os mais novos tentam a parecer nos jornais e na televisão porque acham que é mais vantajoso para eles. Acho que o recato é muito bom.Comentário: é tão bom que a mensagem que está a passar para a oinião pública é a de os juizes serem uns privilegiados; trabalharem pouco e ganharem demais. O autismo em certas profissões pode não ser prejudicial. Noutras, é pecado mortal. The times they are a changin´, cantava Bob Dylan em 1964. Quantos anos teria o juiz Nunes da Cruz nessa altura? Pouco mais de trinta anos...e parece seguro que não ouviu a canção e muito menos a mensagem.
CM - Como é possível existirem decisões diferentes sobre a mesma questão?
JMNC - Há sempre um acórdão a dizer que sim e outro a dizer que não. Como sabe, o Direito não é uma ciência exacta. Ainda agora com o problema que está no Constitucional de saber se isto é uma nova Legislatura ou não, Marcelo Rebelo de Sousa defende que é e Jorge Miranda diz que não. E, no entanto, são dusa sumidades em Direito Constitucional. Muitas vezes, interpretar a lei é difícil. E nem todos interpretam da mesma maneira.Comentário: um Professor de Coimbra, Orlando de Carvalho, já falecido, dizia em entrevista ao Público, há uns anos, que "o Direito é uma aldrabice secante". O motivo está à vista...
CM - De certeza que mediatismo e aparência não interferem no resto ? As decisões dos juizes correspondem a certezas absolutas?
JMNC- Nunca condenei com dúvidas, nem tive dúvidas depois de uma condenação. Nunca se me pôs esse problema, mas pôs-se imensas vezes quando absolvia. É como diz o outro: "os juizez vão para o inferno, mas no mínimo vão cavalgando as testemunhas". Foram as testemunhas que os induziram, de maneira que temos cavalos para ir para o inferno. Isto para dizer que temos de ter bem a noção de que a dúvida tem de ser fundada. Não pode ser por comodismo.Comentário: julgar é muito difícil. Mesmo. E quem não entende isso, acha que os magistrados são uns calaceiros e uns malandros comuns. Os nomes dos vilipendiadores? São legião, mas à frente, com a bandeira da ignomínia desfraldada no jornal onde escrevem vão um tal Sousa Tavares e um tal Marinho e Pinto. E um Vital Moreira parece apoiar a bravata.
Publicado por josé 19:36:00
Ler os comentários como um julgamento enviesado, só mesmo para quem não lê o que outros lêem...e o que lá está escrito.
Com o que se pode apelidar de "Right stuff", traduzido na preocupação em não condenar inocentes nem absolver culpados e com a preocupação também do rigor matemático na aplicação do Direito, corrigido pelas equações da vida. Mas, como ele mesmo diz, o Direito é o que se quiser que seja...
E ainda diz que um juiz deve ser recatado. Pois esse recato, digo eu, custou só e apenas aquilo que agora se passa: a incompreensão do "público". E nosso critico e estou frontalmente em desacordo. Há que escolher um meio termo entre a posição de recato própria a quem decide pleitos com independência e a explicação das decisões em português plano e principalmente em lógica serena e justa e que não se confunda com as batatas.
E o último comentário que fiz, quer dizer mesmo o que lá está: que é difícil julgar e aplicar a Justiça.
Se for Justiça- e que significa dar a cada um aquilo que lhe pertence.
Sempre pensei não deixar equívocos naquilo qu escrevi, mas enganei-me.
Erro meu.
DO poder político, outra vez?!!
Fique descansado...
Anónimo das 9:34
O deficit comunicacional da Justiça é um dos seus principais problemas de hoje.
Quanto à necessidade de fundamentação das sentenças e acórdãos, de acordo. Mas, mais uma vez, pergunto: quem percebe os médicos quando fazem um diagnóstico? Quem percebe os economistas quando falam de macroeconomia? No direito, passa-se o mesmo; há uma linguagem necessariamente técnica que não está ao alcance dos leigos. Por muito que se tente, quem não percebe o que são presunções ilidíveis, boa fé subjectiva, obrigações genéricas, ilícitos extracontratuais, crimes de mera conduta, tipos legais, dificilmente percebe um acórdão. A um juiz exige-se uma boa fundamentação jurídica e uma escrita clara e concisa; mais não é possível exigir.