Emigrantes da quarta dimensão

(Carta a J.C.)

Dá-me uma ajuda, ó médico das almas
Para escolher em que combate combater
Quem condeno eu à vida
Quem condeno eu à morte
Que me podes tu dizer

Encostado à árvore do tempo
Folhas mortas, folhas vivas, estações
Nada disto faz sentido
E o sentido do sentido não paga as refeições

Este torpor só tem uma solução
Sejamos deuses, é meter as mãos à obra
E no fazendo acontecendo
Deixar ir o coração
Que é o que nos sobra

Ao fazer-se o mundo nas de si próprio
Ser avó é uma alegria atravessada
Dá para rir e p’ra chorar
Não temos nada com isso
E nada não é nada

Disseste um dia que tudo vale a pena
Tornar as almas mais pequenas é que não
Vamos sobre as duas patas
Juntar as partes da antena
Espalhadas pelo chão

Fecha a porta que vem frio lá de fora
Diz o coxo ao despernado, e eu aqui
Fui à procura de mim
Encontrei-me mesmo agora
E ainda não fugi

O tempo corre entre pívias e manhas
E tudo fica cada vez mais como está
Mas ao correr desta pena
Não fico à espera que venhas
Eu já sou o que virá

José Mário Branco

Publicado por contra-baixo 15:37:00  

4 Comments:

  1. Anónimo said...
    Papagaio nonó se fue en buena hora....!
    Anónimo said...
    Where is papagaio nonó?
    Anónimo said...
    O papagaio - que nem é socialista nem tão pouco votou no PS - como é um muito responsável cidadão, está em periodo de reflexão para as eleições autárquicas de amanhã.
    Anónimo said...
    A semana passada, Paul Auster. Esta semana, José Mário Branco. Alguém está mesmo muito perdido

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