Cântico Negro
sexta-feira, setembro 16, 2005
"Vem por aqui" --- dizem-me alguns com olhos doces,
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom se eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui"!
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos meus olhos, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
--- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre a minha mãe.
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde,
Por que me repetis: "vem por aqui"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.
Como, pois, sereis vós
Que me dareis machados, ferramentas, e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?
...Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...
Ide! tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátrias, tendes tectos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios.
Eu tenho a minha Loucura!
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que me guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.
Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou,
--- Sei que não vou por aí.
José Régio
Publicado por contra-baixo 23:09:00
9 Comments:
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Obrigado Régio (Viva Vila do Conde e Portalegre...!).
Quem viu o debate na AR de ontem ficou com a ideia de que vamos ter mais uma grande reforma, desta vez sobre a regulação da comunicação social. Embora eu não seja muito adepto de leis sobre este tema, noto que pelo menos há a intenção nesta reforma de garantir o pluralismo e de garantir os direitos dos ouvintes de rádio e espectadores da televisão, com a criação de provedores. Parece haver consenso entre todos os partidos sobre as propostas do governo. Ao menos isso. É impressionante o carácter reformista deste governo. Pode perder as eleições por isso mesmo, mas presta grandes serviços ao país.
Força Sócrates! Vai por aí que vais bem!
E manda à outra banda quem não vai por aí, porque não é capaz de ir por aí nem por lado nenhum.
O Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, José Mariano Gago, assinou hoje em Seul com o ministro da Informação e Comunicações da Coreia do Sul, Chin Dae-je, um Memorando de Entendimento visando o reforço da cooperação bilateral no domínio das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC).
Lisboa e Seul reconhecem nas TIC potencial para a promoção das trocas comerciais e capacidade para catalisar o desenvolvimento económico e social dos dois países no século XXI.
Ambas as partes decidiram encorajar o desenvolvimento da cooperação entre empresas, instituições de investigação e de ensino, bem como entre agências governamentais e outras organizações, refere o texto do Memorando.
Portugal e a Coreia do Sul identificaram como áreas de cooperação e interesse mútuo as relacionadas com políticas e regulamentação na área da sociedade da informação, banda larga, Internet, comunicações sem fios e recursos humanos no sector das TIC, entre outras.
A cooperação agora encetada prevê o desenvolvimento de projectos conjuntos e as trocas e visitas de pessoal científico e peritos dos dois países e a realização conjunta de exposições temáticas e conferências.
O Memorando vigora a partir de hoje e por cinco anos, estabelecendo que o seu termo não afectará as actividades de cooperação em curso.
Basta ver todos os indicadores de relevo sobre este país: Negativos e atrás dos restantes países europeus.
Aprofundou-se o já existente fosso entre ricos e pobres.
Vai por aí, vai...
que a palavra amadureça
e se desprenda como um fruto
ao passar o vento que a mereça."
Eugénio de Andrade
" Não bebas vinho - dizem-me alguns com olhos abstémios,
Retirando-me os copos, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "não bebas vinho"!
Eu olho-os com olhos bêbados,
(Há nos meus olhos ironia e mágoa)
E enxugo mais um copo,
E nunca bebo água.
A minha glória é esta:
Sem a botija cheia,
Não acompanhar ninguém!
- Que eu bebo vinho com o mesmo à vontade
Com que um menino chupa o leite a sua mãe.
Não,não vou por aí!Só vou por onde
Haja tascas no caminho...
Se quando a conta vem meu bolso é que responde,
Porque me repetis:"Não bebas vinho"?
Prefiro ir esbarrar nos guardas sonolentos
Sentir que sou levado pelos ventos,
Redemoinhar em volta dos postes macilentos,
A não beber vinho...
Se vim ao mundo, foi
Só para esvaziar canecas cheias,
E para lavar os pés tenho a água reservada
O mais que faço não vale nada.
Como, pois, sereis vós
Que me fareis discursos, rogos e promessas
Querendo entre mim e os copos pôr obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho e capilé
E vós amais o que não tem sabor!
Eu amo o Aveleda, o Colares, o Cartaxo,
Só no verde e no tinto ponho fé
Só ao branco e ao maduro tenho amor
Ide, tendes laranjadas,
Tendes sumos, tendes cocas,
Tendes Vidago, Pedras Salgadas
E outras águas " boas " gabadas pelos sábios...
-Eu tenho a minha alegre bebedeira!
Levanto-a como um facho ou uma bandeira,
E sinto espuma,e vinho, e cânticos nos lábios...
O Copo e a Garrafa é que me guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai todos tiveram mãe
Mas eu, a quem beber jamais estafa
Nasci do amor que há entre o copo e a garrafa.
Ah, que ninguém me dê água de Luso em garrafões!
Ninguém me ofereça pingos ou galões
Ninguém me diga:"Não bebas vinho"!
A minha vida é uma rolha que saltou
É uma garrafa que se esvaziou,
É um copinho a mais que me animou..
Não sei por onde vou
Não sei para onde vou,
O que não vou é sem vinho!
J.M. Matos Vila
Que tens de humano o gesto e o
Desce cá ao profundo Portugalu
E agarra-me cá com...
Geito
Poeta anónimo do Sec AC XX1
Eu não sei para onde vou...