uma questão de estilo

As coisas são o que são, berra-se, e torna-se a berrar, bem, sobre o distanciamento entre eleitores e eleitos (a classe política), exige-se accountability e transparência, sempre, e no decorrer dos últimos anos ganharam cada vez mais protagonismo e visibilidade os jornalistas - proclamados guardiões da Verdade. Seriam eles, os jornalistas, que fariam a ponte, entre uns e outros, seriam eles que derrubariam os muros, mas nem sempre vai sendo assim. Alguns veem-se, como (os) políticos, como uma casta à parte, etérea, inimputável e impassível de responsabilização. Não há interactividade, eles é que sabem, eles é que definem, o que é Verdade e o que não, os factos, um pequeno detalhe. Muito mau para a classe, e pior ainda para a democracia.

Atente-se num caso. Um jornal, de referência, que publica, na passada sexta-feira, uma manchete, "ligeiramente", desligada do texto, e que imputava (mal) a determinada entidade, fundamental num estado de direito, responsabilidades num alegado atraso (de 16 anos) em determinada tomada de posição. O caso é denunciado, é debatido, na blogosfera, e rapidamente se chega a um consenso, inclusive com quem assinava a prosa, de que a manchete é infeliz e enganadora. Faz amanhã uma semana, saiu a tal manchete original. Hoje foi publicado, naturalmente sem o destaque original, o desmentido da "vítima"... a Procuradoria Geral da República. Era escusado, teria bastado, a tempo e horas, um pouco de humildade e um esclarecimento clarificador de quem... errou.

Nada substituirá a imprensa. Será sempre preciso uma informação mediada, que não imediata e a quente, e ponderada, mas quando se olha para o descrédito de que goza a classe política, e os jornalistas já são vistos muitas vezes como polícos ou quase, quando já nada vale pelo seu valor facial, quando se desconfia da veracidade de tudo, ou quase, temos que concluir que algo vai mal. E vai mal porque as pessoas, e as sociedades, tem o direito a ser bem informadas, de saber os factos todos, e não apenas alguns (quando não truncados). É pedir assim tanto ? Ou a Verdade é apenas e só uma questão de estilo ?

Publicado por Manuel 12:25:00  

4 Comments:

  1. josé said...
    A questão é suficientemente grave para deixar passar em claro.

    Na pág.11 do Público de hoje, publica-se o "Esclarecimento do porcurador-geral da República".
    Assim, a modos de uma carta ao director mais sofisticada.
    A carta, assinada, é publicada na íntegra e nada mais se diz.
    Nem uma palavra sobre a asneira grossa que o título na primeira página constitui.Nem uma palavra sobre quem fez esse título e que confessadamente ( pela própria jornalista que elaborou a notícia) não foi quem assinou a notícia e com o qual a mesma, placidamente, não concorda, mas achará que está tudo bem assim.
    Até o carteiro que colabora no Incrusões e já foi jornalista, acha que isto foi um "erro formal"!

    A notícia no seu âmago mais importante, vem no título e o objectivo de quem o fez é inequívoco: imputar à PGR um atraso de 16 anos num assunto particular que envolve um inspector ( sê-lo-ia já nessa altura?!).

    Não há um pedido de desculpas na primeira página e assinado por quem fez o título que aliás nem se sabe quem foi...
    Não há uma referência única, um pequeno editorial, um acrescento a seguir ao "esclarecimento"! Nada de nada!

    Os jornalistas fazem o que querem?! Parece bem que sim.
    Podem gratuitamente ofender uma instituição importante da democracia, impunemente e sem grandes preocupações.Quem se sentir mal que se mexa, parece ser o mote de estilo.
    Podem de um dia para o outro insistirem em desinformar que no pasa nada! No pasa nada é a expressão!
    Irresponsabilidade completa, se atendermos a este caso concreto.

    Eppure...no Livro de Estilo do Público, diz-se:

    "O PÚBLICO publicará Notas de Redacção, replicando às versões ou comentários abrangidos pelo direito de resposta, só quando estiver em causa a verdade dos factos ou acusações à boa-fé do jornalista."

    "Nenhuma notícia deve sair a público sem a devida confirmação e absoluta confiança na fonte de origem. Mas, em caso de erro, o jornal retractar-se-á imediatamente. Qualquer imprecisão deverá ser prontamente corrigida. Nunca esquecer uma velha máxima do jornalismo: "O melhor que pode acontecer a um jornalista é dar uma notícia em primeira mão; o pior é ser desmentido pelos factos."

    E quanto a boas intenções, elas não faltam no Livro de Estilo...
    Por exemplo:

    "Incorrer em falsidades ou no sensacionalismo, manipular, deturpar ou silenciar informações, cair no tendenciosismo e na distorção dos acontecimentos, noticiar meras especulações como se fossem factos, desacreditam um jornal e desqualificam quem o pratica."

    "Depois de escreverem as suas peças, os jornalistas devem sempre colocar a si próprios esta pergunta clássica da maior parte dos manuais da profissão: "Fui tão rigoroso quanto me era possível?"

    "A honra, a dignidade e a reputação de pessoas individuais e colectivas devem ser escrupulosamente respeitadas nas páginas do PÚBLICO. Todos os temas que envolvam aspectos desta natureza reclamam previamente uma investigação própria muito cuidada, prudente e imparcial. Está em causa, no mínimo, o direito à imagem de pessoas individuais ou colectivas."

    "Normas práticas:

    a. Qualquer informação desfavorável a uma pessoa ou entidade obriga a que se oiça sempre "o outro lado" em pé de igualdade. Só em casos excepcionais, e após autorização da Direcção, se pode contrariar o princípio da equidade."

    "O PÚBLICO não pretende ter o dom da infalibilidade, mas reclama dos seus jornalistas o menor número de erros e imprecisões. E a credibilidade do jornal jogar-se-á tanto na qualidade da sua informação como no saber corrigir as suas próprias falhas — pronta e adequadamente. O direito de resposta e uma relação transparente com os demais órgãos de comunicação social são igualmente normas de um jornal sério e credível."


    Sobre a ética e deontologia de alguns jornalistas do Público, neste caso concreto, estamos conversados.

    Acham que chega a cartinha do prourador-geral, numa página interior e sem mais?

    Acabou a secção "O Público errou"?
    Repristinem-na!
    josé said...
    Tânia:

    Porque não a faz V. mesmo?!
    Como saberá de que caso se trata, poderia começar pelo...princípio!

    COmo foi o acidente; como se desenvolveu depois a acçáo pelos tribunais; como foi instruido o processo: se foi em sede administratica ou nos tribunais propriamente ditos; porque razão demorou tanto tempo a chegar-se a uma conclusão que apenas constará de um parecer que carecerá ainda de homoloção; como parou o ou os processos e por que razões concretas; quem interveio, que tribunais; que instituições etc.

    Estou certo que a radiografia do
    caso serviria para esclarecimento de muita gente sobre o funcionamento do sistema da justiça que vai muito além da PGR e muito alêm dos tribunais até.

    Em meia página de jornal, se tanto, chegaria a uma notícia impecável se conseguisse lá chegar!
    Duvido é que a direcção do Público vá na conversa...
    josé said...
    Mas estou certo que esta Loja e o Manuel em particular, poria a notíca em primeira página, mesmo que não viesse publicada no Público?

    Quer tentar?!
    Manuel said...
    Ó Tânia, olhe bem para o que escreveu!

    O kilo não é igual ao litro, a PGR não é igual ao Ministério da Justiça, nem é todo o sistema ou é ?

    SE é verdade que é lamentável que alguém espere 16 anos por uma decisão, e é, também o não é menos que as culpas não podem ser imputadas à sorte à primeira entidade que aparece (e no caso à que menos culpas teve) à frente.


    Se você quer genuinamente (ajudar a) consertar as coisas há-de concordar que o rigor é fundamental, quer quando se louva quer quando se critica, e aqui o rigor faltou, porque as coisas nunca são todas iguais. Que o polícia se esteja marimbando para saber de quem foi a culpa acredito, mas você é jornalista, caramba !

    Registo finalmente que reconhece que a PGR foi beliscada. Continuo à espera do pedido de desculpas, até porque não o fazendo Vocês perdem toda e qualquer legitimidade, que até tinham, para exigir retratações à PGR, e a quem actua em seu nome, quando da parte dela se "caçam" jornalistas também ao molho... you know what i'm talking about :)

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