As medidas e as ideias

O regresso de Alberto Pinto Nogueira, com um postal endereçado a uma certa morada, na Praça do Comércio.


O Sr.Ministro da Justiça, com a pompa própria de quem enuncia uma medida fundamental para debelar a morosidade da Justiça, e seguindo a proclamação na Assembleia da República do próprio Primeiro Ministro, decretou, por resolução do Conselho de Ministros, a redução das férias judicias.

As estruturas sindicais das magistraturas desenterraram o machado de guerra já que, publicitaram, as férias se destinavam sobretudo ao estudo de processos complexos e a pôr em dia o que não fora possível pôr-se.

O Ministro, que é o poder, pecou pela arrogância, imprópria na democracia, pelo populismo fácil e, no fundo, pretendeu, e talvez tenha conseguido, descredibilizar ainda mais a Judicatura e o Ministério Público.

Estes embarcaram no bote, não foram capazes de aceitar, com humildade, que as férias judiciais, tal como estão, são, pelo menos aparentemente, um privilégio, algo que, como tal, se não pode aceitar em democracia. Despeitados, manifestaram-se impotentes para, publicamente, demonstrar que a redução das férias judiciais está para a redução da morosidade da Justiça, como a venda de aspirinas nos hipermercados está para a melhor saúde dos cidadãos.

Com estas e outras, já toda a gente percebeu que o Ministro da Justiça empochou toda a formação marxista que apregoava, aliás com brilho, quando gastava os fundilhos das calças nos bancos da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

Alberto Costa tem tácticas, medidas, falecem-lhe, sem dúvida, ideias que constituem a estratégia. Dá guarida ao choradinho gasto da falta de meios, ao invés de traduzir uma melhor gestão dos que tem e existem, sem ser capaz de os enquadrar melhor ao serviço de uma política que sirva a administração da Justiça .

O Ministro parece que não percebeu, ou não percebeu mesmo, que pode tomar muitas medidas concretas, mesmo que seja o “arranjo” da substituição do procurador-geral da República. Todavia, mesmo com todas as medidas, se estas não obedecerem a um plano rigoroso e bem delineado, a uma estratégia, o ministro pode reduzir as férias, criar mais vinte ou cem lugares de juízes, substituir os dirigentes da Polícia Judiciária e por aí além. Ao cabo de algum tempo, tudo estacionará, como sempre tem estacionado, por falta de visão política, por carência de ideias. Mudar implica determinar para onde se quer ir e para fazer o quê. O Ministro quer fazer o mesmo, mas mais depressinha. Em boa verdade, a actual equipa do Ministério da Justiça faz lembrar aqueles autarcas que tapam buracos nas vésperas de actos eleitorais, buracos que, em vindo o Inverno, ficam de novo às escâncaras.

E se, com estes, se poderá complacentemente abanar a cabeça, já tanto se não pode fazer quando se trata de um Ministro da República.

Deste se espera, e exige, que defina com rigor, firmeza, e também clareza, as grandes linhas de certo sector da vida social.

E que deixe as mercearias para os burocratas do respectivo ministério.

É nas grandes linhas, nos objectivos, numa palavra, na estratégia, que o ministro naufraga porque a não tem.

Alberto Costa, completamente desenquadrado do lugar onde o meteram, sem políticas que se vejam para Justiça, desprovido de ideias, deveria dar lugar a outro, que alguns haverá, concede-se, mesmo nas catacumbas do partido a que pertence.

Que venha, mas com ideias. Com programa. Com política.

Alberto Pinto Nogueira

Publicado por josé 22:52:00  

6 Comments:

  1. Anónimo said...
    Ainda bem que o temos de volta! E, não é nada, não é nada, mas dá gosto lê-lo. Os votos de sempre, de que continue!
    gabriela
    Anónimo said...
    caro colega,

    Simplesmente BRILHANTE, como sempre aliás.
    Anónimo said...
    notável pela lucidez, pela capacidade de sintese. os clunys desta terra ainda tem muito a apreender.
    Anónimo said...
    Isto é o que se chama dar uma no cravo e outra na ferradura. E ainda por cima ter razão!
    Anónimo said...
    É interessante ver como a matilha ladra em uníssono. Tanto parlapié para não conseguir explicar porque - madona! - estes funcionários têm 80 dias de férias enquanto eu, também funcionário, tenho vinte e tal. E depois chamam a isso "demagogia". Mas esquecem que quem vos paga somos nós, o povo. Vão mas é trabalhar, malandros! E se não estiverem contentes, podem mudar de profissão, que há muita gente em Portugal com vontade de trabalhar, especialmente pelos salários chorudos que vocês recebem.
    Anónimo said...
    Pois é claro que tem razão o último anónimo. A "malta" se não insulta e injuria não fica bem. è do "povo".

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