Adeus, camaradas!

Morreu Álvaro Cunhal, nonagenário. Fez obra, deixou obra, inspirou pessoas e "colectivos" e nos dias que se seguem, muita gente falará, escreverá e debitará as suas opiniões sobre a figura pública e privada do falecido que foi camarada de alguns líder de outros e adversário de muitos.
Não deixa indiferença, na sua partida.
Situo-me entre os adversários, desde sempre. Tirando esta declaração de interesses, como muita gente, não conheci a pessoa privada, mas conheci os dizeres públicos e as declarações e discursos em toada coerente e constante.
Sobre isso, muito foi dito e escrito e tem interesse para polémicas com alta dose de esterilidade, aproveitando-se geralmente a oportunidade para ginasticar ideias e argumentos.
Conheço um antigo camarada de luta clandestina, que foi próximo de Álvaro Cunhal e que participou activamente na fuga deste, de Peniche.
Vive recluso, algures numa aldeia do Minho e é um indivíduo notável, pela cultura verdadeira, pela afabilidade e sensibilidade e pela fidelidade e coerência aos princípios ideológicos que tal como o líder agora falecido, nunca abandonou.
É médico e chama-se Plácido e nada mais direi sobre o homem.
O que conta e fala dos tempos de clandestinidade, chega para se perceber o clima particular em que viveram os dirigentes clandestinos do PCP e é o suficiente para perceber que era um clube fechado, restrito a uns quantos e que moldou para sempre o espírito e a personalidade dos seus membros de dicados à causa.

Nesse clube, havia os "nós" e os "eles"; os camaradas e os fascistas e tal dicotomia vinha já do tempo anterios à grande guerra contra o fascismo.
Em Portugal, criaram uma cultura própria, ligada a pessoas e movimentos clandestinos e enraizada nas leituras da bíblia marxista-leninista e autores seguidores e propagandistas da fé.
Há uma linguagem própria, entre os prosélitos, cuja descodificação cada vez se torna mais difícil aos profanos e que morrerá fatalmente com o "desaparecimento físico" que a "lei da vida" imporá naturalmente.
Nesse clube, restrito qb, cabem essencialmente os camaradas ateus e alguns de fundo religioso. Percebe-se tal coexistência pacífica, porque existe alguma compatibilidade: o modo de organização do sanctum sanctorum é idêntico e os segredos da fé partilham-se em segredo tácito.
Provavelmente, será esse o único modo de entender a constância e a coerência na crença num mundo melhor, feito sob receitas antigas e perdidas e que sempre que se tentaram aplicar desvirtuaram o cardápio.
Não obstante as evidências de que essas receitas estragam as iguarias prometidas, continua a haver quem acredita na sua bondade intrínseca e quem nunca tenha abandonado a fé nas virtualidades das vitualhas imaginadas.
O falecido Álvaro Cunhal era um deles, como o é o seu camarada de partido, a quem me referi. O romantismo e o idealismo nunca morrem quando a fé é de nascença.
E entre esse romantismo avulta também o da homenagem aos adversários ideológicos. É por isso que aqui planto o clebrado poema do autor de Aimer a perdre la raison - Jean Ferrat - Camarade, com a música que recomendo.

C'est un joli nom Camarade
C'est un joli nom tu sais
Qui marie cerise et grenade
Aux cent fleurs du mois de mai
Pendant des années Camarade
Pendant des années tu sais
Avec ton seul nom comme aubade
Les lèvres s'épanouissaient
Camarade Camarade
C'est un nom terrible Camarade
C'est un nom terrible à dire
Quand, le temps d'une mascarade
Il ne fait plus que frémir
Que venez-vous faire Camarade
Que venez-vous faire ici
Ce fut à cinq heures dans Prague
Que le mois d'août s'obscurcit
Camarade Camarade
C'est un joli nom Camarade
C'est un joli nom tu sais
Dans mon cœur battant la chamade
Pour qu'il revive à jamais
Se marient cerise et grenade
Aux cent fleurs du mois de mai

Publicado por josé 09:20:00  

9 Comments:

  1. Anónimo said...
    Excelente homenagem.
    Anónimo said...
    Muito brilhante essa homenagem!
    Mas pregunto esses idealistas do comunismo, o que fizeram eles às classes operarias, que serviram, para ser seus escravos e sacrificados a ideias, loucas, mesmo quando já se conhecia a lucura de Lenine, Estaline e todos
    os gulags que utilizaram? a pide
    foi uma brincadeira, que serviu, para um canalha como o Cunhal denunciar os seus camaras que lhe faziam frente às suas diabólicas ideias. Afinal o que fica do comunismo em PortugaL? NADA..
    Anónimo said...
    Sem vergonha.
    Este blogue e muitos outros teriam liberdade vigiada ou talvez não existissem caso Àlvaro Cunhal tivesse chegado onde queria...

    Lucklucky
    josé said...
    Nesse caso, caro Lucky Luke, estaria no "maquis" a combater na clandestinidade...os camaradas.
    E continuaria a cantar a canção de Jean Ferrat que era comunista e que ninguém conhece. Nesse caso, conheceriam...como conheceriam por exemplo Patxi Andion ou dariam importância a Luís Cília e a José Mário Branco, José Afonso e outros e... não dão!
    A arte dos sons ou da literatura ou da pintura, não devia pertencer a nenhum clube ideológico.
    O PCP e outros, como é óbvio, náo pensam assim, até porque defendem a arte ao serviço do povo, com as particularidades que conduziram à destruição de movimentos artísticos importantes, na Rússia e URSS.

    Então residirá aqui alguma contradição?!
    Talvez. Mas só existe porque há um factor que me leva a esquecer as fronteiras ideológicas: art for art´s sake!

    No caso da homenagem ao Álvaro Cunhal, apesar de saber que se pudesse faria deste país um canto de miséria, lutou como ninguém para fazer valer as propostas marxistas leninistas estalinistas. Todas erradas na sua praxis, o que está demonstrado desde 1989, pelo menos e para os mais cépticos.

    Mas, para além disso, há que reconhecer a ética guerreira que manda respeitar os adversários de respeito.
    É por isso que se organizou uma série de regras para a guerra, em Genebra e se Hitler tivesse sobrevidio, teria sido julgado segundo essas regras que ele próprio não respeitava.

    Isto, porém, torna-se de difícil compreensão para quem não entenda essa ética guerreira e no caso de Álvaro Cunhal, a homenagem tem esses contornos. Não tema a figura de romagem saudosista à ideologia morta. Tem apenas a imagem de um reconhecimento de alguém que lutou por um ideal de tal modo que muitos milhares de portugueses tão inteligentes como qualquer um de nós, continuam a acreditar que o sal da terra estava na URSS e a luz do mundo refulgia do leste da Europa.
    Ainda hoje acrecitam nisso e tal crença em muito se fica a dever á atitude e personalidade de Álvaro Cunhal.
    Daí o meu respeito. Sem esquecer tudo o resto, porém...
    Anónimo said...
    Discordo do modo como o fizeste, qualquer criança que lesse o teu texto
    seria enganada. Aconteceu comigo. As homenagens, as críticas ou a sua falta são sinais para o futuro porque nem todos conhecemos a História e a democracia nunca está segura.

    lucklucky
    Anónimo said...
    eu ainda gostava de saber o que é que esse individuo fez pelo nosso país. viu a revoluçao na tv la em frança? os verdadeiros herois foram os militares e nao esses parasitas oportunistas como o cunhal e o soares que so voltaram para apoderarem-se deste pedaço de terra à beira-mar plantado. e nao falem so no 25 de abril e no tempo que ele passou na prisao, falem tambem do 25 de novembro e das sedes do partido que os comunas queimavam para vitimizarem-se.
    josé said...
    lucklucky:

    Aqui, em princípio, não escrevo para crianças lerem. Contudo, a percepção daquilo que escrevo, talvez fique melhor com a transcrição de um texto que escrevi no blog Incursões.
    Aí, escreveu-se sobre o texto poético de Eugénio de Andrade ( outro comunista) e a interpretaçáo das palavras e eu comentei:

    "Foi por isso, exactamente, que coloquei mais abaixo o poema de Jean Ferrat, "Camarade".
    Por causa das palavras e do som delas a cantar, na voz do autor: "c´est un joli nom, camarade".
    Nada tem a ver com a ideologia ou com o clubismo político. A poesia das palavras ditas ou cantadas, entretém-se no seu próprio significado e passa além, ao assumir ressonâncias particulares.
    Logo de manhã, ao ligar ( acordar) ao som da TSF e da notícia funesta, acorrreu-me o nome "camarada" e a canção de Jean Ferrat.
    A minha homenagem é por isso, musical e de palavra precisa que tem significado próprio para quem o foi.
    Eu não fui, mas aproprio a palavra para homenagear através do som, um idealismo que sendo estranho à minha opção política, não me é estranho no romantismo que comporta.
    Estou certo que isto também será uma acepção de poesia."

    Torna-se difícil transmitir certas ideias, às vezes.
    Anónimo said...
    A este bloge deveria chamar-se Loja dos Grande Filhos da puta.
    O porco ninmo essa avis rara,recomenda a leitura de ESteiros de Soeiro Pereira Gomes um comunista, como o demente presumo deve saber, mas depois chama de verme a Alvaro Cunhal,tenh a certeza absoluta que o demente ninno se alguma vez tivesse o privilégio de enfrentar Alvaro Cunhal em qualquer tipo de de debate sairia do mesmo reduzido á sua insignificância isto é a merda,tal era a diferênça intelectual.
    Mas não só esta insignificãncia ousa dizer disparates outros colocam poemas de Eugénio de Andrade, outro montro como escritor e poeta (comunista),Jean Ferrat,Pablo Neruda,Picasso,Frederico Garcia Marques,Luis Cilia,Jose Mário Branco,José Afonso,Sergio Godinho,José Saramago(Prémio NÓbel da Literatura),Carlos Paredes,Raul Brandão,Vinicios de Moraes,e tantos tantos outros,e vós o tristes figuras que fazeis na vida de relevante para intelectualmente criticar tamanhos talentos?
    É meu convencimênto que apanhais no cu de judas.
    Não passais de uns miseráveis patetas cheis de presunção,e que sem duvida a presizar de vigilância permanente porque tenho a certeza que sois um bando de parazitas dos quais é nescessário ter quidado com as carteiras.
    O patarato de um anonymos fala de Gulags,esquece Guantanmo,dos efeitos colaterais no Iraque,Afegnanistão e dos milhões que morrem á fome todos os anos no mundo com esta politica de contrar como quiser despedir quando quiser tenha paciência que o gave mas o dito é um demente,psiquiatra precisa-se.
    Para terminar algum F.da Pute ganha de reforma 37.000$00,por mês? Ou pertence ao numero dos 500.000 desempregados que neste momento há nesta merda de País?
    Pelo que me é dado constactar só um está a trabalhar é o Lucklucky estã na PIDE quero dizer no CIS. Vão para o Caralho seus panereiros.
    Anónimo said...
    Att. Anonymous das 4.49, Zé Povinho das 10.44 e Vaio das 4.58

    Vocês passaram as marcas.
    Portanto, aqui vai a linguagem que entendem e apreciam.

    Vocês, Anonymous das 4.49, Zé Povinho das 10.44 e Vaio das 4.58, são:
    "Bastardos, filhos da puta" (citando Alberto João Jardim)
    "ratazanas e toupeira, ratos que só andam de noite, cães ranhosos" (citando Avelino Ferreira Torres).

    Tenham um muito bom dia !

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