"- (Elas) Estavam a pedi-las"

Folheio o Portugal Diário e leio...

O Tribunal de Tomar (Santarém) adiou hoje a leitura da sentença do julgamento de um ex-vereador da Câmara local acusado de coacção sexual a quatro funcionárias do seu gabinete, com o colectivo a decidir ouvir de novo uma das queixosas. Fonte judicial explicou à Agência Lusa que o colectivo ordenou uma nova audição de uma das quatro assistentes do processo, que acusam António Fidalgo, antigo vereador da Educação, de assédio continuado. Esta nova diligência está prevista para as 13:45 de hoje e foi decidida já depois das alegações finais do caso, que está a ser julgado há mais de 13 meses.

Nessa última sessão, o Ministério Público pediu a condenação do arguido, mas admitiu a possibilidade de o ex-autarca sair sem qualquer pena, considerando que «se (as funcionárias) fossem mulheres sérias» o antigo vereador «não estaria» a responder pelos crimes de assédio.

Para o procurador António Artilheiro, a coacção sexual «só se desenvolveu porque as assistentes também contribuíram para isso». O ex-vereador tem alegado a sua inocência ao longo das várias sessões, afirmando-se vítima de uma estratégia orquestrada pelas funcionárias. Depois das acusações feitas pelas funcionárias, em 2003, António Fidalgo deixou o cargo de vereador, suspendendo as funções e desistindo de cumprir o mandato.

Eu confesso que gostaria realmente de saber o que é uma "mulher séria", e como se mede esta, na definição do Artilheiro, Procurador, e que é que isso tem a ver com a existência ou não de assédio, até porque seguindo o mesmíssimo raciocínio se eu, um dia, deixar a chave no meu carro e mo roubarem então e mesmo apanhado o ladrão corro sérios riscos de ter outro artilheiro, Procurador da República, a admitir a absolvição do Réu, porque a chave estava na ignição. Estas afirmações não poder ser consideradas simplesmente sexistas, retrógradas ou politicamente incorrectas, são, isso sim, absolutamente inaceitáveis num estado de direito, em pleno séc. XXI. O que está em julgamento é saber se ocorreu ou não assédio sexual, sendo que o réu não é(ra) suposto serem as vítimas. A linha de raciocínio usada pelo Ministério Público faz lembrar aliás um velho argumento rasca usado em casos de violação "- (Elas) Estavam a pedi-las".

Insustentável. Inqualificável. Espera-se mais que ainda outro parecer da PGR asim como uma atitude absolutamente exemplar do Conselho Superior do Ministério Público.
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Publicado por Manuel 12:28:00  

11 Comments:

  1. zazie said...
    aqui está um assunto mistério...

    nunca entendi de que se queixam... assédio? mas dar a volta ao assédio faz parte do código genético de qualquer mulher que se preze...

    cá para mim é uma grande injustiça, tantas que o desejavam e estas queixam-se ":O.
    josé said...
    De acordop com esta notícia talvez o assunto deva merecer alguma atenção e contenção.

    Porém, o que se passou em julgamento, já não está assim tão à mão, para permitir comentários desaforados.

    E quanto a pedir a cabeça do Artilheiro, parece-me que nestas matérias, o melhor é deixar o ridículo funcionar ou castigar pelo velho método- "ridendo castigat mores".

    Defender à outrance qualquer outra posição, para além da de simples missionário, é um pouco arriscado...
    Anónimo said...
    estou chocada. este josé afinal é tão corporativista e machista como os outros.
    josé said...
    Ah?!Porquê, minha caríssima anónima?!

    Aqui, nem defendo corporação alguma! Limito-me a elucubrar sumaria (e contraditoriamente) sobre coisas algo lúbricas.

    Sobre a coacção sexual, muito se poderia dizer, mas não estou para aí virado.
    Sobre os que se passa em julgamentos dessas matérias, ainda mais e também não apetece nada.

    Sobre as ideias peregrinas e vindas talvez do fundo dos atavismos preconceituosos de um qualquer magistrado do MP, que se convenceu de algo que nós não sabemos pela notícia do PD, que se pode dizer?!

    Pois, o que foi dito: que se for verdadeira a notícia e o sentido dela que o referido Artilheiro deve repensar o ridículo em que se meteu...ao referir a expressão "mulheres sérias"!
    Contudo, a expressão é vazia de sentido sério. É um lugar comum com significado diverso de "homem sério", mas com semântica duvidosa.

    Então, elaboremos:
    "Mulher séria", será o quê?!
    Aparentemente a que se (com)porta de modo sério e como qualquer pessoa. Que não brinca em serviço...
    Não obstante, para atalhar razões, lembro que essa expressão teve acolhimento em muitas e muitas petições dirigidas aos juizes durante anos e anos a fio, recolhidas no "manual de petições cíveis" da autoria de um ilustra magistrado que foi delegado do MP, Inspector e finalmente COnselheiro do STJ, um senhor chamado Borges de Pinho por quem tenho muita consideração pessoal. Nesse livrito chamado "Da protecção Judiciária dos menores e do Estado", o autor articulava a petição de acção de investigação de paternidade apondo-lhe uma artigo com a menção " A mão do menor teve sempre porte irrepreensível" e ainda mais : " A mãe do menor foi sempre uma rapariga séria, honesta, de comportamento exemplar(...)"

    COmo se vê por estes pequenos exemplos que datam de alguns anos atrás, a ideia de que as mulheres podem ser "sérias" em certos aspectos, não era ideia de peregrinaçãoao Sameiro ou às matas do BOm Jesus...
    zazie said...
    José,

    Não estava a por minimamente em causa a imbecilidade do argumento do tribunal e muito menos as restantes prepotências do dito vereador. Acredito piamente. A minha boca era mais terrorista. É que esse tipo de coisas quando ultrapassam o mero assédio e servem para descriminações de outros tipos de direitos, como os laborais, deviam ser tratadas à letra sem esperar por tribunais- deixá-los de calças na mão e se possível publicamente meu caro, de calças na mão...

    E depois o gajo que gritasse, que berrasse e o juiz que lhe respondesse que se tivesse decência também não tinha caído. Não há nada como a boa sabedoria dos lais de Aristóteles ou de Virgílio “;O)
    Piotr Kropotkine said...
    e vá lá vá lá que este mulherio não era do Dubai...
    josé said...
    Eu percebi, Zazie.
    Não foi ainda há muito tempo que li o livrito do Michael Crichton "Disclosure". Para quem não leu, aqui fica um pequeno resumo, roubado na net:
    "Michael Crichton's Disclosure is a modern computer industry story of intrigue and deception. Tom Sanders is a computer engineer with DigiCom, a multinational software design corporation based in Seattle. Tom, an old timer with over ten years at DigiCom, is preparing to take on a promotion to head the division of Advanced Products. Much to his dismay he finds out that an old fling of his, Meredith Johnson will be given the office instead in the name of diversity.

    Tom is crushed but vows to be a good trooper and work hard for the benefit of the company. Soon he uncovers information that is troubling and Meredith hits on him for "old time sake". His position is in jeopardy and he blows the whistle on Meredith. No one believes his story as she counters than he has assaulted her. Tom is forced into a battle for his job and his reputation. The action moves fast as the suspense builds to a satisfying conclusion. "

    A questão do assédio e da coacção parece-me difícil de definir assim sem mais nem aquelas e por isso nem quero glosar muito mais sobre o caso concreto.

    Mas o tema do livro do Crichton ( que é um autor que gosto de ler) é sobre uma intriga de "mulher séria".

    Só por isso e por haver a possibilidade de haver no caso concreto, "more to the picture than meets the eye" , é que me coloquei aqui no papel do politicamente incorrecto, defensor da dúvida e advogado de um diabo que nem sei bem qual será.

    O Piotr é que escreve um pouco por siglas. Desenvolve, pá!
    Manuel said...
    Ai Zé...

    O livrito do Crichton deu um filme, muito conhecido, com o Michael Douglas e com a Demi Moore, já na fase do silicone, e foleirote por sinal.

    O que eu pus em causa não foi a definição de assédio que me parece implicito se se demonstrar coação ou relação causa-efeito entre determinado tipo de benesses laborais e "extras" de indole mais ou menos sexual mas sim a tese iluminada do "pôr-se a jeito".

    O que está em causa também não é o "ridículo" das afirmações do artilheiro do MP, o que está em causa é a absoluta perversão da lógica usada, que leva a pedir a condenação "por pedir" numa atitude que diz muito da seriedade com que a justiça e alguns dos seus agentes se veem a eles próprios, para logo estender a a mão e a passadeira ao acusado dizendo (o acusador) que as vítimas também tinham rabos de palha.

    Calhou ser sobre assédio, podia ser sobre outra coisa qualquer, mas não me parece normal o MP nas alegações finais pedir uma condenação para en passant achar naturalíssima não só a absolvição como a linha de argumentação da defesa. É ?
    josé said...
    Se é?!
    O Direito é o reino do relativismo moral!

    O Advogado Rodrigo Santiago que parece que também faz parcerias com os lentes de Coimbra numa república de bana...perdão, direito, disse no outro dia á Pública que "não tenho nenhuma ideologia do crime. É-me igual a defesa de um homicida, de um pedófilo ou de umas ofensas corporais." E ainda " o Estado quer que sejam condenados todos os culpados mas só os culpados".

    Assim, quando um MP pede a absolvição, por dúvidas, está a fazer o que deve se esse for o dever de consciência.
    Num caso de natureza sexual em que se joga o conceito de assédio e de coacção, esse termo tem conotação e relevo estritamente jurídico.
    O pior é que isso não está muito bem definido juridicamente, e por isso é que vamos tendo certos acórdãos de bradar aos céus ou de atar as mãos na cabeça ( para os não crentes...).
    OS exemplos são recentes e tem a ver com a disparidade de critérios sobre se a vítima é homem ás mãos de uma mulher ou vice-versa.

    Porém, num julgamento, depois de produzida a prova o Mp alega ( se o quiser pois nem é obrigatório) e arenga o que bemn entender, sem que isso vincule seja quem for. Dir-se-á que há juizes que nem sequer ouvem alegações; outros que ouvirão para descontrair e outros ainda que estão a ouvir e a rosnar de si para si o que é que aquele Parvo/a está para a li a dizer.
    Como a decisão não depende dessa alegação final, fica ela por conta do brio profissional do Mp ou do garbo em querer mostrar que não esteve para ali a fazer de verbo de encher, como infelizmente muitas e muitas vezes acontece.

    Assim, se o artilheiro estivesse calado ou pedisse simplesmente "justiça", o Portugal Diário não faria manchete. COmo disse uma atoarda que soou politicamente incorrecta, caem-lhe em cima e já pedem a cabeça do desgraçado numa bandeja da PGR...

    Haja "Modus in rebus"!
    O que se pode criticar na peça de artilharia, não é suficiente para lhe mandar com a bomba atómica!
    É só isso...
    Piotr Kropotkine said...
    epá ....era só que se fosse no Dubai era bem possível que as mulheres viessem a ser mártires da Umar... e lá teria de se dizer que no Dubai o código penal era assim e assado que o Dubai é um estado soberano etcetal... que ninguém mandou as mulheres irem trabalhar para o Dubai que quem anda à chuva molhaçe etceetal....

    no Dubai só há mulheres sérias...
    Piotr Kropotkine said...
    eu tamem não acho que o tal de Artilheiro deva ser capado....mas que merecia um prémio pela perspicácia merecia....ou então melhor ainda....e se agente pudesse ver um directo do gajo a ser assediado por essas gajas que se portam mal?

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