Durante anos assistiu-se em Portugal a uma "estupidificação" do debate e do argumento político. Algumas élites em conluio alegre com os media, acharam e acham, que o povão médio não tem arcaboiço, nem pachorra, para perceber as grandes questões e como tal deve contentar-se em vê-las servidas e embrulhadas de uma forma minimalista, maniqueísta, e quase sempre simplória. Fizeram-se e desfizeram-se carreiras políticas com base no sound-byte, nas declarações avulsas, da boca no momento certo, foram os anos das verdades, e perseguições, fáceis do Independente do Dr. Portas, e da mensagem black & white do PP do Dr. Monteiro, foram os anos dos tutoriais do Prof. Marcelo, foram os anos das propostas fracturantes do Bloco de Esquerda. E agora é a vez do PS do Eng. Sócrates, até ver o mais eficaz e todos.

Não vale a pena pois criticarem, os mesmos do costume, o novo estilo do Eng. Sócrates, este está a ser simplesmente o melhor, e de longe, a executar uma filosofia que vem de longe.

Para quê arriscar a impopularidade de reformas díficeis e dolorosas se no imediato se sossega o bom povo com placebos e paliativos ? A receita é simples, pegue-se numa área política sensivel, identifiquem-se os hot spots, e apregoe-se a medida mais vistosa e espalhafatosa possível, não necessariamente eficaz ou sensata. Foi assim, hoje, outra vez, com o anúncio gratuíto da redução das férias (quem o ouvir pensará aliás que os agentes judiciais tem dois meses de férias ao contrário do comum dos mortais) e vai ser assim muitas mais vezes. É mais simples encurtar as tais férias judiciais (a única altura em que livres de julgamentos os magistrados tinham tempo para por trabalho em dia) do que verificar da produtividade e do trabalho que é ou nõa feito nas mesmas. Muito provavelmente esta medida até vai entupir ainda mais a justiça mas que interessa isso ? - já cumpriu a sua função, encheu o olho e deixou as oposções sem pio.

Há no entanto vantagens a prazo, e grandes, desta nova postura do Eng. Sócrates. Uma delas é que mais tarde ou mais cedo as oposições, mormente o PSD, vão ter que perceber que não é possível competir, e seguindo estas mesmas regras, com o Governo em funções. Mais tarde, ou mais cedo, vão ter de perceber que a actividade política não se resume a um ping pong constante em que o que se disse ou fez ontem não interessa nem conta no que se vai dizer amanhã. Vão ter de perceber que é preciso planeamento, que é preciso ter políticas (que não apenas personalidades) sectoriais claras, concretas e com um minimo de estabilidade e sobretudo vão ter de perceber que a única maneira de terem hipóteses de serem ouvidos e levados a sério é começando a explicar, e não só desmontando o discurso do governo, muito bem as suas propostas, as suas prioridades, aos eleitores, a tempo e horas.
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Publicado por Manuel 16:03:00  

3 Comments:

  1. irreflexoes said...
    Com o decido respeito ao V.I. Manuel discordo.

    Mas gostaria de assinalar o seguinte: eu também sei que ele há magistrados que até ao fim-de-semana trabalham. Conheço pessoalmente um juíz do STA que faz diariamente mais 4 horas depois de jantar, no seu escritório de casa.

    Também os há que usam o tempo de "férias" para trabalhar. Mas também há os outros ...

    E nada obsta a que se fixem determinados períodos de trabalho sem audiências e quejandos para permitir trabalhar em sentenças e despachos (v.g., uma semana em cada dois meses, ou menos, se tal se mostrar necessário). os próprios magistrados já podem hoje fazê-lo em certa medida. A agenda é gerida por quem?

    Em vez de regular o trabalho em férias vamos mas é separar o que é trabalho e o que são férias.

    Os magistrados que trabalham nelas passam a ser reconhecidos pelo seu trabalho e os que não trabalham nelas passariam a trabalhar.

    Em vez de regular o trabalho nas férias (medir a produtividade em férias implica regulamentar o dito cujo) melhor será separar as duas coisas.

    É mais transparente, não?

    invenerável irreflexões
    Anónimo said...
    dos magistrados judiciais e do mp e oficiais de justiça que conheço (e os que conheço falam-me dos colegas), são poucos os que trabalham a sério em férias, e estes são os que já trabalham mais horas durante o ano.

    O problema é que o trabalho está organizado em função dos quase 3 meses de férias judiciais que existem no ano (verão + natal + páscoa, como na escola, mas sem o carnaval). E se pensarmos bem, que outra área profissional tem tempo para fazer up dates do trabalho?
    Manuel said...
    Pois, ó irreflectido. Eu concordo com tudo, só que o que foi anunciado não foi nada disso, nem de perto, nem de longe. Ninguém falou em "que se fixem determinados períodos de trabalho sem audiências e quejandos para permitir trabalhar em sentenças e despachos ", antes pelo contrário. "Simplificou-se".

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